Inteligência e estratégia regulatória é uma prática inerente ao profissional farmacêutico que deseja realizar uma gestão pautada em regulação sanitária e necessidade corporativa.
Para entender isso, basta citar que o ambiente globalizado e os avanços tecnológicos estão provocando mudanças rápidas no ambiente competitivo nunca antes vistas no mercado. Esse ambiente de incerteza dificulta a tomada de decisão, principalmente no que diz respeito ao longo prazo.
Em muitas indústrias, uma decisão errada pode levar à falência da organização. Para sobreviver nesse ambiente é fundamental dispor de um sistema de inteligência competitiva que forneça informações analisadas de forma integrada e tempestiva para que seja possível tomar decisões mais seguras e em tempo real, garantindo, assim, a sobrevivência da empresa.
“Dados, informações e conhecimentos, em um ambiente corporativo, se diferenciarão quanto à sua utilização. E, se bem usados, ajudarão a sanar incertezas, podendo ser fundamentais para que as tomadas de decisão sejam respaldadas em fundamentos sanitários legais”, afirma a professora do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, Fabiana Neves Figueiredo. Ela afirma, ainda que esses elementos são considerados fatores estratégicos, desde que seja desenvolvida a gestão da informação voltada para buscar vantagem competitiva.
A inteligência e estratégia regulatória são baseadas no profissional farmacêutico atuando em todas as áreas de mercado e desenvolvendo, não só a gestão da informação de forma estratégica, mas também o seu perfil atuante nessa prática. Fabiana explica que a prática de inteligência regulatória envolve três grandes áreas: inteligência competitiva, gestão estratégica e plano estratégico.
- Inteligência Competitiva: uma forma proativa de captar e organizar informações relevantes sobre o comportamento da concorrência, mas também dos clientes e do mercado como um todo, analisado tendências e cenários, e permitindo um melhor processo de tomada de decisão no curto e longo prazos.
- Gestão Estratégica: forma de acrescentar novos elementos de reflexão e ação sistemática e continuada, a fim de avaliar a situação, elaborar projetos de mudanças estratégicas e acompanhar e gerenciar os passos de implementação em uma organização, ou seja, é gerir toda a organização, com foco em ações estratégicas em todas as áreas.
- Plano Estratégico: processo gerencial que diz respeito à formulação de objetivos para a seleção de programas de ação e para sua execução, levando em conta as condições internas e externas da empresa e sua evolução esperada.
“Desenvolver a gestão estratégica da informação baseada em regulamentações sanitárias (regulatórias) proporciona vantagem comercial, atendendo à necessidade da empresa em se tornar competitiva perante os seus concorrentes e junto ao órgão de regulação”, defende Fabiana. Assim, o farmacêutico é visto como um profissional de inteligência, estratégico e, acima de tudo, fundamental para a indústria e para o mercado farmacêutico.
9 pontos importantes da estratégia e inteligência regulatória:
- Antecipar tendências de mercado;
- Enquadramento e regularização de produtos;
- Regularização de empresas;
- Defesa de cumprimentos de exigências;
- Apresentação do andamento do projeto;
- Análise de viabilidade regulatória para enquadramento de produtos frente à legislação sanitária brasileira;
- Análise prévia de material de propaganda da empresa para verificar possíveis riscos de autuação frente à legislação sanitária vigente;
- Avaliação prévia de layout de rótulo frente à presença ou ausência de itens obrigatórios, segundo a legislação sanitária vigente;
- Apresentação da gestão de processos e projetos.
Inteligência Competitiva
“O objetivo da inteligência competitiva é ampliar as condições de competitividade de uma empresa, reorientando seu modelo de negócios, suas metas, planejamentos etc.”, explica a professora, que cita: [...] é um processo informacional proativo que conduz à melhor tomada de decisão, seja ela estratégica ou operacional. É um processo sistemático que visa descobrir as forças que regem os negócios, reduzir o risco e conduzir o tomador de decisão a agir antecipadamente, bem como proteger o conhecimento gerado (ABRAIC, s/d).[...] é uma forma proativa de captar e organizar informações relevantes sobre o comportamento da concorrência, mas também dos clientes e do mercado como um todo, analisado tendências e cenários, e permitindo um melhor processo de tomada de decisão no curto e longo prazo.
Aplicação nas Organizações
KOTLER, 1998
A inteligência competitiva é um conjunto de atividades por meio das quais a empresa se propõe a, sistematicamente, coletar, armazenar, analisar e disseminar informações do ambiente externo, em sinergia com informações do ambiente interno, para auxiliar os gestores no processo de tomada de decisão e identificação de oportunidades e ameaças à organização. “Ou seja, trata-se de um processo sistematizado de captação de informações diversas para transformá-las em perspectivas que possam ser analisadas, para que ações sejam geradas e decisões sejam tomadas pela gestão”, ressalta Fabiana.
Etapas
1ª etapa: Planejamento
A etapa de planejamento passa, necessariamente, pela definição de questões como: o que monitorar, como monitorar, a partir de quais fontes de informação, para quem monitorar, como entregar os outputs de inteligência e com qual periodicidade.
Nessa etapa devem ser definidos todos os aspectos relevantes ao projeto de inteligência competitiva a ser estabelecido, bem como quais as métricas definidas para mensuração da eficácia de tal projeto.
2ª etapa: Coleta
A etapa de coleta compõe as atividades de busca das informações, tanto no ambiente interno como no ambiente externo à organização, que criam a base de conhecimento para as etapas seguintes.
“Além disso, é importante lembrar que as fontes de coleta estão se diversificando. Notícias de jornais já não são mais uma base suficiente. O monitoramento de mídias sociais traz uma visão mais holística do alvo a ser analisado”, lembra a professora.
3ª etapa: Análise
Nesta etapa, o conjunto de informações coletadas deverá ser analisado a partir do que foi definido como cenário e foco pela organização. Uma análise bem feita deve trazer mais que informações interessantes. Ela precisa oferecer elementos acionáveis, que permitam à empresa tomar decisões.
4ª etapa: Disseminação
A disseminação da inteligência contempla a entrega dos produtos de inteligência que foram determinados na etapa de planejamento do projeto.
A discussão sobre o material produzido é fundamental para identificar as ações e decisões a serem tomadas pela gestão. “Uma maneira interessante de fazê-la é promover uma reunião de criação de sentido, em que o material é avaliado e discutido a partir das diferentes visões das pessoas envolvidas no projeto, incluindo a alta administração”, avalia Fabiana.
Ferramentas utiizadas
- PDCA (CICLO DEMING): é uma ferramenta para o desenvolvimento de planos de ação, utilizada para manter ou melhorar processos, auxiliando o desenvolvimento das empresas. Como todos os modelos de qualidade, este contribui para obtenção de um constante aperfeiçoamento.
- Planejar (Plan)
- Executar (Do)
- Controlar (Check)
- Agir(Act)
KOTLER, 1998
- Análise SWOT é uma ferramenta utilizada para fazer análises de cenário, sendo empregada como base para a gestão e o planejamento estratégico de uma organização. Trata-se de um sistema modesto que tem como objetivo posicionar ou examinar a posição estratégica da organização no ambiente em questão. É uma ferramenta valiosa para qualquer organização, pois gera diagnóstico preciso da situação da empresa, o que permite melhoramento das vantagens competitivas. (DAYCHOUM, 2007).
(DAYCHOUM, 2007)
- Benchmarking é um processo sistemático de comparações entre processos semelhantes e, a partir delas, a promoção de melhorias que permitam que uma determinada atividade tenha excelência quando comparada com outras equivalentes em empresas do mesmo setor ou de outros setores da economia.
O benchmarking auxilia empresas a definir metas, estimula novas ideias e oferece um método formalizado de gerenciamento de mudança (ROGERS, 1995).
(ROGERS, 1995)
- Balanced Score card preserva as medidas de desempenho financeiro e provê uma estrutura para organizar os objetivos estratégicos em quatro perspectivas (KAPLAN; NORTON, 2001):
1) financeira (da estratégia de crescimento, rentabilidade e risco na perspectiva do acionista);
2) do cliente (da estratégia de criação de valor e diferenciação a partir da perspectiva do cliente);
3) de processos internos (as prioridades estratégicas de vários processos de negócio que criam satisfação de clientes e acionistas); e
4) de aprendizagem e crescimento (prioridades para criar um clima que suporte mudança organizacional, inovação e crescimento).
(KAPLAN; NORTON, 2001)
Cinco Forças Competitivas de Porter
Fabiana ressalta as cinco forças competitivas de Porter, por meio das seguintes citações: “...na luta por participação de mercado, a concorrência não se manifesta apenas nos outros participantes... Clientes, fornecedores, potenciais entrantes e produtos substitutos são todos competidores que podem ser mais ou menos importantes ou ativos, dependendo do segmento”. As cinco forças de Porter podem ser compreendidas como uma técnica que apoia a definição estratégica de uma organização, considerando os ambientes interno e externo. (MCGEE; PRUSAK, 1994).
Fatores Críticos de Sucesso (FCS) são aqueles que, pela sua natureza, podem comprometer todo o sucesso de um plano ou de uma estratégia, devendo ser considerados como críticos e merecer atenção especial por parte da administração.
Por meio dos FCS é possível identificar com maior precisão as necessidades de informações referentes às questões estratégicas ponderadas como difíceis para que a empresa obtenha sucesso organizacional no decorrer do tempo (STOLLENWERK, 2001).
(STOLLENWERK, 2001)
Gestão Estratégica
Para um gestão estratégica eficaz é fundamental um processo sistemático, planejado, gerenciado, executado e acompanhado, sempre sob a liderança da alta administração da organização, envolvendo e comprometendo todos os gerentes e colaboradores. “O objetivo é assegurar o crescimento, a continuidade e a sobrevivência da organização por meio da adaptação contínua de sua estratégia, de sua capacitação e de sua estrutura, possibilitando-lhe enfrentar as mudanças observadas ou previsíveis no seu ambiente externo ou interno, e antecipando-se a elas”, explica Fabiana.
Isso inclui a construção da visão, missão, valores, que são elementos típicos na formação da identidade da empresa. Missão é o propósito, é o motivo da existência de uma organização. Visão é um modelo mental de um estado ou situação altamente desejável, de uma realidade futura possível para a organização. Valores são características, virtudes, qualidades da organização, que devem ser preservadas e incentivadas.
Fabiana cita outro parâmetro: o core business, que significa o núcleo do negócio. É a parte principal de um determinado negócio, o ponto forte de uma empresa que deve ser trabalhado estrategicamente.
“O principal objetivo é fazer com que a organização explore sua maior vantagem competitiva (mercado, produto, ramo) para poder traçar estratégias a fim de expandir e manter seu negócio”, revela a professora.
A maior dificuldade do core business é achar o equilíbrio certo entre a amplitude e o foco, achar a oportunidade ideal para expandir, mas sem perder sua estratégia e pensar sobre até onde a estratégia pode e deve alcançar.
Ela dá continuidade ao conceito, falando sobre o mapa estratégico, que nada mais é que a representação visual da estratégia da instituição, em que cada componente se organiza de forma balanceada, sempre considerando a interação de causa e efeito entre eles.
O mapa estratégico é composto por: missão, visão, perspectivas, objetivos estratégicos e valores. “Missão é a razão de ser da instituição - o propósito de sua existência.
Visão é a posição futura desejada pela instituição – como quer ser vista pela sociedade.
Perspectiva é a organização dos objetivos estratégicos da instituição”, define Fabiana.
Já os objetivos estratégicos são os grandes desafios definidos para a instituição e os valores são os princípios que regem os comportamentos e interações das pessoas das instituições.
Alinhamento Estratégico e Regulatório
Na era da informação, as organizações requerem agilidade, mobilidade, inovação e mudanças necessárias para enfrentar as novas ameaças e oportunidades em um ambiente de intensa mudança e turbulência. (CHIAVENATO, 1999).
A melhor organização não é aquela que detém a tecnologia mais avançada, mas aquela que sabe extrair o máximo proveito de suas tecnologias atuais. (CHIAVENATO, 2004).
Toda organização enfrenta desafios, como:
- Globalização: a preocupação com a visão global do negócio, mapeando os concorrentes e avaliando a posição dos seus produtos e serviços.
- Pessoas: treinamento, educação, motivação, liderança paras as pessoas que trabalham na organização, despertando o espírito empreendedor e oferecendo a elas uma cultura participativa ao lado de oportunidades de plena realização pessoal.
- Clientes: a capacitação de conquistar, manter e ampliar o universo de clientes, sendo este o melhor indicador de sobrevivência e crescimento da organização.
- Produtos e serviços: a necessidade de diferenciar os produtos e serviços em termos de qualidade e de atendimento.
- Conhecimento: esta é a era da informação, em que o recurso organizacional mais importante - o capital financeiro – está cedendo espaço para outro recurso imprescindível: o capital intelectual.
- Resultados: a necessidade de fixar objetivos e perseguir resultados positivos, com a aplicação de redução de custos e aumento de receitas.
Estrutura Organizacional
“Estrutura organizacional é o instrumento administrativo resultante da identificação, análise, ordenação e agrupamento das atividades e dos recursos das empresas, incluindo o estabelecimento dos níveis de alçada e dos processos decisórios, visando ao alcance dos objetivos estabelecidos pelos planejamentos das empresas”. (OLIVEIRA, 2006)
Fabiana lista as funções básicas da estrutura organizacional, que são:
1) Organizar funções e responsabilidades
- Produzir produtos organizacionais e atingir as suas metas;
- Minimizar as variações individuais sobre a organização;
- Estabelecer o contexto no qual o poder é exercido;
- Identificar as tarefas que devem ser executadas;
- Disponibilizar recursos e informações aos funcionários; e
- Estabelecer medidas de desempenho e condições motivadoras.
2) Otimizar as atividades e tarefas:
- Melhorar os fluxos internos da organização;
- Propiciar maior comunicação entre os setores e processos;
- Propiciar a consolidação das redes formais da organização;
- Propiciar maior equilíbrio aos níveis de decisão;
- Racionalizar os fluxos de informação; e
- Melhorar a relação custo x benefício.
Tipos de Estrutura Organizacional
“Há dois tipos de estrutura organizacional a serem entendidos, a formal e a informal. A formal é deliberadamente planejada e formalmente instituída com a intenção de organizar a corporação, em aspectos relacionados à responsabilidade, autoridade, comunicação, e atribuição das atividades. Já a informal é a rede de relações sociais e pessoais que não é estabelecida ou requerida por diretrizes ou normas. Surge da interação social das pessoas, o que significa que se desenvolve espontaneamente quando as pessoas se reúnem”, destaca professora.
Assuntos regulatórios na estrutura da organização
O setor de assuntos regulatórios é responsável pela regularização de produtos e estabelecimentos sanitários. Ele tem a função de orientação e suporte técnico aos departamentos internos, de antecipação de tendências, de controle de mudanças e de estabelecer a estratégia regulatória para o sucesso e vantagem competitiva da empresa. E o farmacêutico é peça fundamental.
O setor de assuntos regulatórios deve ser inserido na organização com a função de atuar com inteligência regulatória x competitiva, fornecer treinamentos nos ambientes interno e externo, dar suporte estratégico aos demais setores da empresa, atuar como o setor organizado, fundamentada legislação sanitária e ter conhecimento profundo sobre a natureza da empresa. “Para ser um setor sustentável é fundamental ser consciente de seus deveres e de suas possibilidades de contribuir com sociedades e o meio ambiente” defende Fabiana.
Posicionamento de Mercado
Segundo Philip Kotler, posicionamento de mercado é “a ação de projetar o produto e a imagem da organização, com o fim de ocupar uma posição diferenciada na escolha de seu público-alvo”. Em termos práticos, o posicionamento pode ser obtido a partir da fórmula: Segmentação + Diferenciação = Posicionamento. “Logo, a análise do posicionamento é indispensável para avaliar o destaque da imagem da empresa. A imagem que a empresa deseja refletir a seus consumidores, nem sempre é a percebida por eles por isso a análise do posicionamento é indicada”, destaca Fabiana.
Ela afirma que, em termos de diferencial competitivo, pode-se dizer que são atributos que tornam a empresa única e superior aos seus principais concorrentes. Tratam-se das vantagens e benefícios exclusivos que a empresa proporciona à sua clientela e que a concorrência ainda não conseguiu oferecer.
“A interface entre assuntos regulatórios e estratégia de mercado é a inteligência e estratégica sanitária regulatória. Essa nova abordagem de gestão regulatória demanda o saber contínuo na construção do conhecimento robusto e sustentável para que se possa acompanhar, compreender e desenvolver inteligência técnica e regulatória”, finaliza a professora do ICTQ.