Antes de compreendermos com mais detalhamento esta nova realidade precisamos entender o contexto histórico da prática farmacêutica no país. A primeira farmácia ou botica surgiu no país ainda na época do Brasil colônia, onde o boticário manipulava e produzia o medicamento diante do paciente, de acordo com a farmacopéia e a prescrição médica.
Com a industrialização em ritmo crescente, que ocorreu depois da primeira guerra mundial, o medicamento tornou-se um produto industrial, objeto de fortes interesses econômicos. Como consequência dessa mudança, a farmácia no Brasil se descaracterizou como estabelecimento de saúde e tornou-se um simples ponto de comercialização de medicamentos. Neste período o farmacêutico se distanciou muito da sua verdadeira vocação profissional, seja por negligência ou desmotivação, fazendo com que os estabelecimentos farmacêuticos perdessem o status de ambiente de saúde. A parcela de responsabilidade da profissão farmacêutica pela caracterização do estabelecimento farmacêutico como um agente comercial é grande e ainda carregamos o ônus gerado por este descaso.
Este cenário começou a mudar em fevereiro de 1999 quando, através da Lei no 9.797, a presidência da república estabeleceu o medicamento genérico no Brasil, permitindo a intercambialidade do mesmo com o medicamento de referência. O tema “medicamento” volta para a discussão nacional e junto com ele o Farmacêutico, o único profissional habilitado a fazer a troca do medicamento prescrito pelo genérico, iniciando-se assim a retomada da farmácia como estabelecimento de saúde.
O resgate da farmácia como estabelecimento de saúde ganhou projeção com a publicação da RDC nº 44/09, a qual regulamenta a prestação da Atenção Farmacêutica em Farmácias e Drogarias. Através desta surgiu um marco histórico para a profissão farmacêutica no Brasil, onde caminhos foram abertos para a efetiva implantação dessa prática e da troca de informações em um sistema multiprofissional, preparando, desta forma, o terreno para que o farmacêutico atuasse plenamente como profissional de saúde.
Mais recentemente entrou em vigor a Resolução nº 586, de 29 de Agosto de 2013, que instituiu no país a prescrição farmacêutica e vem preparando o terreno para o resgate, pleno e definitivo, da farmácia como estabelecimento de saúde. Com a ineficiência do Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro, que em tese possui o princípio constitucional da universalidade de acesso, grande parte da população enfrenta muita dificuldade para usufruir da atenção básica “formal” ou precisa recorrer a um plano de saúde suplementar para ter esse serviço disponível. Podemos dizer que a porta de entrada do SUS, que é a atenção básica, está emperrada. De acordo com o IMS Health, existem no Brasil mais de 65 mil farmácias e drogarias, com uma proporção de 3,34 estabelecimentos para cada 10 mil habitantes, número 3 vezes maior que o recomendado pela OMS. Com toda essa capilaridade me parece óbvio que precisamos utilizar essa estrutura das farmácias para lubrificar as portas da assistência básica e colocar definitivamente a farmácia e o farmacêutico como agentes de intervenção primária na saúde.
O governo precisa oficializar e sistematizar o que já vem sendo praticado por grande parte da população brasileira, ou seja, oficializar a farmácia como canal de atenção primária á saúde. Acreditamos que a recente aprovação da subemenda aglutinativa ao PL 4385/94, na câmara dos deputados, foi o primeiro passo nessa direção. Esta aprovação é a ponta do iceberg da NOVA FARMÁCIA BRASILEIRA.