A FORMAÇÃO DO FARMACÊUTICO NO BRASIL E O QUE MERCADO ESPERA DESSE PROFISSIONAL

Formação do Farmacêutico

Existem em torno de 340 cursos de Farmácia no Brasil, que formam aproximadamente 15 mil profissionais todos os anos. Os dados são do Conselho Federal de Farmácia (CFF), que também revela que mais de 80% dos novos profissionais têm na farmácia comunitária seu primeiro emprego. Isso se deve em boa parte pela oferta de estabelecimentos existentes no País. São cerca de 87 mil farmácias e drogarias espalhadas pelo território nacional, incluindo as de manipulação. “O varejo é o setor que mais emprega, pois além de maior é mais acessível ao profissional em início de carreira”, salienta Lincoln Marcelo Lourenço Cardoso, professor do ICTQ, Instituto de Pesquisa e Pós-graduação.

Apesar de sua proeminência, o varejo é apenas uma das mais de 70 possibilidades de carreira que o farmacêutico pode seguir. A seleção pode incluir as indústrias de medicamentos, de cosméticos e de alimentos; laboratórios de análises clínicas e toxicológicas; hospitais privados e públicos; clínicas de reprodução humana; banco de órgãos; vigilância sanitária; nutrição; os setores de biologia molecular e controle da qualidade e tratamento de água; até a radiofarmácia.

Ao longo dos séculos, a atividade farmacêutica se desenvolveu com o avanço das pesquisas científicas e da tecnologia. Com o aperfeiçoamento dos métodos de produção, dos utensílios, assim como do próprio ambiente de trabalho, o ofício que um dia foi artesanal se industrializou. A metodologia empregada na produção dos medicamentos se aprimorou para evitar o mínimo possível de erros. Em alguns casos, lança-se mão da tecnologia robótica para eliminar o contato do homem com o medicamento, de forma a evitar contaminações e imprecisões. Ao mesmo tempo, o contato humano e o acompanhamento mais próximo do paciente passaram a ser valorizados.

Para atender a essa realidade, a formação do farmacêutico sofreu mudanças importantes nas últimas décadas, voltando-se para um perfil mais generalista. Em 2000, a Federação Farmacêutica Internacional (FIP) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) apontavam uma nova direção para o papel do farmacêutico, centrando seu foco na atenção ao paciente. No Brasil, tal abordagem desembocou em novas Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em Farmácia, editadas pelo Ministério da Educação, em 2002. Segundo o CFF, tais diretrizes alteraram significativamente o perfil do profissional a ser formado. Deixaram de existir as habilitações, e o âmbito de formação passou a abranger todas as áreas das ciências farmacêuticas. O caráter tecnicista deu lugar à formação de um profissional com conhecimentos técnico-científicos permeados de atividades de caráter humanístico, com capacidade de criticar, refletir e ser um agente de mudanças, apto a tomar decisões em prol da resolução de um problema de saúde, tanto no âmbito do indivíduo quanto da coletividade.

Formação profissional no Brasil

Do ponto de vista curricular, assinala a professora Wanda Pereira Almeida, coordenadora de graduação da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Unicamp, “o perfil generalista tem por objetivo preparar o estudante para a atuação profissional nos mais diversos segmentos de mercado”. Porém, isso ainda não se concretizou completamente. “Esse tipo de formação constitui profissionais bastante interdisciplinarizados, com perfil humanista, mas ainda sem habilidades e competências clínicas para o cuidado farmacêutico”, pontua Lincoln Marcelo Lourenço Cardoso.

Em que pese as mudanças curriculares tenham acompanhado as tendências mundiais, a formação do farmacêutico no Brasil ainda carece de ajustes. Para o diretor do ICTQ, Marcus Vinicius de Andrade, muitas vezes ela é deficiente e, em algumas faculdades, até precária. “A grade curricular não condiz, em muitos aspectos, com a formação necessária para indivíduos que vão atuar na indústria, no varejo, nos hospitais ou em qualquer uma das mais de 70 áreas possíveis no mercado para o farmacêutico”, diz o executivo, destacando que há um problema de excesso de teoria e falta de prática. “Não é raro encontrar faculdades sem a farmácia escola em pleno funcionamento. E quando ela existe oferece poucas oportunidades de experiências ao aluno.”

“Acredito que os recém-formados possuem os conhecimentos básicos para exercício da profissão, mas praticaram muito pouco durante a vida acadêmica”, adiciona Leonardo Doro Pires, professor do ICTQ e da Escola de Gestão e Negócios da UnP. “Sendo assim, é preciso implantar sistemas de estágios e residências mais robustos.” Além da falta de farmácias escolas para atividades práticas, estruturas curriculares mal elaboradas estão entre os principais problemas encontrados nas universidades, na visão do professor Lincoln Marcelo Lourenço Cardoso, que aponta outras dificuldades. “O grande problema da graduação em Farmácia hoje no Brasil se demonstra pela baixa carga horária ofertada por muitas instituições de ensino, principalmente particulares. Em que pese termos no Brasil muitas faculdades privadas com altíssimo nível de qualidade, a facilidade de abertura permite a oferta de novos cursos de Farmácia de baixa qualidade, que não atendem à necessidade de formação mínima para a atuação profissional”, avalia.

De maneira geral, a formação farmacêutica no Brasil é ainda muito tecnicista, na opinião de Leonardo Doro Pires. “A maioria das faculdades não busca despertar no profissional farmacêutico uma visão holística de negócio, voltada para a cadeia de suprimentos onde ele atuará profissionalmente”, diz o professor e completa. “Podemos identificar dois grandes grupos de profissionais, os formados em faculdades privadas, que geralmente tem o foco de preparação voltado para o varejo, e os oriundos de faculdades públicas, que possuem uma formação de pesquisador.” Para Wanda Pereira Almeida, as deficiências gerais de formação do farmacêutico são decorrentes de uma série de fatores, desde questões pessoais e sociais, até a deficiência na formação básica que, muitas vezes, limita o indivíduo na exploração de suas potencialidades.

Existem ainda características regionais ou mesmo institucionais que impactam na formação do estudante, lembra Wanda. “Uma universidade que tem uma tradição em pesquisa desperta o estudante para essa área. Mas a iniciação à pesquisa e a sua continuidade, por meio da realização de cursos de pós-graduação, não deve ser interpretada como uma obrigatoriedade ou exclusividade para aqueles que querem seguir a carreira acadêmica.” De acordo com Vítor Brandão Eça, professor do ICTQ e gerente de assuntos regulatórios para América Latina da divisão de biotecnologia de uma grande multinacional, há algumas universidades bastante tradicionais em pesquisa que acabam voltando a formação dos acadêmicos para esta área e outras, situadas em polos industriais, que direcionam o acadêmico para realização das atividades na indústria. “Não vejo um padrão de formação do profissional farmacêutico no Brasil. Mas, em geral, ela é mais voltada para o varejo.”

Para alguns especialistas, a facilidade com que os recém-formados, ainda sem os conhecimentos básicos para o exercício da profissão, conseguem o registro profissional nos conselhos de farmácia, em oposição ao que ocorre em outras áreas, como o Direito, enfatiza a deficiência de formação. “Não há prova de proficiência para que o indivíduo seja habilitado como profissional apto a exercer plenamente suas funções no mercado. Observamos isso na pós-graduação. Em muitas situações, os professores do ICTQ se veem em um trabalho de resgate de profissionais que sabem quase nada de farmacologia, regulação farmacêutica, gestão”, diz Marcus Vinicius de Andrade. “Sou a favor de um exame nacional para obtenção de registro que garanta o exercício profissional”, sustenta Leonardo Doro Pires. “Isso tencionaria mais o sistema de ensino farmacêutico, levando a uma maior preocupação com o processo formativo.”

Mas nem todos acreditam que o exame de ordem seria a solução para aprimoramento da formação do farmacêutico. “Certamente os recém-graduados saem das faculdades sem todos os conhecimentos básicos para o exercício da profissão, até porque são inúmeros os campos de atuação, tornando quase impossível aprender o básico de todas as áreas da farmácia. Não vejo o exame de proficiência como solução para termos somente bons profissionais atuando”, pondera Vítor Brandão Eça. “Forçar um profissional que, por exemplo, quer seguir carreira na área hospitalar ter conhecimentos profundos da indústria de alimentos não garantirá sua competência no exercício do seu ofício”, diz. “Considero a questão do exame de classe muito delicada e que não pode ser generalizada. Cada curso tem as suas especificidades”, frisa Wanda Pereira Almeida.

Walter da Silva Jorge João, presidente do CFF, tem uma posição intermediária sobre o tema. “A necessidade do exame de proficiência sempre esteve em pauta no CFF. Não está descartada a hipótese de deliberarmos sobre a sua aprovação no futuro. Por enquanto, somente a OAB implantou o exame de proficiência. O CFF defende que o MEC, a quem cabe a responsabilidade pela autorização de novos cursos de Farmácia, atue cada vez mais com competência no gerenciamento dessa atividade. Já o CFF e os conselhos regionais devem adotar medidas preventivas para o registro de novos farmacêuticos que se formam por instituições de ensino mal avaliadas pelo MEC. Nenhum formando deve ser registrado no sistema se a sua instituição não cumpre com as normas do MEC.”

O profissional e o que mercado espera

Entre as principais opções de carreira que farmacêuticos podem seguir estão: varejo, indústria, distribuição, hospitais privados e públicos e academia, cada qual com pontos positivos e negativos, como destaca o professor Leonardo Doro Pires. “No varejo, as principais vantagens estão relacionadas à grande disponibilidade de oportunidades oferecidas, o contato com a clínica e a opção do empreendedorismo. O lado negativo é que algumas empresas não valorizam a atuação do profissional de saúde e a remuneração em muitos casos não passa do piso salarial. Em contrapartida, na indústria estão as melhores remunerações, maior valorização profissional e a possibilidade de assumir cargos executivos. Contudo, a atuação restrita a poucos polos industriais limita as ofertas de vagas. Na distribuição, há a possibilidade de assumir cargos executivos, mas existem poucas empresas de grande porte. Hospitais privados oferecem possibilidade de assumir cargos executivos e ampliam o contato com a clínica, porém têm jornadas de trabalho mais exaustivas. Nos hospitais públicos a vantagem é a estabilidade de emprego, mas o profissional sofre com a falta de infraestrutura e com pouca possibilidade de ascensão na carreira. Para quem optar pela academia, a vantagem é o acesso à tecnologia e ao conhecimento de ponta, contudo o profissional perde o contato com o mercado.”

Para os especialistas, a melhor escolha deve estar relacionada à afinidade do profissional. Alguns farmacêuticos não se sentem confortáveis no ambiente hospitalar, já outros não gostam da relação direta com o público. Há aqueles que não se adaptam à pressão da indústria farmacêutica. “O profissional deve avaliar as atividades que irá realizar e o ambiente de trabalho que estará inserido para optar”, diz Vítor Brandão Eça. Mas nem todos os profissionais agregam um conjunto mínimo de habilidades e competências que possibilitem, de fato, ingressar na área pretendida. “A indústria farmacêutica sempre foi muito desejada, pelas ótimas condições de trabalho que oferece, principalmente salarial. Porém, é um mercado muito restrito e que requer qualificações muitas vezes não existentes no currículo de um jovem profissional”, salienta Lincoln Marcelo Lourenço Cardoso.

“Os cursos de Farmácia, em sua maioria, não são voltados à indústria, mas para os laboratórios de análises clínicas e dispensação de medicamentos”, observa Ana Silvia da Costa, diretora corporativa de Gestão do Capital Humano da EMS. Segundo ela, praticamente não existem cursos de Farmácia que estudam as fórmulas químicas e suas interações, nem a deformulação de produtos. “Dessa forma, a área de pesquisa é praticamente dominada por profissionais de Química. Acredito que os alunos deveriam, a partir do quarto ano, ter a opção de seguir uma linha, como análises clínicas, industrial ou pesquisa. Algumas universidades já trabalham dessa forma e, com isso, os dois últimos anos do curso são mais voltados à escolha profissional pós-universidade”, diz a executiva.

Assim como na maioria das profissões, a falta de experiência é uma barreira a se vencida. “Essa dificuldade pode ser superada com os estágios. A grande maioria das empresas instaladas no Brasil oferece essa opção”, revela Leonardo Doro Pires, enfatizando que o farmacêutico não é mais um profissional de perfil exclusivamente técnico. “O aumento da complexidade nas rotinas administrativas, tanto na indústria quanto no varejo, exigem do farmacêutico uma gama de habilidades de gestão que, somadas aos conhecimentos técnicos, lhe permitam desempenhar um papel de liderança nas empresas em que atua”, conclui o professor. “Habilidade para trabalhar em equipe, pró-atividade e capacidade de inovar contam muito hoje em dia”, faz coro Wanda Pereira Almeida. Para Elaine Menezes, gerente de Informações Médicas da Pfizer, o farmacêutico precisa ter conhecimento científico, “mas é importante que apresente habilidades que ultrapassam o domínio do conteúdo técnico, como boa comunicação oral e escrita, habilidade na resolução de problemas, capacidade de manter um bom relacionamento pessoal e comprometimento”.

“As empresas esperam do farmacêutico um profissional apto e competente para agregar no crescimento da empresa, aliando com prudência as necessidades comerciais e conhecimento técnico”, revela Marcela Oliveira, coordenadora farmacêutica da Ultrafarma. Segundo ela, o perfil que as empresas buscam são indivíduos dinâmicos, responsáveis e principalmente que pensem grande. “Profissionais que aspiram crescer e além de apresentar ideias inovadoras saibam executá-las”, diz a executiva. “Na Raia Drogasil buscamos profissionais que gostem de trabalhar com pessoas e possam aplicar seus conhecimentos técnicos no suporte ao cliente, com ética e cordialidade”, afirma Maria Susana de Souza, vice-presidente de Recursos Humanos da empresa.

“Capital humano é fundamental para as companhias que querem ser inovadoras. Acreditamos que a vantagem competitiva tem relação direta com o compromisso de dar oportunidades para jovens talentos e em manter o incentivo à diversidade”, revela Tatiana Libbos Vailati, gerente de Desenvolvimento Organizacional da Boehringer Ingelheim. Segundo ela, independente da formação acadêmica, que se espera sempre sólida, as empresas buscam profissionais que se identifiquem com seus valores e que estejam dispostos a colaborar para os resultados da organização.

Miller Nunes de Freitas, diretor de Desenvolvimento Farmacotécnico Analítico do Aché, explica que a busca pelo perfil do profissional depende muito da posição e do nível desejado. “Em geral, os profissionais devem apresentar uma boa base técnica de conhecimento, serem curiosos e capazes de colocar suas ideias e implementar ações, sabendo sempre trabalhar em equipe”, afirma o executivo, lembrando que focar logo cedo a área em que se pretende atuar pode facilitar na carreira. “É importante que o aluno tente decidir desde a faculdade qual área possui mais afinidade e passe a procurar se especializar nesse caminho, por meio de estágios, iniciação científica, cursos de extensão, para ir adquirindo experiência.”

De acordo com Ana Silvia da Costa, da EMS, o acesso às empresas poderia ser facilitado se as universidades intensificassem na grade curricular disciplinas voltadas à prática do mercado. “Não é a experiência em si que é o fator de decisão para a empresa, mas se o recém-formado saísse da vida acadêmica com noções de mercado, com certeza isso facilitaria o desenvolvimento de sua carreira corporativa.” Com os investimentos em inovação feitos pelas indústrias farmacêuticas nos últimos, os profissionais farmacêuticos ganham cada vez mais importância, observa Adriana Luz, diretora de Desenvolvimento Humano e Organizacional da Eurofarma. “Mas a formação voltada ao setor produtivo, tanto na parte de produção como em pesquisa e desenvolvimento, acaba sendo complementada pela própria empresa, uma vez que a formação no Brasil é mais voltada à dispensação de medicamentos”, diz.

Dez passos para se destacar na carreira

1. Estude sempre.
2. Não tenha medo de fazer escolhas. Uma formação sólida permitirá isso.
3. Não se preocupe apenas com o conhecimento técnico. Busque a inteligência emocional.
4. Nunca separe conhecimento e trabalho de ética.
5. Dedique-se. A dedicação é a chave para o sucesso na profissão.
6. Procure conhecer todas as áreas de atuação do farmacêutico
7. Seja pró-ativo e saiba trabalhar em equipe.
8. Seja otimista, persistente e tolerante.
9. Tenha uma boa rede de contatos e saiba usar as redes sociais.
10. Faça um planejamento de carreira.

Fontes: professores Wanda Pereira Almeida, Leonardo Doro Pires e Vítor Brandão Eça

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