Farmácia clínica: todas as dores são iguais?

 Farmácia clínica: todas as dores são iguais?

Ao ser procurado na farmácia por um paciente com queixa de dor, o farmacêutico que presta atendimento clínico já sabe que não pode, simplesmente, prescrever um analgésico sem conhecer melhor o quadro apontado pelo paciente. Como as dores não são iguais, um simples analgésico pode não ajudar.

De modo geral, existem as dores nociceptivas (inflamatórias), as neuropáticas (que afetam o sistema nervoso periférico) e as nociplásticas (decorrente da nocicepção alterada) e, quando há uma associação delas, caracteriza-se a dor mista.

Por conta dessas diferenças, é fundamental que o farmacêutico domine o assunto para poder dar o encaminhamento correto ao paciente dentro da farmácia.

Apesar de a dor mista ser menos conhecida entre os profissionais de saúde, um estudo clínico realizado em 2017, com 5.024 pacientes, em 551 pronto-atendimentos e centros de ortopedia na Espanha, demonstrou 59% de incidência, sendo as mais comuns: lombalgia (54%), cervicalgia (30%) e osteoartrite (29%).

AS CONDIÇÕES MAIS FREQUENTES EM ENSTUDO COM 5.024 PACIENTES.jpg

O estudo demonstrou que a dor mista apresenta maior complexidade clínica, como: mais comorbidades (existência de duas ou mais doenças simultaneamente) ou fatores psicossociais adversos. Ainda, o estudo percebeu menor eficácia dos tratamentos e menor qualidade de vida relacionada à saúde.

A responsável médica da P&G Health no Brasil, Juliana Guedes, afirma que o papel do farmacêutico é fundamental nesse caso: “Esse profissional pode, tendo conhecimento sobre os vários tipos de dor, recomendar o tratamento adequado e recomendar o melhor para o patiente. Além disso, uma vez que o paciente chega com a prescrição médica no balcão, esse profissional consegue garantir que o tratamento prescrito seja aviado”.

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Segundo o farmacêutico e professor do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, Alipio de Oliveira do Carmo, o farmacêutico precisa orientar o paciente a usar corretamente os medicamentos. “O paciente deve ter ciência de que precisa fazer o acompanhamento farmacoterapêutico com o farmacêutico para não sentir mais dor, baseado na prescrição, já que esse paciente poderá tomar os medicamentos, que podem ser anti-inflamatórios de rotina de uso diário, para que ele não tenha dor, pois, no caso da dor mista, não se trata apenas de uma dor pontual”, afirma ele.

Como identificar a dor mista

A médica explica que a identificação de cada dor ocorre por meio de anamnese com exame clínico. “Infelizmente, ao contrário de quando ocorre apenas a dor neuropática, por exemplo, em que se têm alguns formulários e questionários que são preenchidos para o diagnóstico, não existe esse procedimento para a dor mista. Então, é preciso ter uma boa conversa com o paciente. É preciso questionar, por exemplo, sobre condições relacionadas às dores de coluna, na lombar, na cervical, por exemplo. Tudo isso é importante para a identificação e diagnóstico correto da dor mista".

Ela afirma que, para a dor mista, o ideal é um tratamento que considere os dois componentes, ou seja, a dor nociceptiva (inflamatória) e a dor neuropática. Existem alguns medicamentos que tratam esses componentes, cuja terapia é chamada de multimodal. Esse é o caso do anti-inflamatório associado às vitaminas neurotrópicas do complexo B; o qual trata, ao mesmo tempo, tanto o componente nociceptivo, como o neruopático, respectivamente.

Ainda, dependendo de cada caso, podem ser usadas diferentes classes de medicamentos, como alguns antidepressivos e relaxantes musculares. Tudo depende da associação do tratamento elaborado pelo médico. “Podem ser associados anti-inflamatórios e analgésicos com antidepressivos, por exemplo”, lembra Juliana.

“Os medicamentos para dor neuropática são muito específicos, então, eles não tratam a dor nociceptiva. Quando a gente tem um componente neuropático, o médico acaba prescrevendo algum fármaco mais específico para o sistema nervoso central. Então, nesse caso, não é tratada a dor de origem inflamatória, e vice-versa. No caso da dor mista é preciso ter um tratamento dos diferentes componentes para ter sucesso na terapia da dor mista”, afirma a médica.

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Papel do farmacêutico

É fundamental o farmacêutico ter domínio do conceito da dor mista. Geralmente, quando o paciente está com uma dor normal, com a prescrição de um analgésico, ela pode ser tratada em poucos dias. Contudo, se é uma dor persistente, que o analgésico não conseguiu tratar e que apresenta outros sintomas em conjunto, como dor em pontada e queimação, não é qualquer medicamento que vai resolver.

“Então, é importante o farmacêutico ficar atento para identificar que não é uma dor simples de ser tratada com medicamentos isentos de prescrição (MIPs), mas sim, que é uma dor que necessita do acompanhamento médico, pois, é preciso identificar a causa dos sintomas para que seja feito o tratamento adequado”, alerta Juliana.

Assim, o farmacêutico precisa ficar atento aos sintomas que remetem ao componente neuropático, tais como dor em pontada e queimação (sendo aquela queimação em um determinado membro). Geralmente, acontece nos membros superiores e inferiores. Então, se o paciente tiver sintomas que remetam ao componente neuropático, esse paciente precisa de um acompanhamento médico, pois, nessa situação, um analgésico ou um anti-inflamatório isolado, não vai apresentar resultados.

De acordo com Carmo, caso o paciente ainda não tenha um diagnóstico médico e procure, inicialmente, a farmácia, o farmacêutico tem que conversar com ele para realizar um levantamento do histórico da dor antes de receitar um MIP. Ele precisa fazer uma anamnese, por meio de uma boa entrevista com o paciente, para tentar identificar as principais características dessa dor e, se for o caso, poder encaminhá-lo a outro tipo de atendimento, seja para um clínico geral, um ortopedista ou um neurologista.

“O farmacêutico é o profissional que é a porta de entrada do paciente no sistema de saúde como um todo. Então, ele deve auxiliar o médico a fazer o diagnóstico desses componentes, relacionados à dor mista, por meio de perguntas ao paciente sobre os sintomas, pois, o farmacêutico é muito próximo da população. Se caso o farmacêutico indicou, por exemplo, um MIP para o paciente e não teve resultados, então, ele deve encaminhá-lo a um serviço de saúde. Acho que os farmacêuticos trabalham como grandes parceiros dos médicos”, finaliza Juliana. 

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