Medicamento exige até 12 anos para ser desenvolvido e R$ 10 bilhões de investimento

Medicamento exige até 12 anos para ser desenvolvido e R$ 10 bilhões de investimento

Após passar por uma seleção de aproximadamente 10 mil moléculas, figurar na lista das 250 que entram em estudos pré-clínicos, apenas um medicamento acaba nas prateleiras das farmácias. Esse processo pode levar até 12 anos, consumindo mais de R$ 10 bilhões de investimento, conforme levantamento do Valor Econômico. Laboratórios justificam por isso os elevados custos dos tratamentos, mas especialistas criticam a falta de transparência dos processos.

Cada novo medicamento passa por um longo processo de pesquisa e desenvolvimento que leva de sete a 12 anos, considerando a etapa pré-clínica e as três fases de estudos clínicos, a um custo superior a US$ 1,8 bilhão (R$ 10,1 bilhões). De acordo com as normas internacionais, a etapa pré-clínica investiga em laboratório e testes com animais o potencial terapêutico e os efeitos adversos da droga, e na clínica, ela é analisada em humanos.

A padronização é feita pelo Conselho Internacional de Harmonização de Requisitos Técnicos para Registro de Medicamentos de Uso Humano (ICH, na sigla em inglês), que reúne autoridades reguladoras e representantes da indústria farmacêutica. No processo são definidos, entre outros detalhes, como o número de pessoas a serem testadas em cada fase do estudo clínico.

Seu objetivo principal é verificar se o produto alcança um perfil risco-benefício favorável, isto é, eficácia terapêutica com o mínimo de risco para o paciente. “As regulações de segurança e eficácia estão cada vez mais rigorosas”, afirmou ao Valor o presidente executivo do Sindicado da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), Nelson Mussolini.

Cada fase da pesquisa tem seus desafios. Na primeira, que leva, em média, um ano e meio, são envolvidos dezenas de indivíduos saudáveis, para se verificar a segurança do produto – como ele se distribui no organismo e os efeitos colaterais. Na fase 2 (dois anos e meio de trabalho), chamada de estudo terapêutico piloto, é avaliada a eficácia potencial da substância. São centenas de pessoas participantes e o objetivo é estudar a relação entre doses e respostas e definir o número de doses a serem testadas na fase seguinte.

Já a decisiva fase 3 – última antes da aprovação pela agência regulatória para comercialização e que leva quase três anos – envolve centenas ou milhares de pessoas para confirmar eficácia e segurança do produto e estabelecer o perfil risco-benefício. “É nessa fase que se definem todas as informações que vão para médicos e pacientes, elas são a base da bula”, esclareceu ao jornal o diretor de acesso e médico da Roche Farma Brasil, Lenio Alvarenga.

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Se o produto não se mostrar seguro ou eficaz, a pesquisa é descontinuada. O processo também pode ser suspenso a cada passo da pesquisa clínica, caso ocorra um efeito colateral grave. A ocorrência é investigada por uma comissão independente para verificar se há correlação com a droga administrada. Caso haja essa correlação, a pesquisa é encerrada.

Vale observar que a pesquisa continua mesmo depois que o medicamento é aprovado e chega ao mercado. O objetivo aqui – dessa que é chamada de fase 4 – é ampliar o conhecimento sobre eficácia e segurança em determinados subgrupos de pessoas, como pacientes idosos. Já houve caso de medicamentos retirados do mercado em função de novas informações de segurança obtidas nessa etapa, que tornaram o perfil risco-benefício desfavorável, esclareceu Alvarenga. “Sempre há risco, por isso os nossos esforços para capturar todos os efeitos adversos em nossos estudos”, disse o diretor da Roche ao jornal.

Custos são altos, mas não justificam preços absurdos

Os críticos dos elevados preços praticados pela indústria farmacêutica aos consumidores concordam que o desenvolvimento dos medicamentos exigem, de fato, recursos substanciais, porém, argumentam que falta transparência para números tão impressionantes como é o caso do medicamento Zolgensma, para crianças com atrofia medular espinhal, que preço estimado em R$ 12 milhões por paciente.

Essa é a opinião dos advogados especialistas em saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ana Carolina Navarrete e Matheus Falcão, que publicaram artigo na Veja Saúde destacando falta de transparência dos laboratórios para cobrar tão caro os tratamentos inovadores. “É compreensível até certo ponto gastar mais dinheiro com um produto mais eficaz. Mas essas conversas acabam por deixar de lado um ponto essencial: faz sentido um medicamento ter um preço tão alto?”, questionam.

O preço de um medicamento engloba, como qualquer mercadoria, custos de produção, logística, gastos com tributos. Na conta entra também outro componente: os custos de inovação, ou seja, custos despendidos em pesquisa e desenvolvimento para a criação de novos tratamentos, lembram os advogados do Idec.

“Contudo, a comprovação de que tais preços são justificados é difícil. Há pouca transparência no setor e o processo de inovação geralmente envolve recursos públicos, tanto financeiros como de infraestrutura de pesquisa. Basta pensar nos laboratórios universitários, que frequentemente custeiam as fases iniciais da pesquisa em que há maior risco envolvido”, salientam Ana Carolina Navarrete e Matheus Falcão.

Eles dizem há vários exemplos para ilustrar esse percurso como é o caso do sofosbuvir, tratamento para hepatite C, que teve seu preço contestado em várias partes do mundo e foi objeto de investigação pelo Senado dos Estados Unidos. A startup que desenvolveu o medicamento – e foi posteriormente adquirida pela atual fornecedora, a Gilead – contou com forte incentivo público. “Na fase final de pesquisas, quando o medicamento estava perto de ser registrado, o comprador arbitrou um preço elevadíssimo para sua aquisição”.

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De acordo com a organização Knowledge Ecology International, o próprio Zolgensma teve uma fase de teste clínico com 21 pacientes infantis em um hospital norte-americano e com fundos públicos para pesquisa.

Exemplos emblemáticos são as vacinas. “A da Universidade de Oxford contra a Covid-19 não só foi desenvolvida em uma universidade pública britânica como faz parte de um conjunto de esforços públicos de financiamento e execução – que iniciou com 65,5 milhões de libras (R$ 479,5 milhões) do governo britânico e que em breve devem incluir o Brasil e seus laboratórios públicos, com a assinatura do acordo entre o Governo Federal e a empresa responsável”, destacam Ana Carolina e Matheus Falcão.

Para os advogados do Idec, a solução passa pelo questionamento dos monopólios e o aprimoramento dos sistemas de regulação dos países. “É essencial aprimorar o sistema de patentes, evitando monopólios injustificados, assegurando segurança jurídica para concorrentes e usando mecanismos legais de suspensão de patentes, como licenciamento compulsório, quando preciso”, avaliam.

Em outra frente, “devemos estabelecer um melhor sistema de regulação e transparência de preços no setor farmacêutico. Esse controle de preços de medicamentos não é novidade no mundo, e cada vez mais países se valem de iniciativas dessa natureza. O Canadá, por exemplo, criou, em 2018, um órgão federal apenas para regular o preço de medicamentos com patente, com o objetivo de reduzir os preços”, assinalam Ana Carolina e Matheus Falcão.

Segundo eles, a regulação brasileira poderia ganhar muito monitorando os preços efetivamente praticados na ponta e incorporando exigências internacionais sobre transparência no setor farmacêutico. “Por que não ampliar o acesso às informações sobre custos de pesquisas clínicas, participação de investimento público, políticas de desconto e preços reais praticados em outros mercados? A transparência que hoje se exige na lei é restrita aos custos de produção e logística no momento do registro e pode ser dispensada pela Anvisa”, observam.

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