De acordo com levantamento da Folha junto à Organização Mundial de Saúde (OMS), em todo o mundo, mais cem vacinas contra a Covid-19 estão em estudo. Dessas, 21 são testadas em seres humanos. Duas delas já se encontram na fase 3, a mais avançada. Ambas serão testadas também no Brasil.
Entre as vacinas que estão em estágio mais avançado está a que foi desenvolvida pela Universidade de Oxford e pela farmacêutica AstraZeneca. Em junho, foi anunciado que ocorreriam testes no Brasil, por meio de parceria com o Centro de Referência para Imunobiológicos Especiais (Crie) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e com o Instituto D’Or (Idor).
Devem participar da fase 3 (que investiga a eficácia da proteção em larga escala) no Brasil cerca de 2.000 profissionais de saúde na linha de frente de combate à Covid-19 (portanto, mais expostos à doença), sendo 1.000 em São Paulo, onde o teste tem auxílio financeiro da Fundação Lemann, e 1.000 no Rio de Janeiro. Com a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o chamamento de voluntários começou ainda em junho.
A vacina da Oxford usa um vírus para levar material genético do novo coronavírus (Sars-CoV-2) para dentro das células. Trata-se do adenovírus ChAdOx1, que causa gripe comum em chimpanzés, geneticamente modificado e enfraquecido. A ideia dos pesquisadores é expor o organismo humano à proteína “S” (de spike ou espícula, gancho molecular usado pelo Sars-CoV-2 para se ligar a células humanas), dessa forma, quando a pessoa entrar em contato com o vírus real, seu corpo já tem um sistema de defesa.
As fases 2 e 3 do estudo da Oxford pretendem recrutar mais de 10 mil pessoas apenas no Reino Unido. Na fase 2, os pesquisadores querem avaliar o efeito protetivo da imunização em diferentes faixas etárias. Já a fase 3 contará somente com pessoas acima de 18 anos. As duas fases terão randomização para recebimento de uma ou duas doses da ChAdOx1 nCoV-19 ou de uma outra vacina (grupo que será usado como controle para o estudo).
Outro teste na fase 3 que ocorre no Brasil é o do laboratório chinês Sinovac, em parceria de transferência de tecnologia com o Instituto Butantan, que pode vir a produzi-la em larga escala. A CoronaVac é feita a partir de vírus inativados. A ideia é modificar o Sars-CoV-2, de modo que ele não consiga infectar as pessoas. Diversas vacinas atuais são feitas dessa forma, como a contra sarampo e pólio.
Esse tipo de vacina, porém, necessita de grandes testes de segurança. No Brasil, segundo a Sinovac, a fase 3 do estudo pretende recrutar 9.000 profissionais de saúde em locais de atendimento de Covid-19, em 12 regiões, já a partir de julho.
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Entre as fases 1 (que mede a segurança) e 2 (para testar eficácia) de testes, os pesquisadores aplicaram a vacina em 743 pessoas com idades de 18 a 59 anos. Segundo a empresa, após 14 dias, foi observada presença de anticorpos em 90% das pessoas, após duas aplicações da imunização. A empresa afirma que outros braços de fase 2 de testes visam idosos e crianças e adolescentes, e que deve concluir essa fase ate o fim deste ano.
Outras vacinas que estão em fase de testes em humanos
Foi autorizada para uso a vacina desenvolvida pela empresa chinesa CanSino Biologics e pelo Instituto de Biotecnologia de Beijing. O imunizante recebeu, no fim de junho, aprovação para utilização limitada em militares chineses, pelo período de um ano.
A imunização da CanSino usa um adenovírus como vetor, em abordagem similar à que empresa havia empregado no desenvolvimento de uma vacina contra o Ebola. Basicamente, o adenovírus geneticamente modificado carrega o material genético que contém o código para produzir a proteína “S”.
Com isso, os pesquisadores esperam que se inicie a produção da proteína “S”, o que deverá desencadear uma reação de defesa do organismo que produza anticorpos. Os vírus conseguem “entregar” ativamente a informação genética da imunização, o que, em tese, pode ser mais eficaz do que o material genético “solto” (o que ocorre em vacinas de RNA, por exemplo). Por outro lado, há mais riscos de efeitos colaterais.
Vacinas fase 2
A vacina Moderna/NIAID foi o primeiro imunizante contra a Covid-19 testado em humanos. Ela foi desenvolvida em parceria entre o governo dos Estados Unidos, o Instituto de Pesquisa em Saúde Kaiser Permanente (EUA) e a empresa de biotecnologia Moderna. Usa trechos de RNA (molécula “prima” do DNA) do vírus que têm a receita para a produção da proteína “S”, que prepara o organismo para se proteger do vírus real.
De acordo com pesquisadores, a técnica é relativamente segura, mas resta demonstrar sua eficácia – até hoje, nenhuma vacina de RNA foi liberada para uso comercial. Os testes começaram em 16 de março, na fase 1. A fase 2 pode começar em poucos meses, se tudo der certo. Segundo a empresa, o recrutamento da fase 2 do estudo foi finalizado em 8 de julho.
A empresa de biotecnologia norte-americana Inovio Pharmaceuticals começou sua fase 1 em 6 de abril. O método tem semelhanças com a vacina de RNA, com a diferença de que o genoma do vírus, na parte correspondente ao código da proteína “S”, foi adaptado para uma molécula de DNA.
Para injetar a vacina na pele ou nos músculos dos voluntários, os pesquisadores da empresa usam uma tecnologia que emite um breve pulso elétrico, facilitando a entrada do material genético nas células por meio da abertura de pequenos poros. Em junho, o laboratório anunciou a expansão dos participantes da fase 1 (chegou a 120 pessoas) e espera que as fases 2 e 3 tenham início em julho ou agosto – há pendências regulatórias e de financiamento.
Em sua pesquisa, a Cadila Healthcare Limited usa trechos de DNA para produção da proteína “S” e posterior reconhecimento, pelo corpo, de invasores. O início das fases 1 e 2, com 1.048 pessoas randomizadas e com grupo controle, aguardam aprovação, e a empresa espera resultado em 3 meses.
Os estudos conduzidos pela Sinopharm, Wuhan Institute of Biological Products e Beijing Institute of Biological Products, na China, avaliam vacinas produzidas que se utilizam de vírus inativados em busca da imunização. As fases 1 e 2 são randomizadas, duplo-cegas e com grupo controle.
A vacina da Novavax (NVX-CoV2373) teve a fase 1, randomizada e com grupo controle, iniciada em maio e deve ter os primeiros resultados ainda em julho. A fase 2 deve ocorrer em vários países, com 130 pessoas entre 18 e 59 anos. O imunizante é baseado na aplicação direta de proteínas (ou fragmentos) do novo coronavírus. Testada com sucesso para Sars em macacos, esse tipo de vacina costuma precisar de adjuvantes, moléculas que estimulam o sistema imune, e múltiplas doses.
Pfizer, BioNTech e Fosun Pharma anunciaram recentemente resultados positivos das fases 1 e 2 de sua pesquisa com vacina (BNT162b1) baseada em trechos de RNA. A BioNTech afirmou que os testes de duas dosagens de seu medicamento em 24 voluntários saudáveis mostrou que, após 28 dias, eles desenvolveram níveis mais altos de anticorpos para a Covid-19 do que os normalmente observados em pessoas infectadas.
A mais alta entre as duas doses – ambas administradas por meio de duas injeções com intervalo de três semanas – foi seguida por uma febre curta em três de quatro participantes após a segunda aplicação. Uma terceira dosagem, testada em uma concentração mais alta em um grupo separado, não foi repetida após a primeira aplicação devido à dor da injeção.
Resta saber se os anticorpos encontrados geram resposta imune para prevenir a doença. A próxima fase deve ser iniciada em julho, com expectativa de participação de cerca de 30 mil pessoas – por ora, apenas nos Estados Unidos e na Alemanha.
Vacinas fase 1
- Genexine Consortium (GX-19) – vacina à base de DNA. A fase 1, na Coreia do Sul, deve durar 3 meses e recrutar 40 pessoas. Na 2, 150 pessoas de diversos países devem participar.
- Medicago Inc./ Université Laval – vacina baseada em VLPs (partículas semelhantes a vírus), às quais seriam combinadas antígenos, moléculas do coronavírus que possam ser reconhecidas pelo sistema imune. Espera-se que a combinação induza uma resposta imune robusta, mais próxima de uma infecção real.
- Osaka University/ AnGes/Takara Bio – vacina baseada em DNA mais uso de adjuvante.
- Institute of Medical Biology/Chinese Academy of Medical Sciences – vacina feita a partir de vírus inativados.
- Gamaleya Research Institute – vacina que usa vírus como vetor.
- Clover Biopharmaceuticals Inc./GSK/Dynavax – vacina baseada na aplicação direta de proteínas ou fragmentos delas.
- Anhui Zhifei Longcom Biopharmaceutical/Institute of Microbiology/Chinese Academy of Sciences – vacina baseada na aplicação direta de proteínas ou fragmentos delas.
- Vaxine Pty Ltd/Medytox – vacina baseada na aplicação direta de proteínas ou fragmentos delas.
- Imperial College London – vacina baseada em fragmentos de RNA.
- Curevac – vacina baseada em fragmentos de RNA.
- People's Liberation Army (PLA) Academy of Military Sciences/Walvax Biotech – vacina baseada em fragmentos de RNA.
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