O mercado farmacêutico brasileiro alcançou vendas de R$ 215,6 bilhões em 2019. Os números integram o Estudo de Mercado Institucional da IQVIA, empresa global associada a soluções de auditoria, tecnologia e consultoria para o mercado de saúde, presente no Brasil desde 1974. O estudo mostrou crescimento do varejo abaixo dos canais institucionais, porém ainda acima da inflação.
Segundo o diretor associado de Relacionamento com Parceiros Estratégicos da IQVIA, Alexandre Santos, o mercado farmacêutico está em mudança devido à nova onda de lançamentos das indústrias farmacêuticas, que buscam soluções, principalmente, para oncologia, depressão, Alzheimer e doenças raras. Esses problemas, na maioria dos casos, são tratados em ambiente hospitalar, e não na farmácia tradicional.
“O mercado farmacêutico apresenta crescimento próximo a 10% em 2019, acima do verificado nos últimos anos, que ficou em torno de 4% a 8%. Se descontarmos a inflação, 2019 foi o melhor ano dos últimos cinco anos em termos de crescimento real”, avaliou Santos.
Público e privado
A adoção de novas terapias acelera o crescimento do canal institucional privado. “Essas ações, em geral, são novos medicamentos, que apresentam maior eficácia e menos efeitos colaterais, aumentando a sobrevida de pacientes ou proporcionando a cura, como no caso da Hepatite C”, conta Santos.
O maior volume de venda direta concentrou-se nos canais públicos, os quais mantêm alta relevância no canal Institucional. Porém, perdeu importância quando comparado ao cenário de quatro anos atrás. “O canal público tem uma deficiência crônica de financiamento, que se não for repensada deve estrangular cada vez mais o orçamento do Ministério da Saúde”, diz ele.
De acordo com o diretor, isso impacta na adoção de tecnologias mais modernas de tratamentos, sejam medicamentos ou não, pois em geral possuem custo mais elevado de entrada. Já o canal privado tem maior flexibilidade para adoção de novas terapias, mais eficientes. A tendência é que o abismo entre público e privado se torne cada vez maior no País, principalmente para tratamentos de doenças mais complexas, como o câncer.
Farmacêutico oncológico
De acordo com as tendências, o farmacêutico oncológico terá, cada vez mais, destaque no segmento. O cuidado do câncer tem recebido uma abordagem centrada no paciente, buscando a sobrevivência da pessoa doente e atentando a aspectos psicossociais, empoderamento e qualidade de vida. O medo da morte e o receio aos eventos adversos causados por terapias agressivas são reveses que precisam ser encarados e superados.
Assim, o farmacêutico em oncologia deve criar um protocolo de acompanhamento do paciente baseado em diretrizes oficiais. É importante descrever, no plano de tratamento inicial, a duração do tratamento, nomes das drogas que compõem o tratamento, doses, esquema proposto, cirurgia e radioterapia, se aplicáveis. Em seguida, acompanhar toxicidades, abordar interações medicamentosas e realizar reconciliação medicamentosa, no que tange a prerrogativa desse profissional.
Tendências para 2020
“A farmácia, cada vez mais, tem se posicionado como um ponto de contato da população para o tratamento de doenças e busca de saúde e bem-estar. O farmacêutico volta a ser protagonista no ambiente de saúde e as recentes aprovações de aplicação de vacinas, indicação dos medicamentos isentos de prescrição (MIPs) e acompanhamento do tratamento em busca de maior adesão a eles são movimentos importantes no fortalecimento da profissão”, diz o diretor.
Além disso, a farmácia tem expandido seu portfolio, principalmente em itens de higiene e beleza, linha infantil e conveniência, o que deve impulsionar o crescimento nas vendas nos próximos anos.
Segundo pesquisas, os MIPs representam cerca de 30% das unidades vendidas do total de medicamentos no Brasil, e uma pequena parcela do receituário médico abrange produtos dessa categoria. Os médicos sabem, exatamente, a utilidade terapêutica que os MIPs possuem — e não por acaso os prescrevem.
De acordo com a IQVIA, o canal de farmácia, mesmo crescendo mais de 100% em 2019, principalmente com vacinas meningocócicas, representa ainda 0,2% do mercado de vacinas no País.
Vários fatores contribuem para o crescimento acima da média, para o canal farmacêutico – essencialidade dos medicamentos na cesta de compras; demografia, uma vez que medicamentos para doenças crônicas cresceram 16% em 2016.
Até 2050, a quantidade de idosos triplicará no Brasil, chegando a 30% da população; além destes, patologias endêmicas como dengue, Zika, H1N1 e febre amarela, por exemplo, aquecerão a demanda de algumas categorias.
Mercado de infusão
Diferentes provedores estão entrando no mercado de infusão, ampliando seus serviços para uma população crescente. A tendência dos laboratórios de análises clínicas, por exemplo, é oferecer um serviço de maior valor agregado - com maior acompanhamento do paciente - e atender pessoas com doenças autoimunes e com câncer.
As maternidades estão dedicando parte de sua estrutura para pacientes com neoplasias – crianças e adultos ou mesmo fechando a ala pediátrica. Algumas clínicas de hemodiálise já estão aproveitando sua estrutura de infusão para pacientes com câncer. Já os planos de saúde representam 5% das compras de medicamentos oncológicos total e 9,9% do privado. Em oncologia geral, eles já representam 9% do total e 14% do canal privado. As farmácias de manipulação vêm se tornando importantes fornecedoras de hospitais sem estrutura ou que querem conveniência operacional.
Varejo
O varejo farmacêutico cresceu 7,1% no último ano, com aumento da importância da cesta de não medicamentos nas vendas totais. Quase 75% do mercado farmacêutico brasileiro está concentrado em oito Estados. Cada um apresenta um perfil de crescimento diferente: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Bahia, Santa Catarina e Goiás.
Apesar do avanço do associativismo, as Redes ainda têm o domínio de grande parte do mercado. Segundo Santos, ele cresce acima dos demais canais, principalmente nas regiões Sudeste e Norte. Com 16% das cerca de 79 mil farmácias do Brasil, as vendas médias das redes ainda são superiores as do canal do associativismo.
Ainda que o Brasil possua um número parecido ao dos países da Europa em termos de farmácias por habitantes, o consumo per capta é baixo em relação aos países desenvolvidos. Nos Estados, a média de habitantes por farmácia varia bastante - Norte e Nordeste têm uma média superior ao Brasil.
Envelhecimento populacional
O panorama traçado pela IQVIA mostra que em 30 anos o Brasil será um País grisalho. A expectativa para 2020 é de 29,8 milhões de habitantes acima de 60 anos. Para 2050 o número deve chegar aos 60 milhões.
A partir de 65 anos pacientes já manifestam, pelo menos, quatro doenças crônicas, podendo chegar a seis a partir dos 75 anos. Mais de 42% das pessoas sexagenárias tomam, em média, mais que cinco medicamentos por dia.
No Brasil, o comportamento em relação ao autocuidado já está evoluindo. “O paciente/consumidor está mais exigente, preparado para o autocuidado. Tem mais poder de compra, está mais interessado sobre como a indústria fornece seus produtos; está mais inclinado às soluções naturais, tem mais foco em prevenção, além de estar mais conectado”, explica o diretor responsável pelas negociações comerciais junto a empresas parcerias que fornecem informações de mercado, tanto empresas privadas, como distribuidores, redes de farmácia, planos de saúde, quanto entidades governamentais.