Medicamento para doença degenerativa pode prejudicar coração no pós-menopausa

Medicamento para doença degenerativa pode prejudicar coração no pós-menopausa

Estudo desenvolvido por pesquisadores brasileiros aponta que o uso de medicamentos inibidores de colinesterase, aplicados no tratamento de doenças neurodegenerativas, pode ter impacto negativo no coração de mulheres no pós-menopausa, revelou o Jornal da USP. A pesquisa foi publicada no periódico científico American Journal of Physiology.

A colinesterase é uma enzima que tem o papel de regular os níveis de uma molécula chamada acetilcolina, que é um importante neurotransmissor envolvido na regulação de diferentes funções biológicas. Por sua vez, os inibidores de colinesterase estão presentes em medicamentos para o tratamento de doenças neurodegenerativas e atuam inibindo a enzima responsável pela degradação da acetilcolina. Esses fármacos provocam o aumento da atividade colinérgica.

“Concluímos que o aumento da atividade colinérgica impacta negativamente o coração feminino em condições de baixo índice de estrogênio, tornando os camundongos (a experiência foi feita em roedores) mais suscetíveis à dilatação e insuficiência cardíaca descompensada”, revelou ao Jornal da USP a professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Silvia Guatimosim, que é a coordenadora do estudo.

Os pesquisadores contaram com dois grupos experimentais: camundongos fêmeas do tipo selvagem e modificados geneticamente que superexpressam o transportador vesicular de acetilcolina de forma sistêmica. Dessa forma, camundongos com aumento da expressão do transportador vesicular de acetilcolina possuem aumento da atividade colinérgica, simulando o que ocorre em pacientes que são tratados com inibidores de colinesterase.

“O aumento da atividade colinérgica não teve nenhum impacto no coração de animais que possuem níveis normais de estrogênio, no entanto, quando os animais foram submetidos à ovariectomia, procedimento de remoção de ovários, os camundongos com aumento da atividade colinérgica foram mais suscetíveis ao desenvolvimento da disfunção cardíaca quando comparado ao grupo controle submetido ao mesmo procedimento”, explicou Silvia.

De acordo com os cientistas, apesar de os inibidores de colinesterase terem um amplo uso na prática clínica, não há muitos estudos que investigam o impacto desses medicamentos na função cardíaca em condições de estrogênio reduzido, como acontece com mulheres no pós-menopausa com doença de Alzheimer.

“Os resultados fornecem novas informações sobre a inter-relação funcional entre acetilcolina e estrogênio no coração feminino. Reafirmamos a importância de continuar os estudos com o objetivo de compreender as consequências da inibição da colinesterase na função cardíaca de mulheres no pós-menopausa”, esclareceu ao Jornal da USP o professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, coautor do trabalho, Helio Cesar Salgado.

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Batizado de Increased cholinergic activity under conditions of low estrogen leads to adverse cardiac remodeling, o estudo foi considerado um dos melhores artigos em fisiologia pela American Physiological Society. O artigo tem a pesquisadora Vanessa Teixeira egressa do Programa de Pós-Graduação em Fisiologia e Farmacologia da UFMG como primeira autora.

Junto com ela assinam os pesquisadores Geisa Tezini e Mauro de Oliveira e o professor Helio C. Salgado, da FMRP; Kiany Miranda, Sergio Scalzo, Cibele Rocha-Resende, Mário Morais Silva, Marcos Melo, Fernando Pedro Souza-Neto, Kaoma Silva, Itamar Jesus e Anderson Santos e os professores Raphael Szawka, Maristela Poletini e Silvia Guatimosim, da UFMG; e o professor Marco Antonio Máximo Prado, da University of Western Ontario, do Canadá.

Apesar dos resultados, os pesquisadores ressaltam que esse é um dos primeiros estudos que buscam relacionar os impactos do aumento da atividade colinérgica no coração de mulheres no pós-menopausa. Dessa forma, serão necessárias novas pesquisas para confirmar o comportamento dos fármacos no caso em destaque e as possíveis diferenças que existem entre homens e mulheres tratados com anticolinesterásicos com relação à função cardíaca.

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O professor da pós-graduação de Farmácia Clínica do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, Alexandre Massao Sugawara, adverte que os farmacêuticos devem estar informados sobre estudos como esse para poder orientar seus pacientes.

“Os inibidores da colinesterase são amplamente utilizados no controle da doença de Alzheimer e têm sido recomendados pelas diretrizes clínicas mais atuais. Sabe-se que tais drogas podem produzir efeitos vagotônicos e levar à redução do ritmo cardíaco. Esta observação é particularmente importante em pacientes com alterações de condução cardíaca, tendo relatos de síncope com o uso de donezepila”, salienta Sugawara.

A partir dessas pesquisas iniciais, continua o professor, baixos níveis estrogênicos podem amplificar a descarga colinérgica, por aumentar expressão do transportador vesicular de acetilcolina. “Esta situação, ainda a ser confirmada por novos estudos, pode ser relevante na prática clínica, pois a deficiência estrogênica e a doença de Alzheimer são duas condições próprias de avanço da idade”, conclui.

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