Pesquisa desenvolvida pelo farmacêutico Renan Villanova Homem de Carvalho, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), mostrou como um determinado vírus faz com que a leishmania, protozoário causador da leishmaniose, torne a doença mais agressiva aos humanos.
A enfermidade, que é transmitida por meio da picada das fêmeas do mosquito palha, causa entupimentos, sangramentos, coriza, além de crostas e feridas na pele. Em alguns casos, pode apresentar problemas na garganta, como dor ao engolir, rouquidão e tosse.
Conforme explica o farmacêutico, em entrevista ao canal da Universidade de São Paulo (USP), o quadro de muitos pacientes melhora e evolui para a cura da doença de forma espontânea ou por tratamento medicamentoso. No entanto, boa parte deles desenvolve uma forma mais grave, a leishmaniose mucocutânea, em que as lesões passam a aparecer também nas mucosas, frequentemente, no nariz, boca e garganta.
“Nesses casos é possível observar que a doença causa no paciente um aspecto totalmente desfigurante, incapacitante, e que ainda pode levar à morte”, explica. “O que o meu trabalho de doutorado procurou entender foi por qual motivo alguns pacientes melhoram, mas outros desenvolvem uma forma mais agressiva", complementa.
Foi então que, por meio de amostras clínicas de alguns pacientes, o pesquisador descobriu que alguns desses parasitas que causam a leishmaniose são portadores de um vírus, o Leishmania RNA vírus (LRV). "Ele pode driblar nosso sistema imunológico, sendo capaz de agravar a infecção", ressalta.
“Uma vez dentro dos macrófagos, principal célula habitada pelo parasita, em que ele estabelece o seu nicho replicativo, ele [o vírus] consegue ligar vários receptores. A ação culmina na inibição de duas moléculas chaves, a NLP3 e a ASC, que são cruciais para o controle da doença”, esclarece.
O farmacêutico ainda explica como a doença piora o quadro clínico do paciente. "Quando a leishmania infecta as pessoas fica uma queda de braço. Ela querendo sobreviver e nosso sistema imunológico tentando eliminar o parasita. Mas, quando a leishmania tem o vírus, ele desliga esses mecanismos do nosso sistema imunológico que combatem o parasita", destaca Carvalho.
Forma de ação do vírus
De forma detalhada, a pesquisa identificou que quando a pessoa é infectada com o LRV, o vírus invade o organismo e ativa um receptor nas células chamado de TLR3, o que faz com que o sistema imunológico comece a produzir a substância interferon do tipo 1, que, por sua vez, induz à autofagia das células humanas, ou seja, o processo de degradação e reciclagem de componentes da célula.
Com isso, a presença do interferon impede a ação do inflamassoma, complexo de proteínas do sistema imunológico que pode combater a enfermidade. "Como essa proteína que mata a doença está sendo silenciada pelo vírus, a leishmania consegue sobreviver melhor, proliferar e causar aquela forma mais grave que é a mucocutânea. O parasita migra para o rosto das pessoas, principalmente, boca e nariz, e desfigura o paciente".
Por fim, Carvalho afirma que a pesquisa propõe a descoberta de novas formas de combater a leishmaniose e tratar os pacientes. "A gente quer que, a partir de agora, o paciente que chegue com a suspeita de leshmaniose, seja diagnosticado não apenas para ver se tem a leishmania, parasita, mas que seja também feita uma análise molecular para ver se a doença possui o vírus", finaliza o farmacêutico, em entrevista ao Diário da Região.
Assista ao vídeo em que o farmacêutico fala sobre a descoberta do vírus: