O recente caos provocado pela alta em infecções e internações na saúde pública de Manaus é um exemplo de como as novas variantes do coronavírus podem ser muito mais severas e causar até mesmo um colapso na saúde pública.
A tendência é que outras mutações do vírus continuem a surgir enquanto ele estiver em circulação. A melhor forma de tentar amenizar os seus impactos e impedir que elas circulem, segundo pesquisadores ouvidos pela BBC Brasil, é identificar quatro sinais de alertas dessas variantes.
Para eles, estes sinais são: surto de hospitalizações; evidências de reinfecção; mudanças em sintomas e gravidade da doença e alterações nas faixas etárias mais infectadas.
A falta de atenção a esses alertas pode trazer sérias consequências, como, por exemplo, o vírus se tornar mais letal, contagioso e mais resistente às vacinas e ao sistema imunológico.
Surto de hospitalizações
Os pesquisadores veem o surto das hospitalizações (aumento das internações e mortes pela doença) como um dos principais alertas de que uma nova variante da Covid-19 está em circulação.
Um exemplo disso é o que aconteceu em Cabo Oriental (África do Sul). A cidade vivenciou um aumento exponencial de novas internações cerca de três meses depois da primeira onda da Covid-19, ocorrida em outubro de 2020.
Os pesquisadores da Universidade KwaZulu-Natal sequenciaram o vírus das pessoas infectadas na região e descobriram que se tratava de uma variante com 20 mutações – número considerado elevado por se tratar do Sars-CoV-2.
Não demorou para que a Covid-19 se espalhasse pelo País, em uma nova onda com pico de infecção superior à anterior. Devido a essa taxa de infecção, os cientistas desconfiaram que se tratava de uma versão mais contagiosa do vírus. Em novos estudos, eles identificaram duas novas mutações, a N501Y e a E484K, que viriam a ser encontradas em Manaus.
Entre as características, a N501Y torna o vírus mais contagioso. Já a E484K dribla a ação dos anticorpos neutralizantes e pode reduzir a eficácia das vacinas. Além disso, os cientistas desconfiam também que ela facilite a reinfecção de pessoas.
Evidências de reinfecção
Um aumento considerável em reinfecção de Covid-19 por pessoas que já foram contaminadas pela doença é outro importante sinal de alerta de que há uma nova variante do vírus, com potencial de driblar os anticorpos produzidos pelo sistema imunológico.
Uma pesquisa realizada pela agência governamental de Saúde Pública da Inglaterra, a Public Health England, apontou que a maioria das pessoas que já contraíram Covid-19 (83%) tem imunidade por pelo menos cinco meses. Logo, a ocorrência de novos casos de reinfecção, antes desse período, pode ser reflexo de uma nova mutação do vírus.
Isso é uma das hipóteses para explicar o recente surto das hospitalizações dos hospitais de Manaus, ocorrido em janeiro. A cidade já havia atravessado a primeira onda da doença. Em dezembro passado, uma pesquisa publicada na revista Science estimava que 76% da população já teriam contraído covid-19.
Se correto, esse percentual seria o suficiente para gerar a chamada imunidade de rebanho. Ou seja, quando um número elevado de pessoas com anticorpos é capaz de frear a circulação do vírus, pois ele passa a ter dificuldade para encontrar pessoas vulneráveis e perde força para se propagar.
Contudo, em janeiro, a saúde pública de Manaus entrou em colapso em vista do surto das internações repentinas. Os hospitais não conseguiram atender à alta e rápida demanda e, como consequência, muitas pessoas morreram por falta de oxigênio.
Uma explicação para esse novo pico de casos é que parte deles possam ter sido decorrentes da variante P.1, que circulava na cidade, naquele período.
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Mudança de sintomas e gravidade
A alteração nos sintomas de quem testa positivo para Covid-19 ou uma elevação significativa de casos graves da doença são também sinais de uma nova variante da doença.
Esses fatores podem sinalizar a presença de mutações que respondem de forma diferente com as células humanas e provocam reações que desentoam das apresentadas pela cepa original do coronavírus.
Ainda não há evidências exatas de que as variantes encontradas em Manaus, na África do Sul e no Reino Unido provoquem sintomas diferentes ou sejam mais agressivas. Contudo, por serem mais transmissíveis, elas podem contribuir com o aumento repentino de novas infecções, ocasionando uma superlotação nos hospitais e mais óbitos.
Além disso, há ainda as mutações N501Y e E484K, que produzem cargas virais mais altas nos infectados, conforme explica o virologista Julian Tang, da Universidade de Leicester, no Reino Unido:
"Estudos indicam que essas variantes permitem que o vírus se conecte à célula de maneira mais eficaz, mais sólida. E que maior quantidade de vírus consiga aderir a cada célula. Então, temos um ritmo maior de reprodução do vírus no corpo".
Entre os estudos, pode-se citar uma pesquisa preliminar que o governo britânico divulgou em janeiro passado. Ela aponta que uma nova variante da Covi-19 pode ser até 30% mais letal que o vírus original.
Mudança na faixa etária identificada
O quarto sinal a ser observado é um possível contágio mais acelerado de pessoas em grupos etários pouco atingidos pela cepa original do coronavírus.
Um indicativo a isso é, por exemplo, é se mais crianças e adolescentes começarem a se infectar ou apresentar casos mais graves de Covid-19. Nesse caso, pode ser que a nova variante tenha mutações capazes de melhorar a conexão entre a proteína spike do vírus e os receptores das células de jovens.
Ainda não há estudos conclusivos sobre o impacto das variantes em crianças. Porém, o governo britânico declarou já ter indícios de uma transmissão maior da variante, no Reino Unido, entre crianças.
Isso pode explicar a rapidez com que essa nova mutação se espalhou pelo País, tornando-se o vírus dominante por lá.
A desconfiança de que o vírus pode estar contaminando mais crianças e jovens, fez, recentemente, o primeiro-ministro Boris Johnson determinar o fechamento das escolas na Inglaterra por, pelo menos, até 8 de março.
Como impedir a circulação de novas variantes da Covid-19?
Para a microbiologista pesquisadora do Centro de Tecnologia em Vacinas e Diagnóstico da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ana Paula Fernandes, novas variantes podem surgir enquanto o coronavírus estiver circulando com altas taxas de transmissão.
"Quanto mais pessoas infectadas numa população, maior a chance de aparecer variante. Sem medidas de contenção e sem uma ampla cobertura vacinal, pode ser que surja uma variante que vá burlar completamente as vacinas. Isso é uma preocupação." Alerta, Ana Paula.
As medidas preventivas, como o uso de máscaras, evitar aglomerações, lavar as mãos constantemente e usar álcool em gel, são, segundo a microbiologista, as recomendações a serem seguidas para reduzir as transmissões da Covid-19.
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