Com a suspensão do prazo adicional para patentes de medicamentos definida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no início de maio, foram liberadas cerca de 3,5 mil patentes para o mercado, o que deflagrou uma corrida entre as indústrias brasileiras para colocar novas fórmulas de genéricos nas prateleiras, revelou o Estadão.
De acordo com o jornal, as indústrias farmacêuticas nacionais planejam ampliar lançamentos em até 30% com o novo prazo de patentes. Muita gente do mercado acredita que medida é muito positiva, pois possibilitará a entrada de novos competidores e vai baratear medicamentos, já que os genéricos têm, por lei, preço ao menos 35% menor que o produto de referência, da empresa que desenvolveu a fórmula. Já alguns especialistas e representantes das multinacionais criticam a decisão, alegando que desestimulará o desenvolvimento de novas drogas.
A presidente executiva da Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos (PróGenéricos), Telma Salles, acredita que a medida não vai prejudicar o desenvolvimento de pesquisa e inovação entre as indústrias farmacêuticas. “Queremos a patente, porque isso estimula outros mercados, mas queríamos ter previsibilidade, o que essa decisão trouxe. O prazo atual já é suficiente para remunerar os investimentos das empresas”, afirmou ao Estadão.
Segundo ela, o mercado brasileiro será redesenhado e a medida vai estimular maiores gastos com pesquisa entre as próprias fabricantes brasileiras para adaptar as fórmulas. “A indústria está revendo este planejamento e vai centrar sua estratégia nos seus investimentos. Teremos lançamentos importantes, e esperamos crescimento para o setor e mais acesso à saúde para a população”, completou Telma.
Entre as que veem a decisão sem euforia e com alguma preocupação está a farmacêutica industrial e professora da pós-graduação de Gestão da Qualidade e Auditoria em Processos Industriais do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, Luciana Colli. “A redução do tempo de patentes pode afastar as empresas detentoras de inovação que trariam seus produtos ao Brasil, depositando suas patentes no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI)”, diz.
“Com a redução, muitas empresas poderão não ter interesse de pesquisar aqui porque elas vão levar em consideração o custo da inovação, que em termos de medicamento é elevadíssimo. Para uma empresa disponibilizar recurso e pesquisa para inovar ela precisa de uma contrapartida, que é poder explorar o mercado com exclusividade por um tempo. Se esse tempo for aquém de 20 anos talvez essa conta não feche, então a empresa não terá interesse nesse mercado”, completa a professora.
A decisão do STF também não agradou a parte da indústria farmacêutica, especialmente as empresas estrangeiras. De acordo com a presidente executiva da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), Elizabeth de Carvalhaes, a decisão traz insegurança jurídica ao mercado farmacêutico. A entidade representa mais de 50 laboratórios de capital estrangeiro em sua maioria.
“As empresas fizeram seus planejamentos e investimentos em inovação levando em conta uma projeção e permanência no mercado, com base na lei vigente há 25 anos”, disse Elizabeth ao Estadão. “A decisão súbita, tanto retroativa quanto indiscriminada aos produtos farmacêuticos, pode limitar o acesso da população brasileira a futuros produtos altamente inovadores”, ponderou.
Ela diz que, agora, cabe ao INPI adotar medidas firmes e definitivas para combater o acúmulo de requisições e garantir que as patentes sejam concedidas até, no máximo, o décimo ano após o depósito. “Caso contrário, os setores que investem em pesquisa, desenvolvimento e inovação serão prejudicados ao não terem qualquer garantia frente a atrasos burocráticos governamentais”, concluiu.
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Alheias à polêmica, indústrias como a brasileira União Química aponta que a medida vai possibilitar um incremento de 33% nos lançamentos previstos para os próximos três anos, de 70 medicamentos para 93 até 2024. A expectativa é dobrar o faturamento nesse período.
“A União Química vai pegar carona e se beneficiar dessa medida, porque muitos desses produtos que estavam retidos já estavam no nosso pipeline (em processo de desenvolvimento), mas precisávamos aguardar o término das patentes. Estamos puxando projetos de desenvolvimento para acelerar esses lançamentos”, afirmou ao Estadão o vice-presidente comercial da empresa, Vagner Nogueira.
Outra indústria brasileira, a EMS, já lançou o primeiro medicamento que perdeu a extensão da patente após a decisão do STF, a Rivaroxabana, para prevenção de coágulos, cuja fórmula do medicamento de referência pertencia à Bayer. Segundo o diretor médico-científico da companhia, Roberto Amazonas, o prazo do medicamento já teria expirado em novembro do ano passado, mas contava com extensão até 2022.
“Embora as moléculas estejam protegidas por patente, é possível trabalhar no registro delas e se programar. Já tínhamos passado por todo esse processo, que varia entre três e cinco anos, e pudemos nos antecipar para esperar a queda da patente”, revelou ao jornal.
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