TCU aponta ilegalidade na distribuição de cloroquina com dinheiro do SUS

TCU aponta ilegalidade na distribuição de cloroquina com dinheiro do SUS

Auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) apontou ilegalidade no uso de recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) para o fornecimento de cloroquina e hidroxicloroquina a pacientes com Covid-19, prática defendida pelo presidente Jair Bolsonaro e implementada pelo ministro da Saúde Eduardo Pazuello, revelou a Folha.

Somente para Manaus (AM), durante a crise do oxigênio, o Ministério da Saúde (MS) enviou 120 mil comprimidos de hidroxicloroquina, sendo que as unidades de saúde precisavam, como anotado em diversas alertas feitos ao ministro, de oxigênio. Pacientes morreram asfixiados.

No TCU, o parecer foi elaborado pela Secretaria de Controle Externo da Saúde (SecexSaúde). A área técnica concluiu “não haver amparo legal” para o uso de recursos do SUS na distribuição de medicamentos não aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para tratamento da Covid-19, como aqueles à base de cloroquina, que tampouco obtiveram a chancela de órgãos internacionais de saúde. Não há comprovação científica sobre a eficácia da cloroquina para o tratamento precoce de pacientes com Covid-19.

O entendimento dos auditores foi transcrito no despacho do ministro do TCU Benjamin Zymler, relator do processo. “Como não houve manifestação da Anvisa acerca da possibilidade de se utilizar os medicamentos à base de cloroquina para tratamento da Covid-19 e tampouco dos órgãos internacionais antes mencionados (as ‘Anvisas’ de outros países), verifica-se não haver amparo legal para a utilização de recursos do SUS para o fornecimento desses medicamentos com essa finalidade”.

Segundo a auditoria, há algumas situações em que é possível usar um medicamento contra uma doença para a qual ele não é indicado. Os auditores afirmam que o uso da cloroquina só poderia ocorrer ‘off label’ (fora do que prevê a bula), mas para que um medicamento nessas condições seja fornecido pelo SUS, é preciso haver autorização da Anvisa.

Durante a pandemia, a regra foi flexibilizada, permitindo importações excepcionais de medicamentos, bastando para isso uma autorização emitida por uma das quatro agências equivalentes à Anvisa nos Estados Unidos, União Europeia, China e Japão. Contudo, “essas autoridades sanitárias também não aprovaram o uso de medicamentos à base de cloroquina para tratamento da Covid-19”, afirma o parecer do TCU.

O TCU diz ainda que a própria orientação do MS para tratamento precoce cita a falta de evidências científicas sobre o êxito de medicamentos desse tipo. “A nota informativa (do ministério) não possui os requisitos para se constituir em um protocolo clínico ou diretriz terapêutica”, afirma.

A área técnica do órgão recomendou que a nota do MS, elaborada na gestão de Pazuello, seja submetida à Anvisa, “a fim de que ela se manifeste sobre a autorização ou não do uso ‘off label’ da cloroquina e hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19”. A Anvisa confirmou à Folha que não deu autorização para uso ‘off label’ da cloroquina.

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Diante da conclusão dos técnicos do tribunal, o ministro Zymler determinou que o MS explique em cinco dias úteis a posição da pasta em relação ao uso de cloroquina por pacientes com Covid-19. O despacho foi expedido na última sexta-feira (22/1).

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Ao decidir pedir uma “posição oficial” do Ministério da Saúde sobre o assunto, o ministro Zymler apontou que Eduardo Pazuello adotou, nos últimos dias, uma posição ‘contraditória’, ao afirmar não indicar medicação para o combate à Covid-19, e sim que as pessoas procurem por “atendimento precoce” nos serviços de saúde.

“Consoante apontado pelos dirigentes da SecexSaúde, as manifestações do titular da pasta são contraditadas pelos documentos emitidos pelo ministério, os quais indicam os medicamentos a serem utilizados, com as respectivas posologias, para o tratamento da Covid-19”, afirmou Zymler.

A pasta também deve explicar quem foi o responsável por colocar no ar um aplicativo, o TratCov, que orientava o uso indiscriminado do medicamento. “Outro ponto de realce é que Ministério da Saúde disponibilizou aplicativo para profissionais de saúde que estimula a prescrição de medicamentos à base de cloroquina para o tratamento da Covid-19”, escreveu o ministro do TCU.

Pazuello é formalmente investigado também em um inquérito pedido pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e aberto por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo a Folha, ele é suspeito da prática de crimes, em razão do que ocorreu em Manaus, e precisará prestar depoimento à Polícia Federal.

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