Servidora da Anvisa e professora do ICTQ, Adriane Oliveira discute o desenvolvimento de medicamentos biológicos e biossimilares

O desenvolvimento clínico de medicamentos biológicos e biossimilares é uma etapa essencial que visa avaliar aspectos fundamentais, como farmacocinética, farmacodinâmica, imunogenicidade e segurança desses produtos. Esses elementos são imprescindíveis na determinação da eficácia terapêutica e da segurança do medicamento, influenciando diretamente na sua aprovação regulatória e na confiança dos profissionais de saúde e dos pacientes.

Segundo a servidora da (Anvisa), especialista em Pesquisa Clínica e professora do ICTQ - Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, Adriane Alves de Oliveira, explica que a caracterização farmacocinética e farmacodinâmica é um dos aspectos avaliados no desenvolvimento não clínico e clínico de biofármacos, incluindo biossimilares, e exigida pela RDC 55/10, que dispõe sobre o registro de produtos biológicos.

“É por meio da caracterização farmacodinâmica que será possível, por exemplo, estabelecer uma curva dose/resposta, considerando o marcador farmacodinâmico avaliado e também avaliar o mecanismo de ação do produto biológico. Para biossimilares, a realização de estudos não clínicos de farmacodinâmica relevantes para as indicações terapêuticas pretendidas é outro aspecto a se considerar. Por meio da caracterização farmacocinética do produto biológico é possível avaliar os parâmetros relacionados à absorção, distribuição, metabolismo e excreção”, fala a professora.

Já para os biossimilares, destaca-se que os estudos farmacocinéticos e farmacodinâmicos não clínicos e clínicos devem ser realizados de forma comparativa com o produto biológico registrado comparador ou de referência. A professora ressalta que durante o desenvolvimento de um biossimilar é de suma importância uma robusta caracterização farmacocinética e farmacodinâmica comparativa, além da caracterização analítica.

Os dados de farmacocinética comparativa obtidos de um estudo fase 1 com avaliação de PK/PD vão subsidiar a decisão sobre a necessidade ou não de realização de um estudo fase 2 de definição de dose e a autorização para finalizar o estudo fase 1 e em seguida iniciar diretamente um estudo fase 3 de eficácia comparativa.

Adriane conta que a farmacodinâmica é normalmente estudada em estudos clínicos de fases iniciais, avaliando-se a interação do produto com seu receptor biológico e estabelecendo-se o mecanismo de ação para aquela indicação terapêutica investigada. Nesse tipo de estudo, normalmente são avaliadas curvas dose/resposta para entender o comportamento do fármaco no organismo e quais as doses necessárias para observação de atividade biológica.

Monitoramento da imunogenicidade

Por serem moléculas biologicamente ativas e muitas vezes com porções derivadas de outras espécies, por exemplo anticorpos monoclonais quiméricos e humanizados, os produtos biológicos podem desencadear resposta imunológica ao serem administrados em humanos. Como consequência, a imunogenicidade pode desencadear a produção de anticorpos contra o medicamento (antidrug antibodies (ADAs).

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De acordo com a professora, os ADAs podem ser anticorpos ligantes ou neutralizantes (nAbs). Os anticorpos neutralizantes podem afetar a segurança e/ou a eficácia do medicamento e devem ser monitorados durante os estudos clínicos e não clínicos para garantir a segurança dos participantes.

“Os principais desafios são a detecção de ADAs em estudos não clínicos (nos quais pode ser esperada produção de ADAs em espécies não humanas, o que dificulta a capacidade preditiva do mesmo tipo de efeito em humanos) e em estudos clínicos. Outro desafio é o desenvolvimento e utilização de métodos analíticos qualificados e validados para detectar ADAs e nAbs desde o início do desenvolvimento não clínico, passando pelo desenvolvimento clínico”, diz a professora.

Normalmente a imunogenicidade é monitorada por meio de coletas de sangue dos participantes de estudos clínicos para detecção, quantificação e avaliação de ADAs e nAbs. Caso sejam detectados nAbs, o patrocinador irá monitorar o impacto deles na segurança (avaliação de eventos adversos) dos participantes envolvidos e na eficácia do produto biológico, uma vez que a presença de anticorpos neutralizantes pode impactar a atividade biológica.

Avaliando a segurança de biológicos e biossimilares durante estudos clínicos

Segundo Adriane, o monitoramento de segurança biológicos e biossimilares durante os estudos clínicos deve observar o que é preconizado pela RDC 09/15. O patrocinador deve monitorar todos os eventos adversos, inclusive os não graves, durante o desenvolvimento do medicamento experimental.

“No caso de evento adverso grave ocorrido durante a condução do ensaio clínico em qualquer fase de desenvolvimento do medicamento, o patrocinador e o investigador devem adotar medidas imediatas de segurança para proteger os participantes contra qualquer risco iminente. O patrocinador deve enviar anualmente à Anvisa relatório de atualização de segurança do desenvolvimento do medicamento experimental, observando o modelo do Development Safety Update Report (DSUR), descrito no guia ICH E2F. Dessa forma, por exemplo, é possível verificar se houve novos eventos adversos detectados e se houve alteração da frequência de ocorrência dos eventos conhecidos”, esclarece a professora.


Para Adriane, existe a necessidade de profissionalização da pesquisa clínica no país, com a formação de profissionais capacitados para assuntos regulatórios, para gestão dos estudos em centros de pesquisa e nas etapas de desenvolvimento não clínico, bem como nos aspectos inerentes à produção de biofármacos atendendo os aspectos regulatórios e éticos aplicáveis.

“Em relação aos biossimilares, em 2023 a Anvisa abriu Consulta Pública para elaborar RDC que dispõe complementarmente sobre o registro de biossimilares por meio da via de comparabilidade. Com isso, a perspectiva é de aproximação da Agência com os desenvolvedores de biossimilares e, desde que pautada em justificativa técnico-científica sólida, flexibilização em alguns requisitos para o desenvolvimento não clínico e clínico de biossimilares”, afirma a professora.

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