O diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirmou que a demora da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em aprovar o uso do soro anticoronavírus em humanos ocorre devido à insegurança do órgão regulador, conforme revelou o G1. “A Anvisa sempre se pronuncia só após outras agências”.
De acordo com Covas, é a primeira vez que a Anvisa precisa autorizar o uso de um soro no País. O soro está sendo desenvolvido pelo Butantan desde o ano passado, a partir do plasma de cavalos e será testado inicialmente em pacientes transplantados do Hospital do Rim, em São Paulo.
“A Anvisa sempre se pronuncia só após outras agências se pronunciarem. Quando se submete à Anvisa pela primeira vez um soro, existe uma dificuldade lá, uma insegurança. Porque essa decisão da Anvisa vai valer pro mundo inteiro”, disse Covas, durante uma reunião pública virtual da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp).
No encontro, os deputados se reuniram com a diretoria, pesquisadores e técnicos do Butantan para obter informações sobre o soro e o plasma desenvolvidos para o tratamento da Covid-19. A Anvisa autorizou o início dos testes em humanos em 24 de abril, mas depois pediu informações adicionais e, por isso, os estudos clínicos ainda não foram iniciados.
De acordo com o presidente do Butantan, após a autorização do início dos estudos clínicos, a Anvisa voltou atrás e solicitou inclusive a padronização de um estudo clínico que não existe. “Eles não solicitaram só a informação, solicitaram a geração de informação. Exigem teste, comprovação da presença ou ausência de certas substâncias. Criam série de questionamentos que exigem de nossa parte exames, desenvolvimento de métodos que nem existem aqui. Exigiram a realização de um estudo clínico que não existe no mundo. Tivemos que padronizar, desenvolver o estudo clínico pra atender à Anvisa. E isso não é habitual. Isso é em decorrência da própria insegurança deles”, ressaltou Covas.
O soro é para ser usado quando as pessoas se infectam, principalmente as que possuem alguma comorbidade e podem desenvolver uma forma mais grave da doença. O objetivo do soro é amenizar os sintomas da doença nas pessoas já infectadas. Ele não é capaz de curar nem de prevenir a Covid-19. “O soro é como se fosse uma vacina imediata. Anticorpos que funcionam na hora já começam a neutralizar o vírus. Seria usado nesse paciente que tem chance de ir pra UTI”, explicou Covas.
Butantan tem 3.000 frascos prontos para iniciar os testes. A autorização permitirá que o soro seja aplicado em pessoas contaminadas pela doença e, depois, que se descubra qual a dose necessária para obter os efeitos desejados. Assim que os testes clínicos em humanos começarem, o instituto vai pedir o uso emergencial para a Anvisa.
Tecnologia brasileira
Para a produção do soro, os técnicos retiram o plasma – que faz parte do sangue – do cavalo e levam para a sede do Butantan, em São Paulo. Os anticorpos são separados do plasma e se transformam em um soro anticovid.
Os cavalos, além de ajudarem a produzir o soro, participaram dos testes. O vírus inativo não provoca danos aos animais nem se multiplica no organismo, mas estimula a produção de anticorpos. No início de março, Dimas Covas disse que os testes feitos em animais apontaram que o soro é seguro e efetivo.
“Os animais que foram tratados tiveram seu pulmão protegido, ou seja, não desenvolveram a forma fatal da infecção pelo coronavírus, mostrando que os resultados de estudos em animais são extremamente promissores e esperamos que a mesma efetividade seja demonstrada agora nesses estudos clínicos que poderão ser autorizados”, disse o diretor do Butantan.
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Para o farmacêutico e professor de pós-graduação em Farmácia Clínica e Prescrição Farmacêutica do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, Thiago de Melo, o soro é uma aposta promissora. “Olho com bons olhos essa alternativa, tomara que os ensaios humanos deem certo e que se encontre a dose ideal. Mas deve-se considerar que ele não é o elixir, a bala de prata, mas faz parte de uma cesta de possibilidades contra a atuação do Sars-Cov-2”, revelou em uma live do ICTQ.
“Essa é uma tecnologia que o Brasil domina há anos, uma proposta de imunização passiva, ou seja, não é para tomar preventivamente (como acontece com o soro antiofídico). O propósito é expor as pessoas que têm dificuldade de memória imunológica a esses tipos de anticorpos”, diz Melo.
Ele aponta também outra vantagem do soro. No cavalo é injetado o vírus inteiro inativado. Com isso, não há apenas a exposição da proteína ‘S’, como no caso dos anticorpos monoclonais. O organismo do cavalo, que tem linfócitos B, reconhece tipos diferentes de proteínas, produzindo anticorpos diferentes, que são os chamados policlonais. “Qual é a vantagem disso? Se por acaso surgirem novas cepas do vírus teremos mais chances de atuar sobre epitopos diferentes”.
Para assistir a participação do professor Thiago de Melo na íntegra, basta acessar a página do ICTQ no Instagram.
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