No final de 2019, um surto de um novo vírus, advindo de terras longínquas, era noticiado por várias reportagens na imprensa internacional. Quem recebeu essas notícias não poderia imaginar que esse vírus desembarcaria em terras tupiniquins, num País tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza. Mas, sim, ele desembarcou por aqui e mostrou que veio para ficar.
Esse vírus é o Sars-CoV-2, do tipo corona, constituído de RNA. Ele tem esse nome (corona) por possuir uma coroa em volta da sua membrana, chamada de proteína Spike. Ela é a responsável por se ligar às células por meio dos receptores de angiotensina 2 (ECA-2), e lá liberar seu material genético, fazendo com que as células ‘trabalhem para ele’, produzindo mais vírus e, com isso, infectando mais células.
Esse novo coronavírus tende a causar uma síndrome respiratória aguda, daí o nome Sars, e o nome dado a essa patologia é Covid-19. Os sintomas principais dessa patologia são febre, fadiga e tosse seca, seguidos sempre por mialgia e alguns sintomas menos comuns, como dor de garganta, dor de cabeça e perda de paladar ou olfato.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou, em 30 de janeiro de 2020, que o surto dessa doença constitui uma emergência de saúde pública de importância internacional, caracterizando-a como uma pandemia. Mas, afinal de contas, o que é uma pandemia? É um termo utilizado para descrever uma situação em que determinada doença apresenta uma distribuição em grande escala, espalhando-se por diversos países.
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Mas, como nós, farmacêuticos, podemos contribuir para ajudar nessa pandemia de Covid-19?
Em seu artigo, intitulado A evolução da Atenção Farmacêutica e a perspectiva para o Brasil, o professor da Faculdade de Farmácia da Universidade de São Paulo (USP), Leonardo Régis Leira Pereira, menciona que a nossa profissão foi marcada pela imagem do farmacêutico sendo associado apenas à comercialização de medicamentos em farmácias, e visto pela sociedade como um mero vendedor de medicamentos.
A verdade é que a nossa profissão vem, ao longo do tempo, se transformando, e o farmacêutico assumindo um papel de destaque como o profissional de saúde e com enorme vínculo com seus pacientes.
De fato, nós passamos a ser vistos como atores principais dentro de muitas farmácias, sendo a autoridade máxima quando o assunto é medicamento. No entanto, mesmo após as Resoluções 585 e 586, de 2013, do Conselho Federal de Farmácia (CFF), que regulamenta as atribuições clínicas do farmacêutico e a prescrição farmacêutica, muito ainda precisa ser feito.
A pandemia da Covid-19 veio mostrar a nossa fragilidade no atendimento primário à população, ou seja, nós, farmacêuticos, não estávamos preparados para esse cenário de adversidade. A farmácia é vista por muitos como estabelecimento de saúde, e é o primeiro lugar onde muitas pessoas vão buscar assistência, na ânsia de sanar seus problemas de saúde, mostrando que elas têm pouco, ou quase nenhum, acesso a médicos.
Nós, farmacêuticos, somos profissionais de saúde com nível superior, estudamos durante quatro a cinco anos em uma faculdade, alguns ainda cursaram mais dois anos em uma pós-graduação, para poder estar ali, na linha de frente, com a população. E é com esse profissional que a população quer contar.
No entanto, muitas vezes, nós esbarramos em trabalhos burocráticos, e não conseguimos fazer a atenção farmacêutica e prestar um serviço clínico à população. E, quando conseguimos desempenar essa função, muitos não têm experiência nenhuma, já que faltam conhecimentos técnicos. Com isso, alguns acabam fazendo ‘balconismo’, ou seja, uma prática que aprenderam com o balconista da farmácia.
Nesta semana, conversando com alguns colegas farmacêuticos, percebi que muitos deles não sabem sobre a fisiopatologia da Covid-19. Muitos não deram treinamentos aos seus auxiliares sobre os motivos da utilização da máscara e do uso do álcool 70. Além disso, não controlavam a temperatura de quem entra na farmácia e, muito menos, o acesso dessas pessoas.
Esta é a chance de mostrarmos à população que somos profissionais de saúde. É a chance da população de nos conhecer de verdade. O Conselho Regional de Farmácia de São Paulo (CRF-SP) produziu vários materiais para auxiliar o farmacêutico nesta pandemia, como fôlderes explicativos, anamnese a ser feita a pacientes com suspeita da Covid-19, inclusive um fluxograma para, se necessário, fazer o devido encaminhamento a uma unidade de saúde ou prescrever algo para sanar os problemas, se eles forem menos graves.
No entanto, deparei farmacêuticos despreparados, fazendo o tal ‘balconismo’, e vendendo ivermectina, azitromicina, vitamina C e vitamina D injetável como se eles fossem aqueles farmacêuticos do passado: meros vendedores de medicamentos.
O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, disse que esta é a hora de assumirmos o papel de responsáveis técnicos! Não seria necessário tornar os medicamentos hidroxicloroquina ou nitazoxanida controlados se nós, farmacêuticos, assumíssemos o nosso papel de responsáveis e se utilizássemos o artigo 2º da Resolução 585 do CFF, que diz:
Art. 2º - As atribuições clínicas do farmacêutico visam à promoção, proteção e recuperação da saúde, além da prevenção de doenças e de outros problemas de saúde. Parágrafo único - As atribuições clínicas do farmacêutico visam proporcionar cuidado ao paciente, família e comunidade, de forma a promover o uso racional de medicamentos e otimizar a farmacoterapia, com o propósito de alcançar resultados definidos que melhorem a qualidade de vida do paciente.
Nenhuma dessas terapias mencionadas tem fundamentos científicos, já que não existem estudos que comprovem sua eficácia. Isso faz com que nós, farmacêuticos, sejamos desrespeitados por outros profissionais da área.
Está na hora de mostrarmos o que sabemos. Caso não saibamos, é a hora de aprendermos. Cuidado com o uso irracional de medicamentos. Cuidado com a farmacocinética do paciente. Lembre-se dos conceitos básicos de metabolização e excreção e de que determinadas patologias podem piorar o quadro desses pacientes.
E, por fim, como diria um professor (amigo nosso) “estuda que cresce”. E, de preferência, melhor a tubaína que a cloroquina.
*Dr. André Schmidt Suaiden é farmacêutico clínico e professor do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico.
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