Segundo a Organização Mundial da Saúde, o uso racional de medicamentos ocorre quando o paciente recebe o medicamento apropriado à sua necessidade clínica, na dose e posologias corretas, por um período de tempo adequado e ao menor custo para si e para a comunidade. A última pesquisa realizada pelo Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade (ICTQ), onde 1.480 pessoas foram entrevistadas entre os dias 25 de março e 03 de abril de 2014, em 12 capitais brasileiras, mostra que nossa realidade está longe do preconizado pela OMS. A pesquisa revela que 76,4 % da população brasileira faz uso de medicamentos à partir da indicação de familiares, amigos, colegas e/ou vizinhos. Em algumas capitais estes índices são mais elevados, colocando-se acima da média nacional, estão Salvador e Recife (96 %), Manaus (92 %), Rio de Janeiro (91 %), Brasília e São Paulo (83 %), e Belém (78 %). Estes dados são preocupantes e nos levam a uma pergunta inevitável: Por que isso ocorre de maneira tão endêmica?
Todas as respostas para esta pergunta passam pela ineficiência da atenção primária à saúde, disponibilizada para a população, e não sistematização do oferecimento adequado de serviços farmacêuticos. Algumas das principais causas apuradas pelo ICTQ para o uso inadequado de medicamentos foram: o consumo por indicação de familiares (76,4 % dos entrevistados) e o aumento da dose de medicamentos para potencializar efeitos terapêuticos de forma mais rápida, ação esta praticada por 65 % das pessoas entrevistadas em Curitiba – PR. O vácuo deixado por décadas de negligência no atendimento básico e a ausência do profissional farmacêutico na atenção primária, fez com que estes hábitos fossem criando raízes cada vez mais profundas em nossa sociedade. O fantasma da automedicação causa prejuízos imensuráveis à saúde da população e ao erário público brasileiro.
De acordo com o ICTQ, 32 % da população consomem medicamentos isentos de prescrição médica (MIPs) de forma autônoma e 33 % adquirem estes produtos com o auxílio de balconistas, ou seja, 65 % dos MIPs utilizados no Brasil não passam pelo crivo de profissionais farmacêuticos. Esses resultados ajudam a entender as razões que levaram ao registro, pelo Sistema Único de Saúde (SUS - DataSus), de 60 mil casos de intoxicações medicamentosas no Brasil entre os anos de 2009 e 2013. É preciso que os farmacêuticos sejam integralizados de forma efetiva na atenção primária à saúde. O SUS precisa aproveitar a capilaridade da rede de farmácias e drogarias brasileiras e sistematizar processos que levem atendimento básico à população. O hábito da automedicação encontrou terreno fértil no descaso com a saúde pública no Brasil e somente uma política de estado, que reveja todo o sistema, pode começar a reverter este cenário. A Prescrição Farmacêutica é uma das principais ferramentas disponíveis para enfrentar este desafio.
A bandeira da Prescrição Farmacêutica deve ser hasteada no sistema de saúde brasileiro. É preciso criar um sistema de atendimento à saúde que comece, e em casos de baixa complexidade também termine, nas farmácias e drogarias do Brasil. Precisamos criar mecanismos de triagem que permitam que os médicos sejam acessados apenas quando houver necessidade de atuação deste profissional. O serviço de Atenção Farmacêutica pode contribuir muito para a melhoria da qualidade de vida da população. Para isso é imprescindível que estes serviços estejam articulados com os demais serviços nacionais de saúde e que o farmacêutico procure aprimoramento profissional constante. Farmacêuticos, preparem-se para ocupar a linha de frente deste campo de batalha!