A estatística está presente em diversas circunstâncias da construção de medicamentos, sendo uma ferramenta essencial na indústria farmacêutica e contribuindo na tomada de decisões, bem como para comprovar e trazer evidências científicas para os dados, para confirmar as observações.
“O mais essencial é que nós, como especialistas da indústria farmacêutica, não sejamos meros operadores de softwares, não podemos ser reféns de softwares. Precisamos entender o que está acontecendo e o que aquele software está utilizando de conceito para conseguirmos explicar [determinada situação]”, fala o farmacêutico industrial, mestre em Biologia Celular e Molecular, doutorando em P&D na Indústria Farmacêutica e professor do ICTQ - Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, Diogo Dibo do Nascimento.
Segundo o professor, a estatística ajuda ao ter dados, a coletar, organizar, resumir, analisar e representar por meio da aplicação de ferramentas específicas. É possível obter conclusões válidas e comprovar matematicamente o que está sendo observado, as conclusões. Ela é essencial na tomada de decisão, visto que sem uma avaliação matemática pode se chegar a conclusões inválidas, e quando se trata da produção de medicamentos e, consequentemente, da saúde da população, é preciso que as decisões sejam muito bem respaldadas.
No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), sendo um órgão extremamente respeitado e ganhando cada vez mais notoriedade internacional, exige da indústria farmacêutica uma série de confirmações em todas as etapas de registros e pós-registros de medicamentos, assim como no próprio dia a dia da rotina industrial. De acordo com o professor, essas provas devem ser apoiadas em decisões estatísticas, assim se tornam mais completas.
Nascimento explica que a qualidade das decisões depende da qualidade dos dados gerados, isto é, “não existe nenhum milagre que se possa fazer com a aplicação de ferramentas estatísticas. Precisamos ter um grande conhecimento do que está sendo feito, da tecnologia envolvida, dos fundamentos, dos processos que estão sendo avaliados. A estatística é uma ferramenta para auxiliar o pesquisador, mas não dispensa o conhecimento científico, a base teórica e o entendimento do processo em análise”, completa o professor.
É por isso que é muito mais fácil os farmacêuticos aprenderem a estatística suficiente para aplicar no dia a dia da indústria do que contar com profissionais estatísticos com conhecimento teórico dos processos da Farmácia - os estatísticos precisariam saber de química orgânica e medicinal e fisiologia, por exemplo.
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O professor esclarece que os farmacêuticos não chegarão ao nível de um estatístico e essa nem é uma pretensão. Contudo, “é muito mais fácil aprendermos um pouco de estatística e aplicá-la do que ensiná-los [os estatísticos] tudo que precisam saber para atuar na indústria farmacêutica”, atesta.
A estatística pode ser dividida em duas grandes correntes:
- Estatística dedutiva ou descritiva: consiste na recolha, apresentação, análise e interpretação de dados numéricos, por meio da criação de instrumentos adequados: quadros, gráficos e indicadores numéricos. Visa somente descrever e analisar um certo grupo (amostra) sem retirar conclusões ou inferências sobre a população da qual foi retirado esse grupo.
- Estatística indutiva ou inferencial: é o conjunto de técnicas da teoria das probabilidades, que permite construir proposições de carácter probabilístico acerca da população, partindo da observação de alguns dos seus elementos (amostra).
Desenvolvimento do produto
De acordo com Nascimento, atualmente, para se falar sobre desenvolvimento de medicamentos se usa a abordagem do Quality by Design (QbD), uma exigência das normas de boas práticas de fabricação, descritas com a RDC 301/19 e que continuam presentes na RDC 658/22.
“Basicamente, o processo de QbD começa pela definição do meu perfil alvo de qualidade do produto, pela definição dos atributos críticos de qualidade, pela definição dos parâmetros, dos processos e aqui temos uma aplicação forte de ferramentas estatísticas e de análise de risco. Essencial para trabalhar no QbD é o uso de ferramentas de DOE [planejamento experimental] e espaço de desenho. Elas permitem uma avaliação dos efeitos das diversas variáveis”, fala o professor.
Sobre o ciclo de vida do produto, há as seguintes etapas:
- Design: o processo de fabricação comercial é definido durante as etapas, com base no conhecimento adquirido por meio de atividades de desenvolvimento e de expansão;
- Qualificação: aqui o design do processo é avaliado para determinar se é capaz para a produção, com facilidade de comercialização e reproduzível.
- Verificação contínua: durante a produção de rotina é obtida uma garantia contínua de que o processo permanece em um estado de controle.
“A tendência no mercado farmacêutico, cada vez mais, é a aplicação de Analytical Quality by Design (AQbD), estratégia de desenvolvimento, de substituição da estratégia empírica de tentativa e erro, na própria abordagem, de variar um parâmetro por vez, para uma abordagem mais inteligente, nas ferramentas mais refinadas”, destaca o professor.
O AQbD explora a compreensão científica nas sequências de implementação do método e começa com a qualidade do produto que relaciona a avaliação de risco na escolha do método e depois entre o parâmetro do método e os resultados esperados dele e, finalmente, uma solução para abordagem altamente robusta e econômica.
Estudos de estabilidade
Nascimento ressalta também os estudos de estabilidade, fundamentais para garantir que o medicamento conserve suas propriedades após sair da fábrica até o final da sua data de validade, mantendo sua qualidade e segurança de uso. Segundo ele, atualmente a estabilidade de medicamentos é regulada pela RDC 318/19. Para medicamentos, o estudo de estabilidade deve ser realizado nas condições definidas para estudo acelerado de longa duração, com produto em sua embalagem primária.
Veja cinco itens que comprovam a relevância dos estudos de estabilidade:
- Degradação dos componentes do medicamento pode gerar compostos tóxicos que comprometem a segurança do produto;
- Degradação se não controlada pode resultar em redução de teor ou da potência de modo a comprometer a eficácia do produto;
- Alterações nas propriedades físico-químicas dos recipientes podem resultar em perfil de liberação do fármaco diferente do desejado, especialmente em medicamentos de liberação controlada, comprometendo a eficácia e a segurança do produto;
- Mudanças ao longo do tempo no estado sólido do fármaco (polimorfismo) podem alterar propriedades físico-químicas do produto, sua velocidade ou quantidade de dissolução, comprometendo sua eficácia e segurança; e
- Crescimento de microrganismos pode ocasionar infecções, principalmente em produtos de administração parenteral, comprometendo a segurança do paciente.
Quer saber mais sobre Estatística na Indústria Farmacêutica? Assista agora mesmo a webaula com o professor do ICTQ, Diogo Dibo do Nascimento.
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