Raia Drogasil negocia com planos de saúde para ser alternativa ao pronto-socorro.

Maior rede de farmácias do país, a Raia Drogasil (RD) mantém conversas com planos de saúde para fechar parcerias envolvendo um atendimento inicial nas unidades da rede, de forma a desafogar o pronto-socorro dos hospitais.

“Pronto-socorro é um inferno. Um dos pesadelos é que a pessoa espirrou e vai para o pronto-socorro, que é caríssimo. E 80% das entradas são casos de baixa complexidade, como dor de garganta, espirro, gripe, resfriado”, disse o CEO Renato Raduan, em sua primeira entrevista desde o anúncio, em agosto, da escolha de seu nome para o cargo.

Desde o dia 1º de janeiro, Raduan ocupa o cargo. Marcílio Pousada deixou a função e foi para a presidência do conselho de administração. Essa foi a maior reorganização de cargos no grupo em mais de uma década. Antonio Pipponzi, que chefiava o “board”, ficou como membro do colegiado.

Esses contatos para modelar um programa - que, reforça a rede, respeitaria critérios éticos e legais no atendimento - envolve, porém, certa resistência dos planos, como explica o executivo.

Raduan ainda disse que o grupo deve montar um programa junto às empresas para ir além dos planos de desconto em medicamento, e focado no acompanhamento da saúde de funcionários das empresas.

Não se pode achar nunca que estamos numa posição confortável”

— Renato Raduan

A empresa ainda comentou sobre a possibilidade de os supermercados passarem a vender medicamentos sem receita em suas lojas. Quando a entrevista foi feita com o executivo, o governo ainda não havia anunciado o estudo da medida. Sobre a questão, a RD disse que reitera o posicionamento da Abrafarma, a associação do varejo de farmácias, que aponta os riscos a uma venda de medicamentos nas redes de alimentos.

A seguir, os principais trechos da entrevista de Raduan ao Valor.

Valor: Como foi o processo de sucessão na RD? Porque mesmo em empresas com governança mais madura, não é algo fácil.

Renato Raduan: Eu acho que foi um processo, dentro do possível, muito suave, e em outras empresas isso deve acontecer com rixa maior. Desde 2018, quando o movimento começou, o Antonio Carlos Pipponzi [presidente do conselho de administração e da família fundadora da Raia] tratou disso de forma espontânea, aberta e verdadeira. Nos últimos anos, eles já vinham me dando sinais de confiança nas entregas, e abrimos um longo processo de avaliação interna com consultorias, para o ‘board’ chegar a um consenso.

Valor: Mas não é algo trivial, e não deve ter sido uma situação fácil para você, que ‘disputou’ o cargo com Marcello De Zagottis, na época vice-presidente comercial e de marketing, e sobrinho de Pipponzi, da família de acionistas...

Raduan: A RD tem uma governança forte, estruturada. E conheço o Marcello há 20 anos, quando comecei na Accenture [consultoria]. Ele não passaria a perna em alguém, e ele sabe que eu nunca faria o mesmo. Depois de atuar na Accenture Brasil, morei cinco anos no México pela consultoria, como responsável pela divisão de varejo. Passei pelo Pão de Açúcar e pela Pernambucanas. Trabalhei com famílias controladoras, com e sem governança. Nas avaliações das consultorias contratadas para a sucessão, eu e Marcello ficamos com “scoring” acima do que era preciso, então o que contou foi o perfil para o que a empresa quer agora. A gente não pode fingir que isso [o fato de disputar o cargo com um sócio da família] não existia. Ele não é só um executivo. Mas a grandeza com que o Marcello respondeu à decisão do conselho de administração mostrou que ele estava bem resolvido. E o que nos diferenciou foi o estilo e o que a empresa buscava.

Valor: Quais eram as diferenças?

Raduan: Pela minha trajetória, tenho um olhar mais atento para pessoas, para organização, para liderança, para saber como a gente faz isso ou aquilo. E ele tende a ser uma pessoa com um olhar mais para o que a gente precisa fazer. E temos discutido isso recentemente, porque falam: “Ah, mas fazer expansão é fácil”. Mas fazer expansão como? Isso faz toda a diferença entre sucesso e fracasso. Vender a caixinha de medicamento é o que as farmácias fazem, e o preço é similar. O que faz a diferença é o como você cria uma experiência.

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Valor: Apesar de a empresa ter uma situação confortável, comparada com o resto do varejo, a RD tem questões a avançar ainda. Em termos de melhora de margem e de fazer o braço de saúde (vacinas, testes) rentável. Como será isso?

Raduan: Primeiro, não se pode achar nunca que a gente está numa posição confortável. O desafio é garantir que a empresa não tenha esse “mindset”. Porque é um mercado super atraente, o menos sofrido e o que mais tem o crescimento “contratado” pelo envelhecimento da população. O segundo ponto é como é dirigir uma empresa com tantos sucessos. O lado bom é que você consegue pensar no futuro. Eu estive no Walmart. Eu sei o que é trabalhar numa empresa que não deu certo [no Brasil]. Se você pensar a gente tem 16% de participação de mercado. É, muito pulverizado. Então, ainda tem espaço. Eu entrei aqui e tinha 700 farmácias, e 9% de “share”. E quase 13 anos depois, são 3,2 mil, então deveríamos estar próximo de 30% de share. Há muito espaço ainda. E o segundo caminho de crescimento, é ter negócio com impacto muito maior na saúde da população.

Valor: O que será feito?

Raduan: A farmácia passou a poder vender vacinas em 2019. Depois, com a Covid, foram liberados os testes rápidos. Os órgãos reguladores enxergaram o papel que a farmácia pode ter como agente de saúde. E o sistema de saúde está bastante prejudicado. Não para de pé, a conta, não fecha. O Brasil tem 90 mil farmácias. A empresa tem 3,2 mil lojas e 12 mil farmacêuticos. Estamos a cinco minutos de mais 100 milhões de brasileiros. A gente tem todos os ativos para ajudar a desafogar o sistema e fazer um primeiro atendimento. Se a gente entrar como parceiro que ajude a cuidar da saúde, traz impacto em diversas dimensões.

Estamos estimando aberturas de 330 a 350 lojas em 2025”

— Renato Raduan

Valor: Mas como isso pode ser feito em termos de negócio?

Raduan: Atuar dessa forma traz mais benefícios aos funcionários de empresas, porque você ajuda a reduzir, por exemplo, absenteísmo e sinistralidade. Há três anos, compramos uma startup de “big data” Healthbit. Ela começou com uma empresa que ajudava a analisar os dados de saúde da população e ajudava as empresas a ter elementos para renegociar os contratos anuais do plano de saúde. Com o passar do tempo, percebemos que ela conseguia fazer uma interferência na saúde da população e reduzir a sinistralidade do plano. Então, começamos a fazer uma linha de acompanhamento para as puérperas e gestantes. Outro exemplo: da população de uma empresa, estamos tendo muita internação de diabéticos, então vamos criar um programa de intervenção e de acompanhamento dessas pessoas. E isso segue crescendo como uma empresa independente na RD, capturando contas. Só que ela não “bebe” de nenhum dos nossos ativos ainda. Não usa do nosso serviço farmacêutico. A gente está nesse processo de fazer isso.

Valor: Em que ponto está hoje?

Raduan: Já temos umas três ou quatro empresas com um programa mais abrangente, em que integramos o acompanhamento com as nossas farmácias. Por exemplo, uma empresa tem 100 diabéticos trabalhando, então é criado um programa de acompanhamento desses empregados na loja mais perto da casa dele, com um programa nutricional, serviços como medição de glicemia, uma conversa com o farmacêutico, etc. É criar um programa e uma relação completa com o nosso cliente. Eu já tenho uma carteira de clientes empresariais para quem a gente dá desconto de medicamento, mas ainda não oferecemos nenhum programa de cuidado, damos só desconto de medicamento. Ampliar e integrar isso é outro caminho. Com a reestruturação no comando, as áreas onde estão essas investidas vão para o Bruno Pipponzi, vice-presidente de saúde. Ele vai envelopar um programa e irá bater na porta de todas as empresas que têm hoje só desconto de medicamento.

Valor: Tudo isso gera receita nova e margem maior?

Raduan: Às vezes, depende do serviço, porque o serviço em si nem vai gerar tanta lucratividade. Vacina gera lucratividade. No geral, tudo isso cria relacionamento e o famoso “lifetime value” (o quanto o cliente gasta na empresa em todo o período de relacionamento). Essa é uma vertente de investimento relacionada com saúde, que inclui serviços, como vacinas e testes, sendo construída em cima dos ativos que a gente já tem, como a base de 3,2 mil lojas e 12 mil farmacêuticos. Em 2024 fizemos sete milhões de serviços de saúde em farmácia. isso não é um troco. Não é uma coisinha. Entre as 3,2 mil lojas há duas mil com serviços. Um milhão de clientes fazem pelo menos dois serviços no ano.

Valor: Há negócios sendo estudados em outras áreas?

Raduan: Sim, outro meio de crescimento envolve o custo do pronto-socorro. Pronto-socorro é um inferno. Um dos pesadelos é que a pessoa espirrou e vai para o pronto-socorro, que é caríssimo. A gente tem todas as estatísticas de alguns hospitais: 80% das entradas são casos de baixa complexidade. Cerca de 50% tem a ver com doenças respiratórias, como dor de garganta, espirro, gripe, resfriado. E quase metade das entradas de pronto-socorro foi com [rede] privada ou alta renda. Então, quase 80% são temas simples que uma passagem numa farmácia seria mais barato. Essa conversa avançou com os planos, temos falado com alguns.

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Valor: Há dificuldades nesse processo?

Raduan: Os planos acabam tendo receio porque ao facilitar tanto o acesso, mais gente vai para uma farmácia do que irá para o pronto-socorro. Porque a pessoa pensa: “Estou aqui em casa meio mal, vou lá para o hospital, ou para a farmácia. Acho que vou esperar um pouco para decidir”. Então tem esse receio dos planos, de mais gente indo às farmácias [e não use o PS], mas de qualquer forma, vemos benefício se a saúde dos empregados melhorar mais facilmente.

Valor: Vocês vão tirar mais crescimento da base atual de lojas ou de expansão orgânica?

Raduan: Vamos por partes. Expansão [com abertura de lojas] vai continuar recebendo montante relevante do investimento, porque o nosso nível de retorno a esse investimento é alto. Seríamos malucos de parar de colocar dinheiro nisso. Hoje a gente não tem nenhum sinal que justifique desaceleração, seja porque as taxas internas de retorno estão mais saudáveis do que estavam, seja porque, estrategicamente, hoje a gente entende o valor da proximidade da loja, pelo fator da entrega rápida da loja. Estamos estimando aberturas de 330 a 350 em 2025, e foram cerca de 300 em 2024.

Valor: Mesmo sendo um setor resiliente, muitas redes endividadas quebraram nos últimos cinco anos. Como está a competição?

Raduan: Hoje é um cenário menos pressionado do que tinha anos atrás, quando todo mundo estava muito endividado, me parece um pouco menos pressionado. Mas eu não vejo que o contexto competitivo baixou a quadra, como também não vejo que está super desafiador.

Valor: Após esse crescimento, não está na hora de ter um modelo mais otimizado, olhar mais eficiência de despesas? Normalmente, esses momentos de mudança de comando, se repensa isso.

Raduan: Sim, eu acho que é o momento da gente olhar um pouquinho mais para o corporativo, nosso “SGA” (sigla para despesas operacionais) como um todo, começar a buscar mais eficiência. Mas um dos desafios é como entregar o melhor resultado, e construir o futuro. Nos últimos cinco anos, a gente investiu bastante para construir o futuro, seja na digitalização e no braço de saúde. A empresa foi dando uma engordadinha. Fazendo investimento para encontrar os caminhos, e isso custa um pouco. Mas a despesa já diluiu e a expectativa é diluir pouquinho mais. No terceiro trimestre de 2024, a margem ebitda [lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação] foi de 7,5% da receita, alta de 0,4 ponto, resultado da diluição nas despesas.

Valor: Há questionamentos do mercado sobre indicadores de curto prazo da empresa?

Raduan: O que o mercado tem perguntado bastante é o crescimento da margem ebitda. Eles gostariam de ver um ritmo de crescimento de margem mais constante. O mercado deve esperar que continuaremos diluindo despesas. A questão é que quando entram os números da 4Bio (negócio de medicamentos especiais) e outras investidas, que historicamente tem margem menor, isso mascara esse ganho que a gente está tendo de lucratividade. Agora, quero crer também que em algum momento estabilizará a participação da 4Bio.

Valor: Mesmo vocês sendo mais protegidos, com dólar alto, inflação e juros, há sinais de que este será um ano mais difícil do que parece. Isso entrou no orçamento de 2025?

Raduan: A gente acabou de terminar a nossa peça orçamentária. Se a inflação for além dos 5%, 6% ela impacta no reajuste anual dos preços de medicamentos do setor, em abril, nas nossas folhas de pagamento, no reajuste de alugueis. A questão é, se a inflação vier alta até abril, repassamos a alta, e depois se o reajuste de custos vier menor, isso é bom para nós. Mas se acontece o inverso, é ruim. A gente reconhece que existem incertezas, e a gente vai analisá-las ao longo do ano. Mas para efeitos práticos, estamos fechando um orçamento com otimismo, com até 350 lojas novas.

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