Uma farmácia de São Paulo (SP) vendia e estava aplicando uma suposta ‘vacina para o tratamento da Covid-19’. Denunciado, o estabelecimento foi alvo de uma operação policial e da Vigilância Sanitária na segunda-feira (12/7), segundo a BBC News Brasil.
Imagens gravadas pela BBC com uma câmera escondida mostraram que as doses eram aplicadas ao custo de R$ 100 dentro da Drogaria Diamante, localizada na Vila Maria Alta, zona norte da capital paulista. Nas cenas, vários pacientes bolivianos – incluindo uma grávida e uma idosa – são atendidos na farmácia por um homem de avental branco.
De acordo com o levantamento da emissora britânica, o principal público do estabelecimento são imigrantes da Bolívia – estima-se que entre 100 mil e 300 mil vivam em São Paulo, muitos em situação vulnerável por conta da condição migratória irregular.
Vale observar que os imigrantes podem tomar vacinas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), inclusive contra a Covid-19. A Drogaria Diamante, porém, não está listada entre os pontos oficiais de vacinação em São Paulo.
O farmacêutico e professor da pós-graduação em Farmácia Clínica e Prescrição Farmacêutica no ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, Rafael Poloni, assinala que a vacina contra o novo coronavírus, até o momento, só é disponibilizada – gratuitamente – no SUS.
“Sendo assim, qualquer disponibilização fora dessa condição não é segura e o farmacêutico e quaisquer outros profissionais de saúde devem denunciar às autoridades competentes”, assinala Poloni.
É importante ressaltar que não existem vacinas para tratar a Covid-19. Os imunizantes oficiais ajudam a prevenir a doença. Conforme foi apurado, alguns pacientes que receberam a falsa vacina foram hospitalizados em estado grave com sintomas de Covid-19, e uma mulher acabou morrendo vítima da doença.
De acordo com a BBC, a mulher que faleceu era uma boliviana de 35 anos que teria visitado a farmácia por vários dias seguidos para realizar o ‘tratamento’ para Covid-19, o que incluiu a aplicação da suposta ‘vacina’ e gastos de cerca de R$ 2 mil.
Em 18 de junho, essa pessoa deu entrada no Hospital Geral Vila Penteado, também na zona norte paulistana, com mais de 50% dos pulmões comprometidos, segundo o laudo de um exame obtido pela BBC News Brasil. A mulher foi intubada e morreu 12 dias depois, em 30 de junho, deixando três filhos pequenos. O atestado de óbito aponta como causa da morte “insuficiência respiratória aguda/infecção por coronavírus – Covid-19”.
Segundo o médico infectologista Alberto Chebabo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), são comuns os casos de pessoas que, submetidas a tratamentos sem eficácia contra a covid, levam tempo demais para procurar o hospital, o que pode complicar a situação do paciente.
“Quando buscam, a doença já está em fase muito avançada, em que temos pouco a oferecer para reverter o quadro”, afirmou Chebabo à BBC. Além de condenar a oferta de uma ‘vacina para tratar covid’, produto que esclarece não existir, Chebabo questiona a recomendação feita pelo atendente de que o paciente voltasse à farmácia para tomar um ‘soro com vitamina’ se os sintomas não cessassem.
“Não há nenhuma recomendação de qualquer tipo de vitamina para Covid-19, nem pós-covid, nem durante. Nada disso tem qualquer comprovação científica”, salientou. O infectologista disse ainda que os tratamentos disponíveis para a Covid-19, como os que envolvem antibióticos, antivirais e outros medicamentos, só podem ser feitos com o paciente internado em hospital ou com receitas médicas legítimas.
Por fim, Chebabo ressaltou que, mesmo que o atendente da drogaria fosse um farmacêutico, estaria extrapolando suas funções e cometendo exercício ilegal de medicina ao sugerir que faria uma aplicação de antibióticos. (O repórter da BBC visitou incógnito a farmácia e lhe foi oferecido, além da ‘vacina anticovid’, o coquetel de antibióticos e um ‘soro com vitamina’).
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Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), só médicos podem prescrever antibióticos. Mesmo que o atendente fosse médico, ele estaria proibido de trabalhar em farmácias ou ser dono de um estabelecimento do tipo, segundo as regras vigentes.
Ao saber do caso na semana passada, o Conselho Federal de Farmácia (CFF) acionou o Conselho Regional de Farmácia de São Paulo (CRF-SP), que enviou à drogaria na segunda-feira (12/7) uma equipe para uma vistoria em conjunto com a Vigilância Sanitária e a Polícia Militar. Os funcionários da farmácia foram levados ao Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania, da Polícia Civil, para prestar depoimento.
O presidente do CRF-SP, Marcos Machado, revelou à BBC que foram encontradas várias irregularidades na drogaria, entre as quais a presença de medicamentos de uso restrito a hospitais. Ele afirmou que os responsáveis deverão responder por crimes contra a saúde pública e terão de mostrar como conseguiram esses medicamentos. Além disso, podem ser banidos do conselho.
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