Nesta quinta (11/03), o gerente de uma farmácia foi condenado a pagar uma indenização de R$ 11 mil por divulgar, de forma ilegal, a receita médica do infectologista David Uip, na qual havia a prescrição de difosfato de cloroquina, conforme divulgado pelo R7.
O caso aconteceu em abril do ano passado, quando Uip coordenava o Centro de Contingência contra o novo Coronavírus em São Paulo. O infectologista contraiu a doença e, poucos dias depois, sua receita médica foi viralizada na internet.
O documento apontava o uso de hidroxicloroquina no tratamento. Isso gerou uma série de polêmicas e desconforto político, já que, mesmo sem eficácia comprovada, o medicamento era fortemente defendido pelo presidente Jair Bolsonaro. Em contrapartida, o governador de São Paulo, João Doria, e o Centro de Contingência do Estado defendiam, à época, o isolamento social, e não reconheciam o fármaco como tratamento contra a doença.
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A decisão foi dada em audiência no Juizado Especial Criminal do Fórum da Barra Funda, em São Paulo. O gerente da farmácia foi acusado pelo crime de violação de sigilo profissional, que rende pena de detenção de três meses a um ano.
O Ministério Público estadual ofereceu ao acusado uma pena criminal. Entretanto, após negociação, ficou definida em R$ 11 mil, que será paga em quatro vezes, diretamente ao Fumcad (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente) da Prefeitura de São Paulo.
O acusado tentou negociar a pena, pedindo ao juiz um parcelamento em 10 vezes. Porém, foi recusado pelo MP e pelo advogado de Uip, Luiz Flávio Borges D'Urso, que justificou a negativa embasado na gravidade do ato e nas consequências ocasionadas à vítima e à sua família.
“Caso aceito este parcelamento, o sentimento seria de impunidade, diante da gravidade do comportamento do acusado, que impingiu enorme sofrimento ao Prof. David Uip e sua família, quando foram alvos de incontáveis manifestações de ódio, tanto pessoalmente como pela internet, inclusive com ameaças, tudo por causa desse odioso vazamento da receita médica do meu cliente, em grupos de WhatsApp, o que é crime”.
Ética do farmacêutico com o paciente
O caso de Uip abre espaço para dialogar sobre a conduta ideal a ser seguida pelo farmacêutico quanto à dispensação de medicamentos.
A coordenadora acadêmica do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico e especialista em farmácia clínica e prescrição farmacêutica, Juliana Cardoso, fala sobre o tema, destacando a ética profissional, que deve sempre prevalecer, e traz um importante alerta aos farmacêuticos.
“A ética precisa ser mantida desde a chegada do paciente até a dispensação e arquivamento da receita. A não responsabilidade sobre este documento implica significantemente na efetividade do trabalho farmacêutico. Um profissional pode ser absolvido pela justiça criminal e apenado no processo ético-disciplinar, pois se tratam de esferas distintas”.
Ela lembra que, “de acordo com o artigo 20 da Resolução do Conselho Federal de Farmácia (CFF), nº 357/01, a presença e atuação do farmacêutico são requisitos essenciais para a dispensação de medicamentos aos pacientes, cuja atribuição é indelegável, não podendo ser exercida por mandato nem representação”.
Em seguida, Juliana pontua que, da mesma forma que há essa atribuição do profissional, existe também a responsabilidade dele sobre o receituário e os dados do paciente.
“Precisamos nos atentar que o receituário é um documento importante, não somente relacionado a terapia farmacológica, contudo faz parte da privacidade do paciente, acerca da sua promoção a saúde e qualidade de vida”.
Como proteger dados do paciente
Quanto à proteção dos dados do paciente, a coordenadora destaca que há cuidados essenciais que o farmacêutico deve ter para garantir que não haja vazamento das informações.
Entre eles, ela cita a organização correta dos receituários, assim como manter as informações sob sigilo, ter senhas de acesso para programas computadorizados e usar criptografia nos programas vinculados à internet.
Juliana enfatiza que qualquer exposição de fotos, vídeos ou qualquer informação sem autorização do paciente é proibido. Com essas medidas, segundo ela, o farmacêutico fortalece a confiança com o seu paciente.
“Com a conduta apropriada, somos habilitados a prevenirmos a vazão de informações e mantermos a privacidade do consumidor, zelando pelo elo de confiança entre farmacêutico e paciente. A dispensação de medicamentos, quando realizada de forma ética, legal e tecnicamente correta, contribui para fortalecer o vínculo com o farmacêutico e o reconhecê-lo como agente de saúde e da farmácia como estabelecimento de saúde”, finalizou.
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