Psicodélicos no combate ao Alzheimer e Parkinson ganham destaque na ciência brasileira

Psicodélicos no combate ao Alzheimer e Parkinson ganham destaque na ciência brasileira

Desde a virada do milênio, multiplicam-se os estudos científicos que demonstram efeitos positivos de psicodélicos em tratamentos de transtornos mentais. De lá para cá, vemos em países como Austrália e Estados Unidos, algumas dessas substâncias sendo incorporadas à prática médica. No Brasil, apesar de a maioria dos psicodélicos ainda ser proibida, a Anvisa tem demonstrado abertura ao diálogo com a comunidade científica. Mas, enquanto as aprovações clínicas não vêm, o país avança nas pesquisas, com diversos institutos fazendo descobertas importantes, que vão além dos tratamentos de transtornos mentais.

O cientista Stevens Rehen, professor licenciado da Universidade Federal do Rio de Janeiro, lidera no Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino um grupo que contribui de forma relevante e sistemática para o avanço da ciência psicodélica. Para Rehen, que também conduz estudos nos institutos Usona e Promega Corporation, nos Estados Unidos, a fronteira da pesquisa no campo está na compreensão dos efeitos de psicodélicos em mecanismos relacionados ao envelhecimento e a doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e Parkinson.

Em entrevista ao GLOBO, o cientista fala sobre as contribuições do seu grupo para essas novas frentes de pesquisa, conta como a inteligência artificial vem ajudando a desenvolver uma medicina psicodélica de precisão, e comemora os avanços regulatórios no Brasil.

Passados alguns anos de hype da ciência psicodélica, o que você destacaria como seus principais êxitos?

O principal é a revalidação clínica e científica, com novas tecnologias e metodologias, do potencial terapêutico dos psicodélicos. Estudos clínicos mostram que compostos como psilocibina, DMT, LSD e MDMA produzem respostas rápidas, duradouras e clinicamente relevantes em transtornos como depressão resistente, ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático e dependência química. A curto e médio prazos, há expectativa concreta de aprovação clínica da psilocibina nos Estados Unidos, especialmente para depressão resistente. Na Austrália, desde 2023, psiquiatras autorizados podem prescrever psilocibina em contexto clínico supervisionado. Esses avanços sinalizam que os psicodélicos estão se aproximando cada vez mais da prática médica convencional com rigor, segurança e base científica. Paralelamente, cresce a profissionalização das terapias assistidas por psicodélicos, com programas certificados de formação e integração psicoterapêutica. Estamos diante de uma possível mudança de paradigma no tratamento de transtornos mentais.

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Além de transtornos mentais, há pesquisas promissoras aplicáveis a outras áreas da medicina?

Duas outras linhas vêm ganhando destaque. Uma extremamente recente investiga os efeitos geroprotetores dos psicodélicos. Este mês, pesquisadores dos Estados Unidos demonstraram que a psilocibina aumenta a longevidade de camundongos idosos e prolonga a vida útil de células humanas. Também este mês, nosso grupo no Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino demonstrou que o LSD é capaz de prolongar em até 25% a vida de Caenorhabditis elegans — um pequeno animal muito usado em pesquisas sobre envelhecimento. Outra é a aplicação de psicodélicos em doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e Parkinson. Diversos estudos, inclusive os nossos, mostram que psicodélicos podem ajudar a modular redes neuronais, reduzir inflamação e reprogramar circuitos celulares associados à degeneração. Fomos pioneiros ao observar esses efeitos tanto em C. elegans quanto em organoides cerebrais humanos. Esses estudos sugerem que, além de suas aplicações na saúde mental, os psicodélicos também podem atuar em mecanismos fundamentais relacionados ao envelhecimento e a doenças neurodegenerativas, abrindo novas possibilidades terapêuticas para promover saúde ao longo da vida.

O seu grupo do IDOR se destaca pelo uso de organoides como modelo de pesquisa. Quais as vantagens desse modelo em estudos com psicodélicos medicinais?

O uso de organoides cerebrais humanos derivados de células-tronco tem sido transformador na biologia. Essas entidades celulares tridimensionais mimetizam aspectos-chave do desenvolvimento e da organização celular do cérebro humano, com presença de neurônios e outras células do sistema nervoso. Eles nos permitem testar os efeitos de psicodélicos diretamente em tecido humano vivo. Integramos essa abordagem com tecnologias de imagem de alta resolução, proteômica (estudo das proteínas das células), transcriptômica (estudo de RNA mensageiro) e, mais recentemente, inteligência artificial. Esse modelo tem sido especialmente útil para testar compostos em organoides de pacientes com doenças específicas. Isso abre caminho para triagens mais refinadas e abordagens personalizadas, integrando psicodélicos, genética e bioengenharia.

A inteligência artificial pode se tornar uma aliada ?

Sim, e já estamos utilizando de forma intensiva. A IA permite analisar volumes massivos de dados morfológicos, metabólicos e ômicos (ligados à ciência do DNA) gerados por experimentos com organoides. Por exemplo, em parceria com a empresa Promega, treinamos algoritmos para reconhecer padrões metabólicos, alterações mitocondriais e biomarcadores após o uso de psicodélicos. E começamos a usar modelos de machine learning para prever a resposta de organoides derivados de diferentes indivíduos. Isso é essencial para avançar em direção à medicina de precisão psicodélica — ou seja, prever quais compostos são mais eficazes para quais pacientes, com base em características celulares e moleculares.

Quais os principais desafios para a pesquisa com psicodélicos hoje?

Muitos psicodélicos seguem classificados como substâncias controladas no Brasil, o que implica que são legalmente considerados de alto potencial de abuso e sem uso terapêutico aceito; uma definição que contrasta com as evidências científicas. Isso dificulta o financiamento de pesquisas e impõe barreiras logísticas. Além disso, há uma resistência cultural significativa, alimentada por décadas de estigmatização e desinformação. Ainda assim, existem avanços importantes. A Anvisa tem demonstrado abertura ao diálogo com a comunidade científica e o uso ritual da ayahuasca é reconhecido e protegido legalmente no país. Se o Brasil conseguir construir pontes sólidas entre ciência, regulação e saberes tradicionais, há potencial para se tornar uma referência global em inovação psicodélica, com ética, diversidade e sustentabilidade.

Carla Almeida é jornalista especializada em ciência e pesquisadora do Museu da Vida Fiocruz.

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