A farmácia on-line norte-americana Valisure divulgou novos estudos que sustentam que o medicamento Zantac (ranitidina, bloqueador dos receptores H2 da histamina), da Sanofi, utilizado para combater azia e úlcera do estômago e duodeno, é inseguro devido à contaminação por uma substância potencialmente cancerígena, revelou o portal Fierce Pharma. No Brasil, a substância, que era vendida por vários laboratórios, foi retirada do mercado há um ano.
Em 2019, a Valisure deu o primeiro alarme sobre a contaminação do Zantac com uma impureza chamada N-nitrosodimetilamina – NDMA (nitrosamina), que é um provável agente cancerígeno em pessoas, dependendo da quantidade em que for ingerido, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS).
O estudo mais recente da Valisure, publicado no Journal of the American Medical Association (JAMA) Network Open, sugere que o Zantac e outros compostos com ranitidina podem fazer com que o agente cancerígeno suspeito (N-Nitrosodimetilamina) se forme sob uma variedade de condições, incluindo no corpo humano.
De acordo com o fundador e CEO da Valisure, David Light, em entrevista à Fierce Pharma, os estudos apontam há “décadas que a ranitidina é fundamentalmente instável, pode formar NDMA em uma variedade de condições, incluindo no organismo e pode ser cancerígena e tóxica para humanos”.
Segundo a Valisure, ao contrário de outros medicamentos que tiveram recall em 2018 por contaminação com a NDMA, como losartana e metformina – que provavelmente foram afetados durante o processo de fabricação –, a ranitidina em si é a culpada pela contaminação.
“A Valisure detectou NDMA em todas as marcas e formas de dosagem de ranitidina que testou, seja em produtos sem receita ou prescrição e independentemente do fabricante”, acrescentou à Fierce Pharma o diretor científico da empresa, Kaury Kucera. “Este parece ser um problema fundamentalmente diferente da contaminação NDMA encontrada em drogas como losartana e metformina porque ocorre em todas as marcas de ranitidina e é inerente à própria molécula”, concluiu.
Para o estudo da Rede JAMA, a Valisure usou espectrometria de massa de alta resolução por cromatografia líquida (LC-HRMS) para detectar o agente cancerígeno suspeito no fluido gástrico simulado. A empresa variou o pH, bem como as concentrações de nitrito e ranitidina, para avaliar a possível formação de NDMA em diferentes condições no estômago.
Segundo a empresa, os pesquisadores associaram um comprimido de 150 mg de Zantac, misturado com uma concentração mínima de nitrito de sódio, à formação de 947 ng de NDMA. Quando a concentração de nitrito foi aumentada, o comprimido rendeu um máximo de 320.000 ng do provável carcinógeno. Isso representa 320 microgramas – superando massivamente a concentração de 0,096 micrograma de NDMA, considerada segura para o consumo humano diário.
Em um estudo separado, publicado no site de artigos científicos MedRxiv, a empresa observou também uma “associação significativa” entre o uso do bloqueador H2 e o aumento dos diagnósticos de câncer de mama, tireóide, bexiga e próstata.
Nessa pesquisa, a Valisure examinou 10.347 pacientes com câncer. Uma análise transversal mostrou que o uso de ranitidina, em comparação com outros medicamentos comuns para azia, foi correlacionado com um maior risco de câncer de mama. Os pesquisadores encontraram ligações semelhantes entre ranitidina e risco de câncer de tireóide, bexiga e próstata.
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Vale observar que um estudo de 2008 do Fred Hutchinson Cancer Research Center já mostrava a ligação entre o risco de câncer de mama e três principais bloqueadores H2 – além da ranitidina, a cimetidina e a famotidina. Depois de examinar mais de 3.000 indivíduos, os pesquisadores eliminaram a famotidina e a cimetidina, mas descobriram que a ranitidina estava “significativamente associada” a uma forma comum de câncer de mama.
Nos Estados Unidos e no Canadá, a Sanofi, por iniciativa própria, retirou os produtos Zantac de venda livre das prateleiras no final de 2019. Mas em abril de 2020, a Food and Drug Administration (FDA), agência que regula medicamentos nos Estados Unidos, determinou a retirada de todos os medicamentos com ranitidina do mercado.
Segundo a FDA, a impureza em alguns produtos de ranitidina aumenta com o tempo e quando armazenados em temperaturas mais altas do que a ambiente pode resultar na exposição do consumidor a níveis inaceitáveis dessa impureza.
Já no Brasil, A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) suspendeu, em janeiro de 2020, a comercialização e a importação do insumo de ranitidina, produzida por uma empresa indiana chamada Saraca Laboratories Limited. Na sequência, os laboratórios Medley, Aché, EMS, Legrand, Nova Química e Germed anunciaram, segundo o Uol, o recolhimento dos lotes de medicamentos que levam a substância do mercado.
Procurada pelo Portal do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico para comentar a respeito da participação do Zantac no mercado brasileiro, a Sanofi não respondeu até a publicação desta reportagem. Caso venha se pronunciar esta matéria será atualizada.
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