O Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, celebrado em 10 de setembro, marca também a campanha Setembro Amarelo, que busca conscientizar a sociedade sobre a importância do cuidado com a saúde mental. Nesse cenário, o farmacêutico ocupa um espaço estratégico: seja na dispensação de medicamentos, na escuta ativa ou no acompanhamento farmacoterapêutico, ele pode identificar sinais de alerta e contribuir de forma decisiva para evitar desfechos indesejados.
A professora do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico e especialista em acompanhamento farmacoterapêutico em saúde mental, Ane Trento, destaca que o suicídio é uma das maiores questões de saúde pública da atualidade. Para ela, a atuação do farmacêutico vai muito além do balcão da farmácia.
Há dois fatores se destacam como principais indicadores de risco: tentativa prévia de suicídio e doença mental. “Cerca de 50% das pessoas que se suicidaram já haviam feito uma tentativa anterior. Além disso, quase todos os suicidas tinham uma doença mental, muitas vezes não diagnosticada ou, quando diagnosticada, sem tratamento adequado”, explica ela.
Entre as doenças mais associadas ao comportamento suicida estão a depressão, o transtorno bipolar, o alcoolismo, o abuso e dependência de drogas, além de transtornos de personalidade, como o borderline, e a esquizofrenia. Doenças crônicas graves, como alguns tipos de câncer, também podem desencadear ideação suicida pela perda de qualidade de vida.
Segundo a professora, cerca de 36% das pessoas que cometem suicídio apresentam transtornos de humor, como depressão ou transtorno bipolar: “Quando falamos em prevenção, é fundamental que o farmacêutico saiba reconhecer esses fatores de risco e esteja preparado para intervir de maneira ética e acolhedora”.
Como abordar o paciente com sofrimento emocional
A dispensação de medicamentos e as entrevistas clínicas oferecem oportunidades de contato direto com pacientes em sofrimento. Ane ressalta que o farmacêutico precisa se preparar para acolher e ouvir.
“Durante a anamnese, é comum fazer perguntas sobre hábitos de vida, sono, trabalho, disposição. Quando não existe vínculo próximo, podemos começar por questões mais generalistas, que deixem o paciente confortável para falar. Já quando há uma relação de confiança, é possível aprofundar mais, inclusive com pacientes que tenham histórico de tentativas anteriores de suicídio”, afirma.
Questões como “como anda sua vida?”, “quais são seus planos de futuro?” ou “o medicamento está trazendo a melhora esperada?” ajudam a abrir espaço para que o paciente expresse sentimentos e perceba que tem apoio. “O objetivo não é interrogar, mas oferecer um espaço seguro, de escuta, para que a pessoa consiga relatar suas dificuldades”, acrescenta ela.
Psicofármacos e adesão: papel crucial do farmacêutico
O conhecimento sobre psicofármacos é apontado por Ane como indispensável para o farmacêutico que atua na prevenção ao suicídio. Segundo ela, entender o mecanismo de ação, os efeitos colaterais iniciais e a importância da adesão correta ao tratamento fazem diferença na evolução clínica.
“A grande maioria dos pacientes que cometem suicídio tem depressão ou transtorno bipolar, o que automaticamente nos leva ao uso de antidepressivos. O problema é que, no início do tratamento, esses medicamentos podem causar efeitos colaterais que pioram a qualidade de vida momentaneamente. É um período de adaptação, em que o paciente precisa de acompanhamento próximo para manter a adesão”, explica.
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Esse momento exige vigilância especial: “Quando os antidepressivos começaram a ser usados, como a fluoxetina, paradoxalmente os índices de suicídio aumentaram. Isso porque o paciente ganha energia antes que as ideias suicidas desapareçam. Essa energia extra pode ser justamente o que faltava para que ele concretize o ato. Por isso, o acompanhamento é indispensável até que os sintomas de ideação diminuam e o prazer pela vida retorne”.
Para a professora, é essencial que o farmacêutico compreenda que seu papel não é apenas entregar a medicação, mas acompanhar a farmacoterapia, garantir adesão e comunicar-se com os demais profissionais de saúde sobre o progresso do paciente.
Integração multiprofissional: falando a mesma língua
A prevenção ao suicídio é um desafio que não pode ser enfrentado de forma isolada. Ane reforça que o trabalho em equipe é fundamental: “Quando existe uma equipe coesa e integrada, em que todos conversam entre si, passamos do interdisciplinar para o transprofissional. Isso significa alinhar as intervenções médicas, psicológicas, farmacêuticas e de outras áreas, para que o paciente receba um cuidado integral e caminhe em direção a um objetivo comum”.
Nesse processo, cada profissional cumpre um papel: o médico ajusta a prescrição, o psicólogo direciona a psicoterapia, o farmacêutico garante a adesão e a segurança do tratamento, enquanto educadores físicos, fonoaudiólogos, musicoterapeutas e outros especialistas contribuem com práticas complementares.
“O paciente precisa perceber que há uma rede de apoio ao redor dele. O farmacêutico, ao participar dessa rede, fortalece seu papel como agente de cuidado e segurança, principalmente na prevenção ao suicídio”, completa.
Farmacêuticos como agentes de esperança
O contato cotidiano do farmacêutico com pacientes em farmácias comunitárias, hospitais e clínicas coloca o profissional em uma posição privilegiada para identificar sinais precoces e agir. A escuta ativa, o conhecimento técnico sobre psicofármacos e a comunicação integrada com a equipe multiprofissional tornam-se ferramentas essenciais para salvar vidas.
No Setembro Amarelo, a reflexão vai além da campanha. Trata-se de reforçar a importância da saúde mental como parte indissociável do cuidado em saúde e de valorizar o papel de cada profissional.
“Prevenir o suicídio é uma tarefa coletiva. Mas o farmacêutico, por sua proximidade e pela confiança que estabelece com os pacientes, tem um papel diferenciado. Ele pode ser a voz que acolhe, o olhar que identifica sinais de risco e o elo que conecta o paciente à rede de cuidado”, conclui Ane Trento.
Capacitação farmacêutica
Para quem deseja se capacitar em Farmácia Clínica, o ICTQ oferece alguns cursos de pós-graduação que devem interessar:
- Farmácia Clínica e Prescrição Farmacêutica
- Farmácia Clínica em Unidade de Terapia Intensiva
- Farmácia Clínica em Cardiologia
- Farmácia Clínica e Atenção Farmacêutica
- Farmácia Clínica de Endocrinologia e Metabologia
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