Nesta terça-feira (03/03), o deputado Alexandre Frota (foto) (PSDB-SP) apresentou o Projeto de Lei (PL) 438/20, que proíbe, aos profissionais de saúde, o recebimento de vantagem ilícita pela indicação de empresas para a manipulação e dispensação de produtos farmacêuticos, entre outros. O PL também exige que a prescrição médica de medicamentos seja feita, unicamente, por seu princípio ativo, mesmo na rede privada.
Esse PL altera a Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, que é o Código de Defesa do Consumidor, para tipificar como recebimento de vantagem ilícita os profissionais de saúde que receberem benefícios pela comercialização de medicamentos, órteses, próteses, exames e procedimentos laboratoriais.
No PL 438/20, Frota propõe, no Art. 2º, que a Lei 8.078 passa a vigorar acrescida do seguinte artigo: “Art. 68-A É vedado aos profissionais de saúde indicar em suas receitas, solicitação de exames, procedimentos laboratoriais, órteses, próteses, óticas ou qualquer organização destinada à fabricação, manipulação, comercialização de produtos farmacêuticos, próteses, órteses, lentes de contato, óculos, em circunstâncias que induzam o paciente, cuja compra decorra de influência direta em virtude de sua atividade profissional”.
No entanto, esses preceitos já estão previstos em legislação nacional, como a Lei 5991/73, o Decreto 90.931/32 e o Código de Ética Médica, do Conselho Federal de Medicina, entre outras. A pergunta que não quer calar: não seria o caso de, em vez de criar uma nova lei que regulamenta o mesmo tema, seria mais oportuno otimizar a fiscalização para que essas regras sejam cumpridas?
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Em entrevista exclusiva ao Portal de Conteúdo do ICTQ - Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, o deputado Alexandre Frota respondeu: “Essa alteração visa dar garantias ao consumidor que, caso haja a indicação médica de qualquer estabelecimento auxiliar de saúde, tais como laboratório, farmácias de manipulação etc., ele responderá, também, por infração penal pelo Código de Defesa do Consumidor, ou seja, há uma garantia maior ao consumidor”.
Indicação de cunho comercial
O farmacêutico, proprietário de farmácia de manipulação e professor do ICTQ, Eduardo Abreu, disse que o ético a ser feito é que o prescritor indique três empresas de sua confiança, e não apenas um local. “Isso colocaria em dúvida se essa indicação é tecnocientífica ou se tem cunho comercial, e que há retorno financeiro. Sabe-se que, no mercado, embora não seja comprovado, há empresas que pagam essas comissões ao indicador, e isso também acontece na área da saúde, com medicamentos. De certa forma, eu vejo com bons olhos que se estejam levando isso em nível de Congresso para que se alerte à população para que ela não fique refém de um profissional, que é uma autoridade para ela, recebendo uma indicação única. O prescritor tem nível de influência e persuasão muito grande”.
Frota descreve, no PL 438/20: “Infelizmente, há condutas que precisam ser vedadas. É constante os profissionais de saúde são assediados pela indústria farmacêutica e de próteses, órteses entre outros produtos, para que passem a prescrever medicamentos. Em troca, há brindes, inscrições em congressos, jantares, viagens, entre outros benefícios. A presente proposição visa coibir condutas realizadas por profissionais da área de saúde. A relação entre médico paciente é uma relação de serviço”.
Ele complementa: “A título de exemplo, citamos o oftalmologista que recebe comissões da ótica que avia suas receitas, o ortopedista que recebe comissão do fornecedor dos aparelhos que prescreve ou ainda em seus pacientes, o cardiologista que recebe comissões do vendedor de marca-passos que utiliza em seus pacientes, o clínico que recebe comissões do laboratório farmacêutico que produz os medicamentos por ele receitados, e assim por diante. Entendemos que isso é antiético e também uma concorrência desleal praticado por algumas firmas, e profissionais de saúde influenciando o mercado do consumidor, provocado uma concorrência desleal”.
Prescrição pelo princípio ativo
O deputado propõe, no PL 438/20, também, que seja incluído no Art. 2º da Lei de Defesa do Consumidor, ainda no Art. 68-A, §1º, que os medicamentos indicados deverão ser prescritos pelo nome do princípio ativo recomendado pela Organização Mundial de Saúde.
Entretanto, é garantido ao farmacêutico, pela lei da intercambialidade, a RDC 58/14, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a troca dos medicamentos prescritos por genéricos, referência ou similares. Sendo assim, independentemente do princípio ativo indicado na receita, é o farmacêutico quem orienta e influencia o paciente na melhor escolha do medicamento.
Embora seja a minoria, há quem diga que existem profissionais mais interessados na área comercial do que na clínica. Esses farmacêuticos, agora com o poder aumentado por esse PL do Frota, muito provavelmente, seriam o foco das possíveis comissões dos laboratórios farmacêuticos, antes oferecidas (ilegalmente) para os médicos, segundo o deputado.
Sobre isso, Frota não comentou a polêmica, mas disse: “A indicação pelo princípio ativo visa esclarecer ao consumidor o que, realmente, é o remédio que ele deve tomar. Desta forma, há a opção por usar um genérico ou um similar. Importante salientar que estamos dando uma maior garantia ao consumidor de consultas médicas e na aquisição de medicamentos e outros itens necessários ao tratamento de saúde”.
Para o farmacêutico, advogado e diretor do ICTQ, Eugênio Muniz, o farmacêutico já tem a autonomia de substituir os medicamentos indicados na receita, a não ser que o médico proíba essa substituição por escrito. “Eu concordo que, com esse poder nas mãos, o farmacêutico passaria a ser o foco da indústria, ou seja, os laboratórios farmacêuticos poderiam até induzir a venda de seus produtos na ponta”, alerta ele, e conclui.
O Conselho Federal de Medicina foi procurado pelo jornalismo do ICTQ para se posicionar a respeito do PL 438/20, mas não respondeu à solicitação de informações até o fechamento desta matéria. Leia o PL 438/20, na íntegra, aqui.
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