Você se lembra do fuzuê causado pelo primeiro BBB? O reality estreou na telinha, na emissora Globo, em janeiro de 2002, há exatos 16 anos. Desde a primeira edição, cujo vencedor foi Kleber Bambam, até hoje, o programa fez muitas celebridades. Sabrina Sato, Grazi Massafera e o deputado Jean Wyllys são os maiores expoentes da geração pay-per-view. No entanto, assim como no mercado de ações, no show business uma formula que fez sucesso no passado não garante o sucesso no presente. Antes de fazer o link do meu raciocínio com o mercado farmacêutico, eu lhe pergunto: Como anda o modelo de negócios do Big Brother Brasil?
Ahh...você é daqueles que não assiste o programa? Desculpe-me! Vamos te explicar. O programa atingiu o seu auge em 2005, com 47,5 pontos no ibope. Após este ano, a audiência da atração entrou numa queda livre, que culminou, na última edição, em uma perda de 50% no número de telespectadores. Isso causou uma grande ferida no BBB, que muitos pensaram ser de morte. Até o seu principal patrocinador, a FIAT, o abandonou. Em suma, o modelo de negócio da atração anda mal, apesar de ainda apresentar lucro. Eu afirmo que este lucro é o “ouro de tolo” que faz com que a Globo mantenha a atração no ar, pois um produto que entrega resultado positivo impede que seus financiadores gastem energia na concepção de alternativas mais rentáveis. Isso acontece em todos os nichos de mercado, inclusive no nosso. Agora que lhe introduzi no mundo dos enclausurados, faço a pergunta derradeira: As pequenas farmácias estariam insistindo num “modelo BBB de negócios”?
Vamos direto à resposta: sim! As farmácias de pequeno porte já foram extremamente rentáveis e por muito tempo reinaram no varejo farmacêutico brasileiro. Porém, assim como o BBB, a maioria destas empresas parou no tempo e se contentam em colher uma fração dos dividendos gerados nos seus tempos áureos. O que aconteceu para que o varejo de pequeno porte chegasse a esse ponto? A resposta é simples: Nada! O problema é esse. O modelo de negócio de grande parte das farmácias de pequeno porte não sofre nenhuma mudança há pelo menos 30 anos.
A geração dos meus pais foi a última a ter contato com o modelo empresarial no qual a maioria das farmácias era liderada por farmacêuticos com atuação clínica, sendo essas claramente reconhecidas como um estabelecimento de saúde. A consulta farmacêutica, muito divulgada nos últimos anos, era rotina naquela época. Aqui abro um parêntese para parabenizar as farmácias individuais que, ainda hoje, possuem esta prática. Elas são oásis no meio do deserto, e representam o início de um importante resgate de identidade. Para aqueles que, com um olhar mais romântico, ainda acreditam que a maioria do varejo farmacêutico está com suas atenções voltadas para os cuidados com o paciente, sugiro uma reflexão e um tour pelas farmácias do Brasil. Que tal um banho de realidade?
Voltando ao BBB, acredito que na cabeça dos mandatários da rede Plim-Plim, o programa já está com os dias contados. Virou um abacaxi, como costumamos dizer na linguagem de mercado. Se tornou um negócio que, apesar de ainda dar lucro, não merece mais investimento, pois dali só se espera a queda nos resultados. E as farmácias individuais? Elas também se tornaram abacaxis? Sim. Após o modelo clínico, vivido há 3 décadas, o grosso do pequeno varejo mergulhou no negócio de “aviação de receitas” e “empurroterapia”. A culpa desta mudança de rumo pode ser creditada a empresários alienados e “assinacêuticos”. Este modelo criou uma verdadeira “vaca leiteira”, onde pequenas farmácias operavam com custos baixos, alta demanda e margens consideráveis de lucro. Porém, enquanto a grande massa de pequenas farmácias se distanciava da clínica e adotava um modus operandi que permaneceria inerte por 30 anos, uma ameaça se formava: os grandes varejistas.
Num mundo onde tropeçamos em uma grande rede de farmácias a cada esquina, o modelo de negócios predominante no pequeno varejo está falido. O pequeno precisa reinventar-se, urgentemente! As grandes redes são mais eficientes em “aviação de receitas”, gestão de estoques, venda ativa de não-medicamentos e até ensaiam ingressar na farmácia clínica (torçamos para que a promessa seja sincera). Você arriscaria dizer como estará o pequeno varejo farmacêutico daqui a 20 anos? Eu sim! Se nada mudar, a imensa maioria dos pequenos estabelecimentos estará fechada. Restarão alguns poucos negócios de pequeno porte voltados para o mercado de nicho e diferenciação, alicerçados na oferta de serviços farmacêuticos e qualidade de atendimento. Sua farmácia se encaixa no perfil das sobreviventes? Se sim, parabéns! Você está no caminho certo. Caso contrário, estou me referindo a uma “quebradeira” de pelo menos 80% dos pequenos negócios existentes nos grandes centros e algo em torno de 50% em cidades de menor porte, as quais já começaram a ser povoadas pelos líderes do drugstore. O apetite dos grandes predadores do mercado farmacêutico é insaciável!
Esse cenário, aparentemente apocalíptico, não impactará negativamente na profissão farmacêutica. Pelo contrário, irá separar o joio do trigo. No pequeno varejo sobreviverá os que adotarem o modelo de atenção primária a saúde. Com o avanço dos mega varejistas, aparecerão mais oportunidades profissionais, tanto na prestação de serviços farmacêuticos, quanto em cargos de chefia. A liberação da administração de vacinas e as demais mudanças regulatórias que aconteceram recentemente no mercado farmacêutico promoverão um resgate da farmácia clínica e da nossa profissão, desta vez pelas mãos de empresas de grande porte, que verão nestes serviços uma excelente oportunidade de negócios.
Enfim, ao mesmo tempo em que o pequeno varejo vai para o “paredão”, vejo o fortalecimento da profissão farmacêutica. Talvez isso não seja por acaso. Você conhece alguma pequena farmácia que não paga o piso salarial? Já ouviu falar de um pequeno empresário do varejo farma que não valoriza o profissional farmacêutico? Achou estas perguntas pertinentes? Daqui a alguns anos elas soarão tão estranhas como alguém ansioso por assistir o BBB18. Aconselho aqueles que alicerçaram seus negócios em práticas obsoletas, que abram os olhos. Daqui para frente todos os dias teremos prova de eliminação!
* Professor do ICTQ (Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico), Bacharel em Farmácia, Administração de Empresas e Ciências Contábeis. Atua como consultor em gestão de varejo farmacêutico e é autor dos livros “Gestão Estratégica para Farmacêuticos” e “A Arte da Guerra para Farmacêuticos”.