Testes clínicos realizados pelo laboratório de biotecnologia brasileiro Entourage Phytolab demonstraram que uma nova fórmula à base de cannabis é melhor absorvida pelo organismo e desencadeia menos reações adversas nos casos de epilepsia, revelou a revista Galileu.
Pesquisadores da Entourage Phytolab divulgaram o resultado da primeira fase de testes de uma nova fórmula para epilepsia que promete produzir um medicamento mais eficiente à base de canabidiol (CBD), substância da cannabis sativa (nome científico da maconha) com efeitos terapêuticos.
Canabinoides vegetais ou fitocanabinoides são as substâncias químicas associadas às propriedades medicinais da cannabis sativa, encontrados em maiores quantidades nas flores fêmeas da planta. Embora o uso da cannabis como remédio seja documentado há pelo menos 2 mil anos, apenas no século 20 os canabinoides foram descobertos e identificados como as substâncias por trás desse potencial terapêutico, segundo a Entourage.
O CBD foi o primeiro composto desse tipo a ser isolado e descrito, em 1963, pelo químico israelenese Raphael Mechoulam. O mesmo pesquisador descobriu, um ano depois, o THC, composto da planta que é psicoativo, ou seja, que produz alterações de comportamento. Atualmente, cerca de 80 canabinoides são conhecidos e investigados pela ciência.
Já as pesquisas Entourage, empresa pioneira no desenvolvimento de medicamentos à base de cannabis no Brasil, começaram em 2017 e foram realizadas em sua sede em Valinhos (SP). Dentre as 50 formulações diferentes desenvolvidas, seis foram testadas em animais e duas integraram os testes em seres humanos.
De acordo com a Galileu, a fórmula foi criada a partir da diluição do extrato de cannabis em um óleo, misturado com substâncias químicas que compõem o medicamento. Segundo a Entourage, a diferença entre a formulação nova e as vigentes é a combinação desses elementos, que culmina em uma melhor absorção do medicamento no organismo.
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Comparada à geração atual de drogas à base de canabidiol, ela aumenta em até duas vezes a concentração de CBD que chega ao sangue. “Geralmente, nosso organismo não absorve toda a medicação, boa parte das substâncias é perdida nesse processo”, explicou à Galileu o CEO da empresa, Caio Santos Abreu. “No entanto, essa nova formulação entrega um aumento de 60% da absorção do medicamento”.
Os resultados também mostram que as reações ao medicamento entre diferentes pessoas variaram menos. “Em geral, os tratamentos à base de canabinoides produzem efeitos diferentes de paciente para paciente”, explicou o chefe de pesquisa e desenvolvimento da Entourage e responsável pelo estudo, Manuel De Pra, em nota à imprensa.
“A variabilidade dos nossos resultados é três vezes menor do que a dos produtos disponíveis no mercado atualmente. É um grande avanço, que dá mais confiança aos médicos na hora de prescrever”, completou De Pra.
De acordo com Caio Abreu, esses benefícios também podem ser repassados no custo para aqueles que precisam do tratamento. Isso porque, como o produto é mais eficiente, precisa-se de uma quantidade menor dele para chegar ao efeito desejado.
Superada essa fase, o medicamento avançará para as etapas finais dos estudos clínicos. Na segunda fase, prevista para acontecer no primeiro semestre de 2021, a formulação será testada em um número maior de pacientes. Se a eficácia for demonstrada, o medicamento poderá ser encaminhado para registro ainda no ano que vem, conforme a Galileu apurou.
Substância é alvo de preconceito por desconhecimento
De acordo com o médico Drauzio Varella, o uso medicinal da maconha é esperança contra convulsões, mas seu acesso ainda é dificultado em decorrência de preconceito. “A polêmica não vem de hoje. Embora a humanidade conviva com a cannabis sativa há milênios e centenas de estudos sobre suas propriedades já tenham sido publicados, o assunto continua tabu”, salienta Varella em artigo publicado no seu blog.
Varella cita no texto o psiquiatra e neurocientista José Alexandre Crippa, que é pesquisador do tema. Segundo o estudioso, essa substância possui diversas propriedades benéficas comprovadas no tratamento de esquizofrenia, Parkinson, fobia social, transtorno do sono, diabetes tipo 2 e mesmo na cura da dependência de drogas.
“O primeiro estudo brasileiro com o canabidiol foi realizado entre as décadas de 1970 e 1980 e comprovou o seu efeito anticonvulsivante”, revelou Crippa. Em alguns casos, o CBD tem os mesmos efeitos que medicamentos controlados, mas com a vantagem de não causar sedação nem vício. “Os efeitos nocivos do CBD são poucos e raramente descritos. Isso abre um leque gigantesco para o uso clínico”.
Varella lembra ainda que a substância é uma das mais de 50 ativas na planta e não tem efeito psicotrópico. “Não ‘dá barato’, ou seja, não provoca alterações da percepção em quem usa. Basicamente, ao entrar na corrente sanguínea e chegar ao cérebro, ela ‘acalma’ a atividade química e elétrica excessiva do órgão”, explica.
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