É muito raro que uma empresa, ainda mais de um segmento tão delicado quanto o farmacêutico, permita o acesso de jornalistas a processos de desenvolvimento de produtos com a possibilidade de entrevistar as pessoas diretamente envolvidas na questão.
É esse o principal diferencial do livro “A vacina - a história do casal de cientistas pioneiros no combate ao coronavírus”. O jornalista Joe Miller é correspondente do “Financial Times” em Frankfurt, na Alemanha, e pôde acompanhar a sequência de pesquisas, contratempos, dificuldades e finalmente êxito para a criação da vacina contra a covid pela BioNTech (a que chamamos de vacina "da Pfizer").
Miller teve a sorte de muitos grandes repórteres de ser o “homem certo no lugar certo”. Depois de trabalhar seis anos na BBC, com passagens por Nova York, Nova Deli e Berlim, além de Londres, foi contratado pelo FT para a cobertura da Alemanha em setembro de 2019 - apenas seis meses antes do início da pandemia.
Com a experiência e o faro de jornalista investigativo, passou a escrever sobre a BioNTech e seus dois fundadores. Ugur Sahin, de 56 anos, e Özlem Türeci, 54, ambos descendentes de turcos, criaram a empresa em 2008 com uma meta bem definida - encontrar a cura para o câncer.
Miller foi o primeiro a escrever matérias em inglês sobre os dois, e a proximidade lhe deu, então, acesso à equipe da BioNTech e também a representantes do governo alemão e da agência equivalente à nossa Anvisa. Com esses dados, o livro “A vacina” se tornou um best-seller na Alemanha e já ganhou tradução em pelo menos 15 línguas em seis meses depois do seu lançamento original.
Embora trate de um assunto árido - o desenvolvimento de uma vacina -, a publicação retrata momentos dramáticos no processo, ganhando ritmo semelhante, em certa medida, à pressão vivida pelos cientistas para que o “descobrimento” de um produto eficaz contra a expansão do coronavírus ganhou logo nos primeiros meses da pandemia.
O livro conta em detalhes a história dos dois fundadores da BioNTech, agora conhecidos internacionalmente. Eles podem ser encaixados com facilidade no estereótipo de cientistas, uma espécie de professor Pardal das histórias em quadrinhos de Walt Disney e da imagem que se tem de Albert Einstein.
Ou, como disse a própria Türeci: “Nós somos os típicos nerds”. Ela nasceu numa família de classe média com forte inclinação para as ciências. Os pais, ambos imigrantes turcos, trabalham na área médica. E ela já disse que foi inspirada pelas freiras que trabalhavam no mesmo hospital onde seu pai era médico. Estudou medicina e se dedicou principalmente à pesquisa.
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Sahin nasceu na Turquia e mudou-se, com a família, para a Alemanha quando tinha 4 anos. Estudou medicina na Universidade de Colônia, e seu doutorado já mostrava qual era seu principal interesse, ao pesquisar sobre imunoterapia contra o câncer.
Há cerca de 20 anos, mantendo a carreira acadêmica, ele passou a ser empreendedor também, abrindo dois laboratórios. É essa combinação de pesquisador com empresário, não tão comum no mundo da ciência, que talvez explique o sucesso do desenvolvimento da vacina. Sahin já publicou cerca de 350 estudos científicos.
Foi com a sua segunda empresa, a BioNTech, que, em parceria com a Pfizer, conseguiu desenvolver a vacina que ajudou a brecar o avanço da pandemia. Ao longo da sua história, o laboratório contou com uma série de apoiadores e faz contratos com universidades e outras empresas do ramo farmacêutico.
Segundo publicações alemãs, os dois entraram na lista dos cem alemães mais ricos, a primeira vez que isso acontece com pessoas de origem turca.
Largos trechos da “A vacina” são dedicados ao detalhamento de como foi desenvolvida a vacina e quais são os diferenciais em relação a outros processos tocados por vários laboratórios globais. Isso pode assustar os leitores não familiarizados com expressões como “tecnologia de mRNA”, mas vale a pena insistir na leitura. De forma geral, o texto é claro e é evidente um esforço do autor em tentar explicar as questões mais técnicas.
Embora centrado no casal, o livro de Joe Miller não se limita a contar a história deles. Ganham voz no livro outros cientistas que já trabalhavam na BioNTech ou foram chamados para ajudar na corrida para descobrir o mais rapidamente possível a vacina.
Na apresentação da obra, Miller informa que entrevistou 60 pessoas - por causa do distanciamento social imposto pela pandemia, na grande maioria dos casos as conversas não foram pessoalmente, o que pode ser um entrave para a apuração dos fatos. Por causa dessas circunstâncias e da rapidez com que o livro foi escrito e lançado, poucos meses depois do início da vacinação, Miller considera que seu relato é um "rascunho da história".
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