A conciliação medicamentosa é um instrumento de segurança, que garante a continuidade e a adequação da terapia medicamentosa na admissão, na transição do cuidado e até mesmo na alta hospitalar. Na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), onde os pacientes são altamente vulneráveis e, a transição do cuidado costuma ser abrupta, essa prática é essencial e deve ser conduzida com precisão técnica pela equipe multidisciplinar e, em especial, por um farmacêutico clínico hospitalar.
“O farmacêutico clínico hospitalar deve adotar uma abordagem sistematizada que inclua: a coleta estruturada do histórico medicamentoso prévio, utilizando múltiplas fontes: prontuário eletrônico, entrevistas com familiares ou cuidadores, contato com farmácias de origem e, quando possível, com o próprio paciente”, explica o professor do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, farmacêutico Clínico e PhD em farmacologia, Matheus Tavares.
Ele continua elencando outros parâmetros da abordagem sistematizada:
- comparação ativa entre a prescrição inicial na UTI e os medicamentos de uso prévio, identificando omissões, duplicidades, interações ou doses inadequadas;
- documentação clara das justificativas clínicas para a continuidade, suspensão ou substituição de medicamentos;
- atuação em conjunto com a equipe multiprofissional, especialmente médicos e enfermeiros, para alinhar condutas e garantir que todas as decisões farmacoterapêuticas estejam fundamentadas.
“Essa estratégia previne eventos adversos, reduz readmissões hospitalares e melhora a continuidade do cuidado”. Alerta Tavares.
Segurança de pacientes críticos
Para explicar como o monitoramento terapêutico de medicamentos de faixa estreita impacta diretamente a segurança dos pacientes críticos, Tavares menciona: “Conceitualmente, nos referimos a esses fármacos como medicamentos de baixo índice terapêutico. São fármacos cuja concentração plasmática eficaz está muito próxima da concentração que pode causar toxicidade, ou seja, a margem entre o efeito terapêutico desejado e os tóxicos é mínima”.
Ele destaca que o farmacêutico clínico hospitalar tem papel fundamental na sua gestão, especialmente em ambientes críticos como a UTI, em que há pacientes, muitas vezes, com múltiplas alterações fisiológicas — como disfunção renal ou hepática, hipoalbuminemia e instabilidade hemodinâmica, tornando esse controle ainda mais desafiador.
Logo, estratégias para o monitoramento terapêutico de fármacos devem ser lançadas pelo farmacêutico clínico intensivista. Dentre elas, o professor destaca:
- sugestão/solicitação e interpretação de exames de níveis séricos desses medicamentos;
- avaliação da farmacocinética individual do paciente (volume de distribuição, taxa de depuração);
- intervenção farmacêutica para ajuste de doses e intervalos com base em parâmetros laboratoriais e clínicos.
“Esse acompanhamento contínuo minimiza o risco de toxicidade e falha terapêutica, promovendo um uso mais seguro e eficaz dos medicamentos, essencial em um ambiente de alta complexidade, como o da UTI”, pondera ele.
Interações medicamentosas em pacientes críticos
Na UTI, a avaliação de interações medicamentosas deve ser conduzida de forma criteriosa, individualizada e fundamentada clinicamente. Diante da alta complexidade dos pacientes críticos, o farmacêutico clínico hospitalar deve considerar diversos critérios que vão além da simples identificação de interações em sistemas eletrônicos.
Entre os principais fatores a serem priorizados, destacam-se: a gravidade e a relevância clínica da interação, com foco naquelas que apresentam risco real de eventos adversos graves ou comprometimento da eficácia terapêutica; a probabilidade de ocorrência, analisando a farmacocinética e farmacodinâmica envolvidas; e o estado clínico do paciente, incluindo pacientes em suporte avançado de vida (como ventilação mecânica, diálise ou ECMO).
“No entanto, é importante destacar uma falha recorrente na prática clínica de muitos farmacêuticos: a dependência exclusiva de aplicativos e bases eletrônicas para nortear condutas relacionadas a interações medicamentosas, sem a devida avaliação da relevância clínica do que está sendo identificado. Muitos profissionais, ainda em formação ou mesmo atuando no mercado, acabam limitando sua análise à presença ou ausência da interação em sistemas como Micromedex, Lexicomp ou UpToDate, sem questionar o impacto real daquela interação no contexto clínico específico do paciente”, adverte Tavares.
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Essa postura pode levar a condutas equivocadas, interrupções desnecessárias de medicamentos, ou, ao contrário, à subestimação de riscos clínicos relevantes. Isso evidencia uma lacuna importante na formação do farmacêutico clínico hospitalar, que ainda carece, em muitas instituições de ensino, de uma base sólida em raciocínio clínico, fisiopatologia aplicada e farmacologia clínica crítica.
Para o professor, a habilidade de interpretar informações em tempo real, correlacionando dados laboratoriais, sinais clínicos e evolução do paciente, é essencial para diferenciar uma interação potencial de uma interação clinicamente relevante, o que deve orientar a tomada de decisão farmacoterapêutica.
Portanto, a atuação do farmacêutico clínico hospitalar vai muito além da identificação automática de interações: ela deve incluir a proposição de alternativas terapêuticas viáveis, ajustes de dose e intervalo, comunicação assertiva com a equipe multiprofissional e o monitoramento ativo de sinais clínicos e laboratoriais que indiquem desfechos relacionados à interação. “Reforçar esse olhar crítico e clínico é fundamental para consolidar o papel do farmacêutico como profissional essencial dentro das equipes de cuidados intensivos”, finaliza Tavares.
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