Nada será como antes! Isso é fato...é a lei do universo. Tudo tende a evoluir e se transformar. Todos os sistemas e relações vêm passando por revoluções que mudam o rumo da história e afetam as pessoas. A humanidade vem presenciando algumas revoluções históricas, a industrial, a tecnológica e a digital.
A mais recente é conhecida como a quarta revolução industrial, marcada pela convergência de tecnologias digitais, físicas e biológicas. É a revolução 4.0, que acontece após a primeira, que mudou o ritmo da produção manual para a mecanizada; a segunda, que foi baseada na eletricidade e na fabricação em massa; e a terceira, que culminou com a chegada da eletrônica e da tecnologia da informação.
A palavra revolução tem origem no latim, revolutio, que significa revolver, movimentar, dar voltas. É uma transformação. Pode ter conotação política, econômica, cultural e social, estabelecendo sempre uma nova ordem, um novo sistema. No sentido figurado, uma revolução pode ser o sinal de uma transformação profunda...e aqui entra o conceito aplicado ao segmento farmacêutico, que tem experimentado mutações em sua essência ao longo das últimas décadas.
Algumas dessas modificações são memoráveis no processo revolucionário da farmácia brasileira e, dentre elas, seis merecem ser destacadas por delinearem o futuro da profissão no Brasil. Acompanhe, a seguir, o aprofundamento de cada uma delas!
1 - A JUDICIALIZAÇÃO DA PROFISSÃO FARMACÊUTICA
A judicialização tem sido o caminho utilizado por algumas entidades médicas nos embates por âmbito de atuação com diversas profissões da saúde com as quais a medicina compartilha o cuidado com o paciente, como a farmácia desde o advento da prescrição farmacêutica. Assim, ganha grande relevância um novo departamento jurídico nas entidades, empresas do varejo e clínicas farmacêuticas de atenção básica em saúde.
Segundo o presidente do Conselho Federal de Farmácia (CFF), Walter da Silva Jorge João, os embates jurídicos, até o final da década de 1990, se limitavam a uma ação ou outra sobre âmbito, seja entre médicos, farmacêuticos, enfermeiros, químicos, biólogos ou biomédicos. A partir de então, mais em função dos médicos, esses embates se intensificaram. As entidades médicas são as autoras da maioria das ações. Isso exigiu uma nova habilidade da classe farmacêutica - a de defender judicialmente o campo de atuação da profissão.
Jorge João afirma que as entidades médicas ignoram, por exemplo, que consultas, diagnósticos nosológicos e prescrições na enfermagem são a base de sustentação de inúmeros programas fundamentais à saúde pública, como os de prevenção e controle da malária, tuberculose, hanseníase e doenças sexualmente transmissíveis, entre outros. Em relação às resoluções do CFF que dispõem sobre as atribuições clínicas e a prescrição farmacêutica (números 585 e 586, ambas de 2013), ele diz: “Desde que essas entidades médicas perderam os primeiros processos em instância federal, a estratégia tem sido a judicialização nos Estados. Às vezes é movido mais de um processo por Estado. O importante a destacar é que em absolutamente todos os processos a tendência tem sido a Justiça se manifestar favorável à farmácia. As duas normativas estão em pleno vigor”.
O presidente do CFF destaca, ainda, que ambas as resoluções se restringiram a regulamentar práticas que já existiam na profissão, no País. Isso está amplamente documentado na literatura internacional, na literatura nacional, bem como está demonstrado nos autos dos processos que as entidades médicas impetraram contra o CFF. “E é esse fato que tem consubstanciado as decisões favoráveis ao Conselho nas ações movidas pelas entidades médicas”, cita ele.
Já para o superintendente Jurídico do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), Osvaldo Simonelli, tanto a medicina quanto a farmácia possuem a devida importância social. Contudo, antes mesmo de uma discussão jurídica, há a questão da formação e da definição acerca das competências de cada profissional, que não deveria passar pelo processo legislativo, mas pela graduação de cada área de atuação. “Entendo que não é por meio do processo legislativo que a situação deve se resolver, mas da correta atuação em face da própria formação profissional”.
Para Simonelli, a atuação jurídica de qualquer classe profissional de saúde deve ser altamente especializada. A legislação que envolve a área da saúde é muito vasta e os problemas que surgem no cotidiano são absolutamente imprevisíveis. “Tanto médicos como farmacêuticos têm importância nessa atuação, na medida em que são os grandes propulsores no que se refere à incorporação de novas tecnologias no âmbito da saúde pública. O advogado que atua na área do Direito Médico ou do Direito à Saúde deve estar preparado para estas demandas, tendo um papel conciliatório de grande relevância”, pondera ele.
De acordo com o presidente da Comissão de Direito Médico da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), o médico Silvio Eduardo Valente, “o juiz fica na berlinda, já que não é médico e nem farmacêutico. Ele precisaria de uma assessoria consultiva nestas especialidades para poder julgar. Sem isso, ele fica consternado com a situação e dá provimento a 88% de liminares desse tipo. No Brasil, a judicialização acontece porque a saúde funciona mal”, critica Valente.
Direito na graduação
Há quem diga que, por conta dessas e outras questões judiciais, a disciplina de direito em saúde ou direito sanitário já deveria ser obrigatória na grade curricular de formação farmacêutica. No entanto, Jorge João discorda. Para ele, o Direito não é disciplina que participe da formação específica da Farmácia. Por outro lado, ele lembra que, como ocorre com os estudantes de qualquer outro curso da área da saúde, os graduandos de Farmácia têm, em sua matriz curricular, matérias que dizem respeito à ética e à deontologia (que abrange o conjunto de legislações que se aplica à profissão). “Assim, de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação em Farmácia, os profissionais formados devem chegar ao mercado com conhecimento suficiente da legislação relacionada ao exercício da profissão em suas mais diferentes áreas, devendo ser capazes de interpretar e aplicar essa legislação”, preconiza ele.
Simonelli defende que as demandas da área da saúde, atualmente, ultrapassam o que se denominava de direito sanitário, fazendo com que a especialização seja o caminho, tanto na relação de direito público, com o SUS; como de direito privado, com as operadoras de planos de saúde: “O caminho, a meu ver, reside na criação de Varas Judiciais Especializadas em Saúde”. E lá a participação ativa de médicos e farmacêuticos seria fundamental.
Para ele, o advogado que atua nessa área deve ter um perfil extremamente conciliador, deixando as demandas judiciais para as questões maiores – coletivas, principalmente – e sob a responsabilidade do Ministério Público. As relações individuais nesta área devem ser tratadas com bastante cuidado, considerando que de um lado há sempre um paciente em situação de vulnerabilidade e de outro um profissional de saúde dedicado, mas que, eventualmente e por uma fatalidade, pode ter cometido algum equívoco em sua função. “A atuação dos profissionais de saúde não é simples, e os advogados devem ter essa consciência. Os serviços estão sempre atendendo acima da sua capacidade, falta medicação necessária, falta estrutura física e humana, há falhas absolutamente estruturais, que não guardam nenhuma relação com a prática da atividade em saúde, mas que, infelizmente, recaem sobre os profissionais que, na grande maioria das oportunidades, são vítimas também desta situação”, lamenta o superintendente do Cremesp.
Vale lembrar que a principal lei relativa à farmácia que foi aprovada nos últimos três anos foi a 13.021/14, que mudou o conceito de farmácia no Brasil e resgatou a autoridade técnica do farmacêutico. Outro projeto de lei de interesse da profissão, que está em tramitação no Congresso Nacional, é o que obriga a presença permanente do farmacêutico nas farmácias da rede pública.
Cabe frisar também que qualquer profissional que presta algum serviço, esteja ele na área da saúde ou não, tem responsabilidade sobre o mesmo perante a sociedade. No caso dos farmacêuticos, as responsabilidades são as mesmas de antes, com a diferença que agora passou a ser obrigatório que os atos sejam documentados. Essa é uma exigência das resoluções.
Mediante esse cenário de mudança no campo jurídico desde o advento da prescrição farmacêutica, algumas perguntas pairam no ar: Os farmacêuticos precisam conhecer mais sobre direito em saúde em sua formação desde a graduação ou não? Assim como a Medicina já possui, seria necessária a criação de uma Comissão de Direito Farmacêutico na Ordem dos Advogados para estudo, reconhecimento e defesa do campo de atuação farmacêutica?
2 - A MUDANÇA NO STATUS DO FARMACÊUTICO
No Brasil, já existe um cenário de oportunidades reais de mudança do olhar da população e do meio empresarial sobre a importância do farmacêutico, principalmente depois das resoluções e especializações, que estão habilitando esses profissionais em serviços que culminam na prescrição de alguns medicamentos. Entretanto, competências para o novo perfil precisam ser desenvolvidas, já que esses profissionais querem ser valorizados e ter maiores salários, com mais reconhecimento na comunidade.
“Não existe resultado sem empenho, comprometimento e disciplina na reprogramação de hábitos. Sucesso é um evento que só acontece devido à multiplicação das probabilidades de acontecer”, fala a farmacêutica, especialista em reprogramação de hábitos e gestão, Luciene Scherer.
O fato é que os profissionais querem ser valorizados, mas não caminham para essa direção. Luciene diz que a questão recorrente da baixa autoestima profissional faz com que eles emitam frases como: “Tenho que obedecer”... “Eu não decido”... “Eu não faço isso”... “Farmacêutico não pode ganhar isso”. Essas crenças limitadoras impedem o avanço em direção ao desenvolvimento e valorização profissional.
O presidente do Conselho Federal de Farmácia (CFF), Walter da Silva Jorge João, destaca que a almejada ascensão social, profissional e salarial do farmacêutico depende de uma série de fatores – legislação, conjuntura de mercado e da economia, entre outras. Também está vinculada ao desempenho de diversos atores, entre os quais o próprio profissional.
“Desde 2012, o CFF tem buscado a regulamentação da profissão como ferramenta para a valorização profissional do farmacêutico. Por meio das normativas aprovadas, o Conselho tem procurado respaldar a atuação desses profissionais, reafirmando a sua autoridade técnica, o que contribui para que eles sejam cada vez mais necessários, respeitados e valorizados”, diz Jorge João. Ele continua, dizendo que o CFF está permanentemente presente no Congresso Nacional, defendendo os projetos de lei de interesse da farmácia, pois a valorização dos profissionais e da profissão, muitas vezes, depende da aprovação de leis. “Se considerarmos a maioria dos profissionais – que é formada por aqueles que atuam em farmácias comunitárias – o farmacêutico hoje está muito mais valorizado do que foi em um passado recente. Claro que almejamos muito mais”, enfatiza.
Há outro aspecto a ser considerado: aquela visão de um farmacêutico despreparado, que muitos proprietários leigos difundiam, também está desaparecendo. De acordo com o ex-presidente da Anvisa, ex-presidente do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo (CRF-SP) e professor do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, Dirceu Raposo de Mello, essa visão era propagada muito em virtude de uma síndrome de vira-lata que muitos donos de farmácia práticos tinham. “Como não atingiam a graduação em farmácia menosprezavam o profissional, alegando falta de preparo e formação. Ora, em que é que esses cidadãos estavam mais preparados? Somente em vender. Hoje, a população exige, além de preço, qualidade no atendimento e preparo técnico, e isso os farmacêuticos é que podem dar”, lembra ele.
Jorge João elenca algumas outras conquistas do farmacêutico, como a aprovação da Lei 13.021/14, após 20 anos de tramitação do Projeto de Lei Marluce Pinto (que propunha banir os farmacêuticos das farmácias) é uma das maiores conquistas para a valorização profissional do farmacêutico. A lei reafirmou a obrigatoriedade do profissional nas farmácias durante todo o período de funcionamento dos estabelecimentos, e dirimiu qualquer dúvida sobre a responsabilidade técnica. Somente o farmacêutico pode assumi-la. Além disso, resgatou a autoridade técnica do farmacêutico comunitário e imprimiu o conceito de unidade de prestação de assistência à saúde para as farmácias, que antes eram meros estabelecimentos comerciais. Todas as condições foram criadas para que a importância do farmacêutico seja obrigatoriamente reconhecida.
Ele cita exemplos, como as lutas no Congresso Nacional pela aprovação de projetos de lei de interesse da Farmácia, a atuação do Conselho pela revisão de normas sanitárias, como a RDC nº 44/2009, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e as intervenções pela revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Farmácia (DCNs).
Ele já conquistou e não percebeu
O farmacêutico, Ismael Rosa, frisa que o farmacêutico não percebe suas conquistas e mantém uma espécie de síndrome de coitadinho. “Da mesma forma que não enxergam a revolução que está ocorrendo no âmbito legislativo e político, também não vislumbram que a única forma de ser reconhecido e valorizado é por meio do conhecimento”. Entidades de ensino, como o ICTQ, que é exclusivo para o mercado farmacêutico, são a porta de entrada para transformar os profissionais que querem evoluir e sair da mediocridade”, dispara. Não há justificativa plausível para manter-se no grupo dos coitadinhos. É preciso acompanhar de perto e participar efetivamente das entidades e da política, e agir em união, pois só assim eles conseguirão que as reivindicações saiam do papel e das redes sociais, e transformem-se em realidade.
Para o farmacêutico, uma das principais reivindicações da categoria quanto à questão monetária se dá pelos baixos salários em detrimento da complexa responsabilidade da profissão. No Brasil, cada Estado possui diferentes pisos salariais, que podem distinguir-se por área de atuação, tais como: drogarias, distribuidoras, transportadoras, indústrias, análises clínicas e hospitais. Variam entre R$ 2.198,46 (PB) a R$ 5.409,31 (DF), para uma carga horária de 40h e 44h semanais, respectivamente.
“Sobre o status, os farmacêuticos vêm lutando contra um estigma antigo - relatado desde o Império no século 19 - que queimou a classe, e que ainda contribui negativamente para que este status continue em desconfiança: os farmacêuticos de fachada, ou denominados assinacêuticos. Todavia, apesar de toda a luta, regulamentação e fiscalização dos Conselhos, essa prática ainda perdura entre os poucos mal profissionais que insistem em atrasar a evolução e valorização da categoria”, critica Rosa.
Já Luciene levanta outra questão: o processo de crenças de que o farmacêutico é um profissional de bastidores dificulta seu reconhecimento e valorização. Muitas entidades têm reforçado o conhecimento técnico, mas não trabalham as crenças da profissão: “Tenho dito repetidamente que não basta para o reconhecimento e valorização profissional, desenvolver conhecimento técnico. É necessário desenvolver a liderança, a proatividade, o empreendedorismo, o foco em resultados e a autoestima do farmacêutico”.
Já Raposo ressalta que o próprio SNGPC pode ser considerado uma valorização, uma vez que deu ao farmacêutico o verdadeiro controle sobre a dispensação de medicamentos controlados pelo simples motivo de que ele possui uma senha que é sua e, portanto, se ele não abrir o sistema as operações não podem ser feitas. Isso depende de sua postura a valorização.
Apenas a título de curiosidade, quando Raposo presidiu a Agência, ele mesmo instituiu a SNGPC e foi acusado de ter transformado os farmacêuticos em digitadores do sistema, ao que ele se defende: “Toda vez que se introduz algo novo e revolucionário, podemos ter reações contrárias. O SNGPC foi um dos maiores avanços no controle de medicamentos no País, já que conseguiu controlar também a prescrição de medicamentos antibióticos com a RDC 44/2010, que originou a RDC 20/2011”. Ele lembra que antes do SNGPC, os farmacêuticos tinham que assinar e conferir os mapas que eram encaminhados às Vigilâncias, e delas para a Anvisa para então serem analisados. “No Brasil geravam-se aproximadamente 380 mil mapas por ano, o que significa que o controle era uma ficção”.
A grande questão dessa revolução é que o farmacêutico é valorizado, mas ainda não percebeu esse fato. Rosa cita alguns aspectos que comprovam isso, como a estruturação político-sanitária do Brasil, que implantou o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e a Anvisa, além da inclusão e consolidação da Assistência Farmacêutica no SUS (Qualifar-SUS). Ele diz: “Ressalto também a ascensão dos genéricos, com a Lei nº 9.787/99, e a constante regulamentação da indústria farmacêutica, ampliando a produção, controle e oferta de medicamentos no País, o que aumentou exponencialmente a demanda de mão de obra farmacêutica qualificada”.
Outro ponto chave, demonstrado em uma das pesquisas do ICTQ, são os índices de confiança e aprovação que os brasileiros têm no farmacêutico principalmente sobre o aspecto da prescrição. A confiança subiu de 42% em 2013 para 61% em 2016, em média.
Com a habilitação para o consultório clínico farmacêutico, permissão para prescrever de acordo com sua formação e com todos esses índices e regulamentações...será que os farmacêuticos ainda têm motivos para reclamar ou justificativa para não perceber que a valorização tão almejada já está consolidada? Claro que não! “O problema é que muitos colegas desejam ganhar financeiramente muito mais, trabalhando muito menos, empreendendo quase nada e sem ampliar conhecimentos. Quando deparam com o simples piso salarial no final do mês, referem uma pseudo desvalorização farmacêutica à uma questão financeira da qual eles mesmos são responsáveis diretos”, finaliza Rosa.
3 - A INDÚSTRIA REVOLUCIONA SEU RELACIONAMENTO COM O VAREJO
Cada indústria tem seu posicionamento no momento de estabelecer suas estratégias de marketing. Claro que não se pode generalizar, mas, como exemplo, vale citar as que destinam suas ações exclusivamente aos médicos, fornecendo informações sobre seu portfólio com o objetivo de conseguir prescrição para seus produtos. Mas com o advento da prescrição farmacêutica há também aquelas indústrias cujo foco está nas grandes redes, farmácias associadas e até mesmo nas farmácias independentes, oferecendo uma atenção diferente aos farmacêuticos que podem prescrever seus medicamentos ou mesmo recomendar uma marca em detrimento de outra e um genérico em detrimento de um similar ou referência.
Em termos de estratégias comerciais, o diretor de Marketing e presidente do Conselho de Administração do Laboratório Teuto, Ítalo Melo, diz que seu principal objetivo agora é levar informação e conhecimento aos profissionais de farmácia: “Desenvolvemos o Visite Bem - um projeto educativo que recebe clientes (donos de farmácia, farmacêuticos e distribuidores) e estudantes de farmácia, apresentando o alto padrão de qualidade da indústria, instalada no maior complexo farmacêutico da América Latina, e os nossos processos de produção”. Ele afirma que trabalha na cadeia produtiva desde o início, ainda na formação do profissional, integrando indústria, distribuição e varejo.
De acordo com o farmacêutico e consultor para a indústria farmacêutica, Pedro Dias, é possível haver a fidelização do farmacêutico junto à marca dos laboratórios e a indústria está se atentando a isso. “A população brasileira é carente de informações e, muitas vezes, terceiriza a responsabilidade para o farmacêutico sobre o conhecimento da qualidade de um laboratório ou outro. Por isso, as grandes marcas estão buscando entender as necessidades desse profissional e criar formas e estratégias para estabelecer um relacionamento saudável entre ambos, com o objetivo de fidelização, uma vez que o farmacêutico é um profissional formador de opinião”.
A reinvenção das estratégias
Ele acredita que o marketing está se reinventando e que sempre existiram estratégias para o varejo farma, com os farmacêuticos no centro das atenções em todas as categorias de lojas, grandes redes, associativismo e independentes. “No entanto, ao longo dos últimos anos, com o empoderamento do profissional farmacêutico por meio da criação da Resolução do CFF 585/13 (atribuição clínica do farmacêutico) e Resolução 586/13 (atribuição de prescrição farmacêutica), esse profissional do medicamento tem reconquistado o seu espaço e seu valor perante a sociedade, os outros profissionais da saúde e, consequentemente, frente às indústrias de medicamentos”, defende Dias.
Outra estratégia corrente no mercado é a de indústrias que acabam patrocinando eventos com a justificativa de proporcionar conteúdo sobre algum tema de importância para o farmacêutico, no entanto, nesses eventos oferecem, principalmente, meios de vender seus produtos. “Essa é uma prática muito comum que, nos últimos anos, têm recebido uma nova roupagem de cuidado e manutenção da saúde - apelo forte que atrai muitos profissionais. É o acaso do evento da Abrafarma, Road Show Care Center, cujo marketing veio de forma quase velada, afirmando tratar-se de uma ferramenta de treinamento inovadora direcionada aos farmacêuticos”, aponta o diretor Comercial da Associação de Farmácias e Drogarias do Estado de Minas Gerais, Wesley Castro Silva, que continua: “Contudo, mostrou mais do mesmo...nada muito diferente do que já temos disponível no mercado, e em alguns casos até mais independentes. Uma vez que não estão diretamente ligadas a grupos de interesse, podem focar mais na formação profissional e menos na questão empresarial”.
Ele defende que não há nada de errado em oferecer palestras e seminários para farmacêuticos para orientar sobre indicações e benefícios do produto A ou B, ou mesmo promover um evento específico para informar o mercado sobre as novas soluções que já estão disponíveis. Muitas pesquisas e tecnologia de ponta são aplicadas para alcançar a cura de diversos males, e isso precisa chegar aos profissionais de saúde. A ressalva de Silva nesse contexto é sobre o objetivo do evento, que precisa estar claramente informado, permitindo ao profissional visualizar o real motivo de sua presença naquele ambiente.
“No caso do evento da Abrafarma, quase 90% do público presente eram farmacêuticos contratados de uma rede mineira de drugstores. A ideia principal era mesmo aumentar o volume de negócios, uma vez que as informações dadas ali tiveram pouca ou nenhuma relevância no aspecto de cuidado ao cliente/paciente”, afirma Silva. Para ele, foi uma ação conjunta entre indústria farmacêutica e o varejo de medicamentos, viabilizada por uma associação para vender mais uma marca em detrimento de outra.
É fato que na classe médica, há muito tempo, alguns laboratórios destinam ações para médicos, que incluem patrocínios em congressos, cursos de especialização e viagens. Em contrapartida, esses médicos acabam prescrevendo suas marcas. Segundo Melo, do Teuto, essas ações têm muito a ver com a filosofia do laboratório. “Em parceria com a Pfizer, por exemplo, temos apostado também nessa estratégia. Junto com ela, participamos dos principais eventos médicos do País. Essas ações são validadas pelas políticas de compliance”, afirma o executivo.
No entanto, o Teuto também considera o farmacêutico em suas ações de marketing. Melo diz que eles são essenciais como formadores de opinião na cadeia produtiva: “Ainda mais se falarmos em propostas que ofereceram, nos últimos anos, mais autonomia e independência para esses profissionais, como os medicamentos genéricos e similares equivalentes, que proporcionam certa independência aos farmacêuticos no ponto de venda e, consequentemente, mais poder de compra para o consumidor”. Baseado nisso, o laboratório oferece inúmeras ações de capacitação e valorização do profissional.
Na opinião de Dias, antes de criar ou oferecer palestras e cursos, os players deveriam entender as necessidades desse profissional e oferecer serviços que, de fato, irão contribuir para a sua formação, colaborando para que o farmacêutico leve serviços mais assertivos para seus clientes e pacientes. “Na minha percepção, oferecer esse serviço, abordando apenas produtos, não é a melhor forma de criar empatia com a marca”, ressalta ele.
O fato é que o novo movimento das indústrias deve focar a atuação especializada do farmacêutico, que tem o poder de influenciar, no atendimento clínico, o melhor tratamento para seu paciente. Esse é o empoderamento do profissional que as indústrias já vislumbraram. Cabe ao profissional, nesse processo de mudança advinda da prescrição farmacêutica, avaliar os limites éticos no âmbito de sua atuação, influenciada ou não pelos grandes laboratórios.
4 - A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO PONTO DE VENDA
Sabe aquela drogaria tradicional, baseada na venda de medicamentos e com a oferta de alguns produtos de higiene pessoal? Esqueça...ela está em processo de extinção! Exageros à parte, o que se vê é o surgimento, depois das resoluções sobre a prescrição farmacêutica, de um novo tipo de PDV, muito mais parecido com as drugstores americanas – lojas gigantes que vendem todo tipo de produtos nas gôndolas e mantém, em seu interior, uma muito bem equipada clínica, com um farmacêutico prescritor, oferecendo consultas e medicamentos à população, com toda a segurança e qualidade.
Embora isso pareça estar distante, o fato é que esse modelo está muito mais próximo do que se imagina. Diversas redes nacionais já se posicionam como drugstores e oferecem todo tipo de produtos em suas prateleiras, como alimentos roupas e calçados. Vale exemplificar com as redes Araujo e Pague Menos. Além disso, com as resoluções do CFF 585/13 e 586/13, os farmacêuticos têm atribuições clínicas e passam a prescrever medicamentos em consultórios dentro dessas mesmas farmácias que vendem de tudo. Qual a diferença do modelo americano? Nenhuma...apenas o tamanho das lojas!
No Brasil, redes como Onofre possuem centros de beleza completos, com consultores especializados em dermocosméticos. A rede de drogarias Araujo ostenta um dos maiores centros de conveniência do País em suas mais de 170 lojas estabelecidas no modelo de drugstore em Minas Gerais. Baseia-se no conceito one stop (uma parada), ou seja, o máximo que se pode oferecer em termos de conveniência para uma pessoa dentro de uma farmácia. E claro, eles começam a ter os serviços farmacêuticos em consultórios muito bem estruturados.
Já a Pague Menos (que tem 1.080 lojas em todas as unidades da Federação, distribuídas por 346 municípios) já mantém cerca de 630 clínicas em suas lojas, onde oferecem consultas farmacêuticas e outros serviços. O fundador e presidente do conselho da Rede, Deusmar Queirós, afirma que manter as clínicas ativas valoriza enormemente o farmacêutico e isso gera um importante retorno à comunidade: “Claro que o profissional precisa se dedicar à sua qualificação para exercer a clínica com qualidade e conhecimento”.
Já a diretora de Marketing da Pague Menos, Patriciana Rodrigues, diz que para persistir é preciso ouvir o cliente, acreditar na sua equipe e na sua capacidade de inovar sempre. “A Pague Menos mantém o foco em ações com excelente relação de custo-benefício. Nossa marca remete a preço, e nos planejamos para entregar mais por menos sempre. Isso não significa obrigatoriamente os menores preços, mas sempre as melhores oportunidades”.
Com um porte um pouco menor, a Agafarma é uma rede associativista, com mais de 400 farmácias distribuídas em 200 municípios do Rio Grande do Sul. Suas clínicas farmacêuticas estão em pleno funcionamento e geram importante lucro para os estabelecimentos.
De modo geral, todos os varejistas que se dispõem a entrar nessa onda e oferecer o novo PDV ao seu consumidor têm de investir no conceito, seja R$ 5 mil para efetuar pequenos ajustes ou R$ 150 mil para a construção de um consultório, dependendo do tipo de acabamento.
Divisão de espaço com os consultórios
Importante salientar que, nesse novo modelo, atualmente, produtos de beleza, cosméticos, itens para nutrição e suplementação e artigos de higiene pessoal estão dividindo seus preciosos espaços com os consultórios farmacêuticos, que há três anos não existiam nem como proposta no planejamento estratégico das empresas.
O presidente da Drogaria Araujo, Modesto Araujo Neto, sempre pensou à frente de seu tempo. “Nós já aplicamos vacina há 15 anos, porém, agora estamos trabalhando com um visual novo e oferecendo também exames laboratoriais rápidos e partindo para uma clínica, com atendimento médico”.
Ele defende o conceito de loja dentro da loja. “Eu acredito que este seja o negócio do futuro. Vale lembrar que um exame de Dengue, no hospital, vai demorar três horas. Nós fazemos em 15 minutos e cobramos muito mais barato. Este é um modelo que estamos trazendo dos Estados Unidos e Europa, para diminuir a deficiência do SUS e melhorar a saúde brasileira”.
Modesto aposta que, frente ao trânsito infernal e à vida agitada, é fundamental abraçar a filosofia de one stop, que possibilita à pessoa, com uma parada, comprar a ração do cachorro, o chinelo, o refrigerante, o sorvete para uma sobremesa, o pão de amanhã, o leite, o café, tudo, inclusive medicamentos. “E aí se está prestando um serviço à comunidade. Em vez de você ir aqui e acolá, num local você resolve tudo”. Sinal dos tempos...
5 - UM NOVO OLHAR DA SOCIEDADE SOBRE O FARMACÊUTICO
Lembra-se daquele farmacêutico que era considerado o doutor da cidade e que tinha a tradição de cuidar da família de forma muito próxima? Esse profissional está de volta na visão da sociedade, principalmente nas cidades de médio e pequeno portes.
A boa notícia é que, desde a autorização do farmacêutico para prescrever alguns tipos de medicamentos, a população vem confiando cada vez mais nesse profissional! Segundo a terceira edição da pesquisa do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico sobre este tema, essa confiança foi manifestada por 61% dos entrevistados. Nas edições anteriores, este índice ficou em 72%, em 2014; e em 42%, em 2013.
“Apesar da variação desses 9 pontos percentuais percebida desde a edição de 2014, o índice de aprovação da prescrição farmacêutica no Brasil ainda é considerado alto. O farmacêutico continua sendo uma opção acessível e confiável para tratar os males menores dos brasileiros”, diz o fundador do ICTQ, Marcus Vinicius de Andrade.
O grau de confiança é maior do que a média nacional entre os moradores das regiões Norte e Centro-Oeste, e entre aqueles que residem no interior e os que estão fora do mercado de trabalho.
O estudo ficou ainda mais abrangente em 2016, se comparado às edições anteriores. Além da prescrição de medicamentos por farmacêuticos, ele teve o objetivo de conhecer a opinião da população brasileira sobre a presença de consultórios nas farmácias. Isso é uma inovação no mercado.
Quando perguntado que tipo de farmácia o entrevistado prefere - sem consultório ou com consultório - a maioria dos brasileiros optou por farmácia com consultório (71%) para obter atendimento via farmacêutico.
Essa preferência é mais comum entre os brasileiros menos privilegiados quanto à escolaridade, renda familiar, classificação econômica, entre os moradores de cidades localizadas no interior e entre os que costumam utilizar atendimento médico particular e o SUS.
Com a consulta e receitas na farmácia, 43% declararam que os gastos com a saúde vão se manter, enquanto 19% acreditam que vão aumentar e 38% que vão diminuir. A percepção de que os gastos vão se manter é mais disseminada no Sul do País. Em resumo, embora não seja consensual, a postura favorável à consulta e prescrição nas farmácias é majoritária na população.
“Importante salientar que os consultórios farmacêuticos estão tendo maior receptividade em cidades pequenas, com menos de 50 mil habitantes, localizadas no interior dos Estados. A população que respondeu de maneira positiva às clínicas é dependente do SUS e pertence às classes C, D e E, em sua maioria”, ressalta Andrade.
Para a realização dessa pesquisa foram feitas 2.115 entrevistas por todo Brasil, distribuídas em 130 municípios, de forma a representar todas as regiões geográficas. As entrevistas aconteceram entre os dias 30 de novembro e 6 dezembro de 2016. Dos entrevistados, 42% são das regiões metropolitanas e 58% do interior. Eram 52% de mulheres e 48% de homens, com idade média de 42 anos. Em sua maioria, pertencem à classe C (48%) e são economicamente ativos (63%), com destaque para os assalariados registrados (23%). 45% têm ensino médio e 39% o fundamental, com renda média familiar de R$ 3.142,00.
Os resultados dos estudos reafirmam a mudança de status do farmacêutico em termos de sua valorização junto à sociedade. Ele é visto, cada vez mais, como o agente de saúde indispensável nos cuidados relacionados ao consumo de medicamentos.
6 - A REVOLUÇÃO NA ESPECIALIZAÇÃO PROFISSIONAL
As resoluções 585 e 586, de 2013, do CFF, podem ser consideradas um marco nos programas de especialização destinados aos farmacêuticos brasileiros. Após a publicação desses instrumentos, a maioria dos cursos acabou adaptando sua grade para as necessidades da prática da farmácia clínica no Brasil, com ênfase em semiologia farmacêutica, patofisiologia das doenças crônicas mais incidentes na sociedade e enfoque na farmacoterapia de grupos específicos de pacientes, como por exemplo, pediatria, geriatria e gestantes.
De acordo com o farmacêutico, mestre e doutor em Farmacologia e diretor Técnico Científico da Sociedade Brasileira de Farmácia Hospitalar e Serviços de Saúde (Sbrafh), Marcelo Polacow Bisson, os cursos também têm procurado metodologias ativas de ensino, como o uso de simulações e estudos de casos clínicos, o que aproxima os alunos da realidade profissional da prática farmacêutica clínica.
Os programas, que antes eram essencialmente voltados para o âmbito hospitalar, passaram a focar também o varejo. “O paciente é único e ele apenas muda de local de atendimento na sua vida. Se ele está internado, terá alta. Nesse contexto, a abordagem farmacêutica clínica é de entender que, possivelmente, ele vai se tratar e será acompanhado ambulatorialmente nas farmácias comunitárias (varejo e unidades básicas de saúde do SUS). Isso ressalta a importância de o farmacêutico comunitário estar preparado para essas práticas”, fala Polacow.
Claro que essas mudanças surtirão efeito somente em médio e longo prazos, pois a principal mudança é de mentalidade do farmacêutico para atuar clinicamente no seu dia a dia. Nesse sentido, os ensinamentos das práticas profissionais em programas de pós-graduação têm um efeito mais longínquo, envolvendo a aplicação dos conhecimentos e habilidades adquiridas nesses programas. “A pós-graduação e os programas de residências são ferramentas essenciais para o desenvolvimento dos profissionais, mas sozinhos não surtem efeitos, pois a sociedade, a cadeia farmacêutica e a equipe multiprofissional também devem ser envolvidas, bem como as entidades científicas, profissionais e sindicais”, lembra Polacow.
Voltado para a inovação e com foco nas tendências do mercado, o ICTQ foi o primeiro instituto de ensino superior a lançar uma pós-graduação voltada para profissionais do varejo em farmácia clínica com foco em prescrição farmacêutica. “Isso demonstra pioneirismo, mas também aponta que o ICTQ é um Instituto com visão de vanguarda. Em 2013, quando lançou o curso de Prescrição Farmacêutica & Farmácia Clínica, a Instituição iniciou um processo de transformação de farmacêuticos convencionais, meros atuantes no varejo do setor, em profissionais com habilidades e competências para a prática clínica e para a otimização da farmacoterapia dos usuários de medicamentos”, lembra o farmacêutico, Lincoln Cardoso.
É importante destacar que esse curso é uma especialização lato sensu, portanto, não influencia diretamente no meio acadêmico, pelo qual se entende, em primeiro nível, a graduação. Para Cardoso, esse curso promoveu uma grande onda de transformação entre os profissionais e um grande despertar para a necessidade da especialização profissional para a prática da atenção farmacêutica nas farmácias comunitárias brasileiras.
Ainda agindo segundo seu posicionamento inovador, o ICTQ lançou seu Programa de Residência em Serviços Clínicos Farmacêuticos para o Varejo, que é uma verdadeira novidade no processo de especialização e de geração de expertise para a prática clínica em farmácias comunitárias privadas no Brasil. Os programas de natureza pública ou privada existentes, como os multiprofissionais ou profissionais em saúde, não se assemelham a essa proposta, que é específica para o setor que mais emprega farmacêuticos no País - o varejo (farmácias e drogarias privadas). “O ICTQ demonstrou inovação e compromisso com a categoria farmacêutica, ao investir em uma estrutura física e didático-pedagógica que oferece experiências práticas e verdadeiramente reais de aprendizado clínico ao farmacêutico atuante em farmácias e drogarias”, destaca Cardoso.
Já Polacow vê esse programa como uma excelente iniciativa, principalmente, depois do advento da Lei 13.021/14, que tornou a farmácia definitivamente um estabelecimento de saúde, cuja prática em serviço já tem seu valor reconhecido há décadas. “O mercado e a profissão farmacêutica são extremamente dinâmicos e, nesse sentido, as tendências devem ser o uso da tecnologia da informação e o aperfeiçoamento das ferramentas de ensino para melhorar a formação clínica do farmacêutico. Os programas de residência, assim como nos Estados Unidos e Europa, devem ganhar força na formação dos futuros profissionais”, finaliza ele.