Homeopatia contra coronavírus: Ministério Público barra o uso em Santa Catarina

Homeopatia contra coronavírus: Ministério Público barra o uso em Santa Catarina

O município catarinense de Itajaí, com mais de 200 mil habitantes, decidiu usar a homeopatia para ajudar no combate à doença causada pelo coronavírus. O Ministério Público (MP) não gostou da história e barrou a distribuição.

Na cidade, o principal defensor da homeopatia é o prefeito Volnei Morastoni (MDB), (foto), médico pediatra e homeopata. Ele anunciou na semana passada um plano para evitar que Itajaí seja duramente afetada pela pandemia causada pelo novo coronavírus: no domingo, pela manhã, equipes de saúde passariam em todas as casas da cidade, aplicando cinco gotas de cânfora diluídas em água para quem tivesse interesse. Segundo Volnei, o custo da política seria de R$ 50 mil.

As reações no município foram as mais diversas: da crítica de médicos e pesquisadores que não acreditam na homeopatia à brincadeira entre os habitantes da cidade, com áudios circulando pelas redes sociais fazendo chacota da ação. “A homeopatia não tem plausibilidade científica e já foi testada diversas vezes. Há milhares de revisões sistemáticas de pesquisas. É um consenso científico de que a prática não funciona, afirmou ao jornal O Globo a bióloga Natália Pasternak, fundadora do Instituto Questão de Ciência, que defende a valorização da evidência científica na formulação de políticas públicas.

Algumas horas depois do anúncio, pressionada pelo Ministério Público de Santa Catarina, a prefeitura cancelou a distribuição. O prefeito ressaltou que a medida não era obrigatória e todos os cuidados para evitar a disseminação da Covid-19 seriam tomados. “Tem que deixar bem claro: não é vacina. Não estamos dizendo que a pessoa está curada ou que está imunizada. É apenas um coadjuvante que pode ajudar na imunidade. O isolamento social é o primeiro remédio que tem que ser aplicado”, disse.

Além disso, Morastoni afirma que a proposta estaria aliada a outras medidas adotadas na cidade, como a organização de barreiras sanitárias, desinfecção e investimento em unidades de saúde, destacando ainda que vai insistir na ideia. “Itajaí espera, muito em breve, poder proporcionar o uso desse medicamento homeopático para a população do município, com toda segurança e higiene necessárias. Também aguarda a elaboração de um protocolo estadual, que já está em andamento, para orientar o seu uso a todos que desejarem, podendo ser estendido a outras cidades do Estado”, afirmou em comunicado.

Prática é polêmica

De acordo com os defensores da homeopatia, ela é uma forma de tratamento menos invasiva e mais eficiente que a alopatia, a medicina tradicional. Já os detratores a classificam como mero curandeirismo. A polêmica em torno do uso da homeopatia opõe pesquisadores que afirmam que não existe comprovação científica e cerca de 2,9 mil médicos homeopatas que adotam a prática desde a década de 1980, quando foi aprovada como especialidade pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). A homeopatia está inserida inclusive no Sistema Único de Saúde (SUS), como parte da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC).

A homeopatia se baseia em dois conceitos principalmente: a cura pelo semelhante e o princípio da superdiluição. Assim, uma doença pode ser curada com uma substância que provoque no organismo os mesmos sintomas que a doença causa. Tal substância deve ser diluída diversas vezes em água, diminuindo cada vez mais sua concentração. Quanto menor a concentração da substância original, acreditam os homeopatas, maior sua força. “Semelhante cura semelhante. A medicina alopática (tradicional) usa o anti: antitérmico, anti-inflamatório, a medicina dos contrários. É o princípio de pegar um veneno de cobra, passa por um processo homeopático e tomar para curar a picada da cobra”, defende o prefeito de Itajaí.

Para a bióloga Natália Pasternak, entretanto, os remédios homeopáticos não são muito diferentes de placebos (medicamentos inertes, cujo benefício ocorre sobretudo por razões psicológicas), quase água. A melhora percebida em alguns casos, seria apenas fruto do ciclo natural da doença. No caso do uso coadjuvante no tratamento da Covid-19, a pesquisadora adverte que, ao tomarem o medicamento, algumas pessoas podem ter uma falsa sensação de segurança, estimulando o afrouxamento do isolamento social.

Não há ainda estudos científicos que comprovem a eficácia da cânfora contra a Covid-19.

Grupos de médicos homeopatas, porém, buscam realizar um protocolo com o governo estadual para incluir a homeopatia no combate ao coronavírus. Por conta disso, acham que foi prematura a atitude do prefeito. “Infelizmente, o doutor Volnei fez de forma precoce, sem aguardar ainda o protocolo para fazer da melhor forma e aconteceu isso. Estamos montando um protocolo para atuar na saúde pública, porque a homeopatia é individualizadora para achar o medicamento mais adequado para aquela situação”, afirmou a médica Marisa Ribeiro.

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