Polícia conclui que farmacêutica não cometeu crime ao vender curso de peeling de fenol

A Polícia Civil do Paraná arquivou a ocorrência e não deu prosseguimento à investigação que apurava se a farmacêutica Daniele Stuart praticou exercício ilegal da medicina. Ela vendia o curso de peeling de fenol comprado pela influenciadora Natalia Fabiana de Freitas, conhecida como Natalia Becker, dona da clínica onde um jovem morreu após fazer o procedimento em junho, em São Paulo.

O que aconteceu

Despacho assinado por delegada cita esclarecimentos dos conselhos de farmácia. No documento é informado que Daniele é inscrita no CRF-PR (Conselho Regional de Farmácia do Paraná), pós-graduada em saúde estética e tem o título de especialista registrado no conselho, conforme as exigências legais para a atuação na especialidade. As autoridades entenderam que a farmacêutica não cometeu crime.

Arquivamento foi determinado pela delegada Aline Manzatto. "Considerando a falta de proibição (ao menos de forma clara) nas legislações existentes em relação aos atos praticados pela farmacêutica, determino o arquivamento", discorreu no despacho, obtido pelo UOL.

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CRF-PR e CFF (Conselho Federal de Farmácia) dizem que farmacêuticos podem atuar na área de saúde estética. Os órgãos apontam que os profissionais estão respaldados por meio de resoluções publicadas posteriormente à medida nº 573/2013. Essa resolução está suspensa temporariamente por uma decisão judicial, mas o conselho federal já entrou com recurso. Os conselhos já haviam saído em defesa de Daniele em junho.

Conselhos defendem que resoluções vigentes que permitem a atuação do farmacêutico na saúde estética não infringem a Lei do Ato Médico (Lei nº 12.842/2013), que dispõe sobre o exercício da medicina.

Vetos na Lei do Ato Médico, que retiraram os procedimentos que podem ser executados apenas por esses profissionais, são citados no documento. Entre eles: procedimentos com "invasão da epiderme e derme com o uso de produtos químicos ou abrasivos; invasão da pele atingindo o tecido subcutâneo para injeção, sucção, punção, insuflação, drenagem, instilação ou enxertia, com ou sem o uso de agentes químicos ou físicos". Além da "aplicação de injeções subcutâneas, intradérmicas, intramusculares e intravenosas, de acordo com a prescrição médica”

Ainda é apontado no despacho que, para atuarem na área de saúde estética, farmacêuticos devem ter título de especialista. Segundo os esclarecimentos dos conselhos, o mesmo deve ser emitido por programa de pós-graduação lato sensu reconhecido pelo MEC (Ministério da Educação), com carga horária mínima de 360 horas. Eles também citam a obrigatoriedade de que o título seja informado ao conselho regional de farmácia, além de ser exigido que o "profissional atue dentro dos seus limites de competência profissional, com boas práticas e procedimentos que garantam a segurança do paciente”

‘Farmacêuticos são os profissionais da saúde que possuem o conhecimento para realizar a fabricação de peelings químicos. Os conhecimentos que eles adquirem na graduação e na pós-graduação os qualificam para manipular fórmulas, ajustar concentrações, avaliar associações de ativos, prever efeitos biológicos e lidar com possíveis intercorrências, e inclusive para treinar outros profissionais autorizados pelos seus conselhos profissionais a aplicá-los.”

Textos dos conselhos que constam no despacho

Não são atribuições dos conselhos de farmácia de regulamentar e fiscalizar cursos livres. "Farmacêuticos, assim como médicos e outros profissionais da saúde, podem ministrar cursos livres, palestras e mentorias em suas áreas de conhecimento e habilitação, respeitando as legislações vigentes e seus respectivos códigos de ética. Não há na legislação brasileira nenhuma proibição quanto a isso." Os conselhos ressaltaram, ainda conforme despacho, que cursos livres — mesmo aqueles que ofereçam certificados — não habilitam os alunos a exercer uma profissão.

Farmacêutica e defesa comemoram

Daniele comentou em uma postagem do seu advogado e afirmou que a "justiça venceu". Ela também agradeceu pelo trabalho do defensor Jeffrey Chiquini.

Advogado da farmacêutica disse ao UOL que foi "injusto" incluírem sua cliente no caso. "[Daniele] simplesmente deu e forneceu, em uma plataforma online, um curso meramente conceitual. (...) Então, a justiça foi feita, a verdade prevaleceu e Daniele foi declarada inocente", finalizou.

Influencer concluiu curso após morte de paciente

A Polícia Civil de São Paulo solicitou informações à plataforma onde Natalia fez o curso online. O histórico mostrou que ela finalizou 24 aulas — de um total de 31 — no dia 5 de junho por volta das 8h50. Ou seja, quase dois dias após a morte do paciente Henrique Chagas. Horas depois da conclusão do curso, ela prestou depoimento às autoridades. Os dados constam no relatório final da polícia, obtido pelo colunista do UOL Valmir Salaro.

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A investigação também apontou que somente sete aulas foram concluídas por Natalia em 2023. Ela comprou o curso no ano passado em uma plataforma online pelo valor de R$ 397.

No documento, a autoridade policial diz que a Natalia fazia o procedimento invasivo com base em um curso com "apenas seis horas de duração".

Natalia foi indiciada por homicídio com dolo eventual — quando se assume o risco de produzir a morte de alguém — em 5 de junho. Ela está solta.

Defesa de Natalia reforça inocência

A advogada de Natalia, Tatiane Forte, declarou ter tomado conhecimento do relatório final da polícia. Após análise, a defesa disse ao UOL que não identificou "elemento algum de informação capaz de sustentar a responsabilidade jurídica de Natalia com relação aos crimes que lhe foram imputados, mormente pela sua comum produção unilateral e Estatal”

“Ocorre que o Direito Penal Brasileiro conta com sistema acusatório que assegura, por força constitucional, a ampla defesa e o contraditório, especialmente o princípio do estado de inocência, pelo qual somente haverá responsabilização criminal quando não houve a menor dúvida. Nesse norte, Natália informa que apresentará, na devida oportunidade, sua Defesa Criminal, apresentando as razões e as provas de sua inocência.”

Tatiane Forte, advogada de Natalia

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