De jaleco branco na rua: Médico ou pipoqueiro?

É muito comum ver colaboradores de hospitais e clinicas circulando na rua vestindo a proteção de uso individual dos profissionais da área da saúde: o jaleco. Há quem diga que muitos consideram elegante e charmoso desfilar com a indumentária pelas ruas frequentando inclusive restaurantes e lanchonetes.

O fato é que, usar esta vestimenta profissional fora do ambiente de trabalho pode representar um risco incalculável para a saúde das pessoas em volta. Devido às constantes denúncias e por causa de tantos estudos comprovando que o uso do jaleco fora do ambiente de trabalho pode resultar em riscos para a população, três estados já possuem projetos de lei que proíbem o uso da vestimenta profissional nas ruas, São Paulo, Minas Gerais e Paraná.

Na capital paulista a lei estadual que proíbe os profissionais da saúde de usarem jalecos ou aventais fora do ambiente de trabalho completou sete anos em abril. No dia 17 de julho, a equipe do ICTQ percorreu as intermediações de alguns hospitais no centro de São Paulo e flagrou que os profissionais descumprem a legislação.

Foram vistos fumando, comendo, falando ao celular e circulando no entorno dos estabelecimentos vestidos com os jalecos funcionários das seguintes instituições: Hospital Israelita Albert Einstein e Hospital Sírio-Libanês. Procurados pela reportagem, as instituições informaram que iniciariam campanhas para discutir o assunto com seus colaboradores.

Segundo o médico infectologista e  presidente da Sociedade Paranaense de Infectologia (SPI), Dr. Alceu Fontana Pacheco, o maior problema não seria a contaminação de agentes patológicos dos restaurantes para os hospitais e, sim, o inverso. “As possibilidades de o profissional de saúde carregar germes da comunidade para dentro do hospital é pouco significativa do ponto de vista patológico. As bactérias mais perigosas, as multirresistentes, já estão dentro dos hospitais. O receio das pessoas é de que os jalecos podem levar contaminação externa para o ambiente hospitalar. Entretanto, o risco, de fato, é o contrário”, diz.

Biossegurança

O jaleco médico – indicado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como equipamento de proteção individual – pode ser fonte de contaminação. A própria OMS, em seu manual de Biossegurança Laboratorial, recomenda que o uso do EPI seja restrito aos ambientes de trabalho, com a intenção de redução infectocontagiosa de micro-organismos pelo uso do jaleco.

Pesquisas recentes no Estado de São Paulo indicaram a contaminação por micro-organismos relacionados a infecções respiratórias, cutâneas e gastrointestinais em 95% dos jalecos médicos. Foram avaliados 96 estudantes de Medicina, distribuídos nos seis anos da graduação, que atuam na enfermaria de clínica médica do hospital. A metade usava jalecos (de mangas longas) e a outra metade não. E foi comprovada a existência da microbiota - conjunto de micro-organismos que habitam um ecossistema - existente nos jalecos, sobretudo na região do punho e na pele dessas pessoas, com a dos não usuários.

A edição de setembro de 2013 do American Journal of Infection Control trouxe um estudo cuja conclusão afirma que germes perigosos podem se esconder nos uniformes de médicos e enfermeiras.

Pesquisadores do Shaare Zedek Mecical Centerin de Jerusalém fizeram culturas de três manchas de uniformes de 75 enfermeiras e 60 médicos trabalhando num hospital com 550 leitos. Patógenos potenciais (conhecidos também como agentes infecciosos ou germes) foram encontrados em 63% dos uniformes. Também foram encontradas bactérias resistentes a antibióticos em amostras de 14% dos uniformes das enfermeiras e 6% dos uniformes dos médicos. Oito das culturas se desenvolveram como Staphilococcus aureus, resistentes à meticilina. Ainda, a taxa de contaminação com patógenos resistentes a antibióticos foi maior em roupas que eram trocadas a cada dois dias, em relação às trocadas diariamente.

Em uma outra pesquisa realizada por alunas da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), campus de Sorocaba, em 2010, ficou comprovado que 95% dos jalecos médicos examinados estavam contaminados. Entre os micro-organismos identificados, novamente foi encontrado a bactéria Staphilococcus aureus considerada uma das principais agentes de infecção hospitalar. A pesquisa foi realizada pelas alunas Fernanda Dias e Débora Jukemura, sob orientação da professora Maria Elisa Zuliani Maluf.

A proposta surgiu após a constatação de que alunos e residentes do hospital-escola do Conjunto Hospitalar de Sorocaba, da rede estadual de saúde, saíam para o almoço em bares e restaurantes sem tirar o jaleco.

Um outro estudo, feito pela Faculdade Veris, em Campinas, também apontou a contaminação nos aventais. Entre os micro-organismos frequentes estavam: estafilococos coagulase negativa, streptococcus sp, bacillus gram, diplococos gram negativos e bolores. "Esses micro-organismos podem ocasionar infecções cutâneas, respiratórias, problemas gastrointestinais e até mesmo problemas mais graves se caírem na corrente sanguínea", diz a microbiologista Rosana Siqueira dos Santos, responsável pela pesquisa da Veris.

Legislações

O Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR) reconhece a importância de que os médicos cumpram a lei. “Além das questões científicas, é importante observar a norma em respeito à população, pois, esse comportamento não é adequado em nossa cultura social”, afirma o presidente do CRM-PR, Mauricio Marcondes Ribas.

Em 2010 o Governo do Paraná sancionou a lei estadual 16.491 proibindo os profissionais da área da saúde utilizarem jalecos, aventais e outros equipamentos em ambientes externos ao trabalho. O assunto já era regido pela Norma Regulamentadora NR-32, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), porém, com a lei estadual, quem for pego infringindo a determinação pode receber multa no valor de R$ 193,72. A Secretaria Estadual da Saúde é a responsável pela fiscalização através dos departamentos de vigilância sanitária.

Em 2011, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, sancionou a lei 14.466 que proíbe os médicos, enfermeiros e profissionais de saúde em geral usarem jaleco fora de hospitais e ambientes de trabalho de saúde no estado. A lei estadual tem como objetivo evitar riscos de contaminação por bactérias levadas de um local a outro. O médico, enfermeiro ou técnico que desrespeitar a lei pode ser multado em R$ 174,50. Se fizer de novo, a multa dobra de valor.

Porém, infelizmente ainda é comum ver – principalmente nas regiões hospitalares das grandes cidades – diversos profissionais que circulam pelas ruas utilizando as mesmas roupas com as quais lidam diretamente com os pacientes. Restaurantes, lanchonetes, bancas de revista, estacionamentos entre outros lugares é rotineiro ver o uso irresponsável do jaleco.

Há ainda profissionais que levam instrumentos de trabalho para fora dos consultórios e hospitais como, por exemplo, um estetoscópio. E você questiona: qual a real necessidade de andar com o estetoscópio pendurado no pescoço? Ou qual a necessidade de sair usando jaleco? Estes equipamentos são para serem utilizados no ambiente de trabalho assim com as luvas nitrílicas ou de látex, máscaras ou respiradores, óculos de proteção entre outros.

Na opinião de um dos pacientes que frequentam o Hospital Sírio Libanês, Uziel Alves, não há necessidade alguma de sair circulando pelas ruas com um estetoscópio a tira colo ou luvas de látex. “Tais atitudes representam total desrespeito com a profissão e com as pessoas que necessitam de atendimento. É estranho, pois, na maior parte das vezes os profissionais que possuem esta conduta atuam em hospitais particulares, de grande referência. Seria então, esse comportamento isolado apenas por vaidade?  Por atuar, por exemplo, no Hospital Sírio Libanês, o médico, enfermeiro ou técnico coloca a saúde coletiva de muitos cidadãos em risco para desfilar com o jaleco com a marca do Hospital Sírio Libanês ou Albert Einstein? Por que nunca se viu um médico do Hospital Municipal lá do ABC Paulista ou do interior do Piauí utilizando um jaleco com a marca do hospital da rede pública, por exemplo, que ninguém reconhece. Isso não condiz com uma conduta ética que todos os profissionais, principalmente da área da saúde, devem adotar”.

Lei ineficaz

Outros profissionais questionam a medida. “Eu acho que é uma coisa que não tem sentido. Porque nós usamos sapatos, usamos outras coisas que não seja o jaleco branco. Não é o jaleco branco que vai fazer que haja contaminação hospitalar”, disse o médico Theofanis Konstadinidis, que atua no Hospital das Clinicas em São Paulo.

Para Maria Beatriz Souza Dias, infectologista e coordenadora da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Sírio Libanês, a lei é ineficaz. "Se você for única e exclusivamente pelo isolamento de bactérias, você vai ver que no estetoscópio ou no celular, você também encontra esse tipo de agente, provavelmente se você cultivar as canetas também vai encontrar esse tipo de agente, ou seja, tudo aquilo que a mão toca pode veicular bactérias hospitalares e não hospitalares", afirmou.

No lugar da lei, Maria Beatriz disse preferir ver uma grande campanha para conscientizar os profissionais da área da saúde, inclusive os médicos e enfermeiros, da importância de lavar as mãos e tirar o jaleco na hora que sair do local de trabalho. "É parte da cultura e as pessoas sabem que elas devem realizar alguns procedimentos antes de sair do hospital e quando voltar para trabalhar, mas elas higienizam de uma forma geral, menos do que deveriam", comentou.

O Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP) afirma que a lei apenas reforça uma exigência do Ministério da Saúde, que existe desde 2005. “É uma norma federal que já trata de vestimentas. Então, tudo aquilo que você utiliza dentro do hospital deve ficar dentro do hospital. Infelizmente, essa norma não é respeitada”, afirmou a conselheira do Coren-SP Maria Angélica Guglielmi.         

E os farmacêuticos?           

Os farmacêuticos se destacam neste quesito de comportamento, até hoje, nunca se ouviu relato de que se viu um farmacêutico na padaria utilizando o jaleco da Raia Drogasil, por exemplo. Desde 7 de julho de 1965, quando entrou em vigor a Resolução 33 do Conselho Federal de Farmácia (CFF), orientando a obrigatoriedade do uso desta ferramenta para proteção, o farmacêutico entende que o jaleco é utilizado apenas durante o período de trabalho e dentro de seu ambiente profissional.

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