Concorrência, saturação do mercado de trabalho, desvalorização profissional e, ainda por cima, turbulências na economia do País. O cenário atual para as farmácias comunitárias, que são as farmácias que atendem diretamente à comunidade, e para os farmacêuticos que atuam nesses estabelecimentos não é dos mais animadores, certo? Errado. Esse é o lado meio vazio do copo. Quem decidiu enxergar o lado meio cheio nunca viu um futuro tão promissor.
A profissão farmacêutica vivencia um vigoroso e inédito processo de autotransformação, desencadeado por alguns fatos recentes muito importantes. Merece destaque a publicação, pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF), das resoluções 585, que regulamentou as atribuições clínicas do farmacêutico; e 586, que regula a prescrição farmacêutica no Brasil. Ambas as normativas foram publicadas em 2013. Outro acontecimento importante foi a aprovação da Lei 13.021/14, que transforma as farmácias e drogarias em unidades de assistência à saúde e consolida a autoridade técnica do farmacêutico nesses estabelecimentos.
Essas mudanças vieram imprimir a receita de um novo modelo de farmácia, que certamente tem contribuído para que o setor se mantenha resistente à crise. Segundo levantamento feito pela Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) e divulgado pelo jornal Valor Econômico, a venda de medicamentos no varejo cresceu 12,34% no primeiro semestre em relação ao mesmo período do ano passado, somando R$ 10 bilhões.
A exigência da presença obrigatória do farmacêutico responsável técnico durante todo o tempo de funcionamento da farmácia ou drogaria, reiterada pela Lei 13.021/14, chegou a ser encarada por uma parcela do empresariado como fator prejudicial para os negócios. Um dos argumentos era o de que a exigência legal impactaria em custos elevados, especialmente para as farmácias comunitárias. Mas, em contrapartida a essa situação, outros setores do empresariado já vêm fazendo dessa obrigação um trampolim para alavancar lucros e conquistar clientela. Com o farmacêutico presente e atuando clinicamente no acompanhamento farmacoterapêutico dos pacientes, muitas farmácias estão aumentando o seu faturamento e acumulando cada vez mais clientes – o que melhor, clientes fiéis. E o diferencial desta nova farmácia, com consultório farmacêutico e atendimento clínico, é uma assistência de qualidade, em que o faturamento aumenta na mesma medida em que se promove o bem-estar e a qualidade de vida do usuário de medicamentos que a frequenta.
Como adequar os estabelecimentos farmacêuticos a esse novo modelo e como se adaptar às transformações da profissão é uma das questões que estiveram em debate durante o II Congresso Brasileiro de Farmácia Comunitária, (*) realizado de 10 a 12 de setembro, em Foz do Iguaçu, pela Sociedade Brasileira de Farmácia Comunitária. O congresso reuniu, entre seus palestrantes, alguns dos mais renomados farmacêuticos do Brasil, Portugal, Espanha e Canadá. Entre as presenças internacionais, estavam Hermant Patel, secretário do Comitê Farmacêutico da North East London (Inglaterra); Warren Meek, executivo da Federação Internacional de Farmacêuticos (Canadá); e Carlos Maurício Barbosa, bastonário da Ordem dos Farmacêuticos de Portugal. Foi uma oportunidade para os proprietários de farmácia e farmacêuticos que atuam nas farmácias comunitárias enxergarem que a sua metade do copo está cheia de água fresca e pura. Prontinha para beber!
Valmir de Santi é vice-presidente do Conselho Federal de Farmácia. O artigo foi publicado no Jornal Gazeta do Povo, de 05 de setembro de 2015. Foram feitas pequenas adequações de tempo do artigo original no último parágrafo.